A escola tem sido um dos principais mecanismos utilizados pelo Estado em busca da perpetuação das condições de produção, das relações de produção e formação da força de trabalho, do modo de produção capitalista, o qual norteia toda a organização da sociedade.
Utilizado como aparelho ideológico utiliza diversas formas de controle e manutenção, mascarando e disfarçando a realidade com uma capa que parece ser a “única” e a “ideal” para que o homem possa viver no mundo e feliz.
O carro chefe para esse fim “são” as pedagogias tradicionais de ensino que utilizam formas eficazes para adestração dos alunos, onde o professor é o centro do processo e que transmite os conteúdos como verdades inquestionáveis para alunos passivos e responsáveis apenas por memorizar as informações. Aprender aqui é memorizar, decorar, reproduzir da mesma forma passada pelo professor ou lida nos livros didáticos. A reprodução idêntica dos conteúdos é o que será cobrado nas avaliações. Considera-se o fim do processo a aquisição de uma nota que definirá uma aprovação ou reprovação, ou seja, a avaliação é um fim em si mesmo, independente dos processos.
Tem-se aqui, um problema que preocupa os educadores comprometidos com a educação – a elevada importância dada a avaliação do processo educacional com fim em si mesmo.
Para dissecar melhor este tema abordar-se-á alguns trechos da música de Gabriel o Pensador, Estudo errado:
A música trata da estória de Juquinha, um jovem que encontra na escola, os mesmos problemas enfrentados por grande parte dos alunos: o pra quê estudar? Por quê estes conteúdos? E as tensões e pressões enfrentadas no período de avaliações. Todo o processo de ensino aprendizagem recaiu sobre uma nota que, embora fosse a máxima, não surtiu nenhum efeito na aprendizagem: “decorei, copiei, memorizei, mas não entendi”. Esta frase faz parte da realidade educacional.
Leva-se a considerar o restante do processo ensino aprendizagem, que aparentemente não surtiu o efeito desejado, em se tratando de aprendizagem, ou melhor, o efeito que deve ter existido foi o de aprender a aceitar, acomodar e obedecer, e por fim, ainda o reforço da avaliação que por trás é acompanhado da seleção, classificação, competição e exclusão.
Mesmo com todos esses pressupostos, a escola e os professores, em geral, insistem em preocupar-se mais com a avaliação do que com o aprendizado. Percebem-se os vários mecanismos de avaliação, individual ou grupal, testes, provas, trabalhos, apresentações, tudo isso redundando para uma nota, que até às vezes é injusta se formos observar realmente o processo pelo qual os alunos passaram. Mal sabem, ou pelo menos se imagina que não, que a avaliação é, por excelência, um instrumento de reprodução do modo de produção capitalista, consequentemente, de exploração, exclusão e seleção.
SILVEIRA, expondo sobre o tema, afirma:
(...), a avaliação pede muito mais que aquilo que abertamente pede, pois pressupõe aprendizagens que se desenvolvem fora da escola, longe da escola, antes da escola; em decorrência, desigualdades sociais mascaram-se em desigualdades escolares e a seleção social dissimula-se sob a ilusão de seleção educacional.2
Tem-se que ter em mente que o processo de ensino aprendizagem não se resuma só na avaliação, pois existem outros aspectos que não podem ser descuidados como a metodologia de ensino, o relacionamento professor aluno, dentre outros.
Numa postura de educador tem que se colocar o aluno no centro do processo e definir que tipo de homem quer se formar. O homem “máquina”, idealizado pelo modo de produção capitalista, que só serve como força de trabalho, que é explorado e não percebe, não pergunta, não questiona. Em outras palavras, um homem manipulado pelos interesses das classes dominante, os donos do capital. Ou um homem capaz de agir por si, de pensar, criativo, que critica, questiona, que se percebe inserido numa sociedade que não está ai posta, mas que alguém a pôs, e se alguém pôs, pode ser modificada. Um homem capaz de modificá-la.
Quando se tem o aluno no centro do processo e com o objetivo de formar um homem consciente, a avaliação toma outro rumo.
MIZUKAMI, tratando a abordagem sócio-cultural de ensino, que tem como objetivo o mesmo modelo de homem, assim explicitou a avaliação:
A verdadeira avaliação do processo consiste na auto-avaliação e/ou avaliação mútua e permanente da prática educativa por professores e alunos. Qualquer processo formal de notas, exames etc. deixa de Ter sentido em tal abordagem. No processo de avaliação proposto, tanto os alunos como os professores saberão quais as suas dificuldades, quais seus progressos. 3
A avaliação nessa perspectiva terá um efeito bem mais significativo que a do ensino tradicional, como bem disse Juquinhha: “Não aprendi nada de bom mais tirei 10”. Passa-se assim a existir uma relação harmoniosa e de continuidade entre as partes integrantes do processo.
FREIRE, citado por MIZUKAMI, afirma que: ‘A avaliação é da prática educativa, e não um pedaço dela’. 4
Quando a escola como aparelho ideológico e o professor como ferramenta utilizam a avaliação como principal parte de processo de ensino aprendizagem, pode-se afirma que a perpetuação do sistema está se realizando, seja consciente ou não.
Os educadores compromissados vêem a avaliação como parte integrante do processo de ensino aprendizagem, onde os professores e alunos direcionam o andamento das atividades, encontrando dificuldades, buscando soluções, observando os progressos, ou seja, nesse processo todos ganham e todos crescem.
1. PENSADOR, Gabriel o; GOMES, André. As melhores. Gabriel o Pensador. Manaus: Soni Music. 2000? 1 Disco Compacto (73 min.): digital, stéreo. 752.385/2-492176.