Ângelo era um menino de constituição frágil. Tinha muitos problemas de saúde, sem dúvidas, mas seu maior problema era a ignorància de sua mãe. Ela achava que o garoto deveria ficar o dia todo dentro de casa, sem poder brincar, se divertir, fazer aquelas coisas que todas as crianças gostam...
_Você é muito pequeno para poder sair e brincar com outros garotos. Vai acabar se machucando _ dizia a velha respondendo aos pedidos do pobre moleque.
A única situação em que ela deixava Anjinho, como suas primas o chamavam, sair sozinho era quando ele ia para aula. Mesmo assim dava muitas recomendações ao menino...
_Toma cuidado meu filho, você é muito pequeno. Não brinque com ninguém, não se suje. Passe o tempo conversando com seus amigos.
E aos professores:
_Vigiem o Ângelo por favor. Eu sei que ele é obediente, mas é muito frágil para brincar com os outros meninos...E ai de vocês se acontecer alguma coisa com meu filho _ completava num tom de ameaça.
Ângelo passava o recreio sentado num canto qualquer vendo os outros meninos brincarem. Sabia que as coisas que ele mais gostaria de fazer eram subir em arvóres e brincar de moldar argila, apesar de nunca ter feito isso na vida. Sonhava em um dia poder construir vasos, lindos coelhinhos e também poder enxergar o mundo de maneira diferente: de cima de uma árvore.
Viver nessa situação causou um certo desespero em Ângelo. Ele já não conseguia sorrir mais. Passava os dias questionando sua existência. Até que um dia, sentado no quintal de casa, parou e pensou:
_Por que não?
Um misto de medo e alegria pairava sobre o menino. Ele olhava para aquela árvore que esteve ali durante toda sua vida, mas só nesse momento se dava conta do tempo que perdera. Queria poder tirar esse atraso naquela hora mas não poria tudo a perder em razão da pressa. Já tinham se passado dez anos de sua vida e um dia a mais não faria grande diferença. Arquitetou um dos planos mais inteligentes que se ouviria falar por aquelas bandas. Sabia que não sairia ileso em sua realização, mas só de pensar que poderia pela primeira vez na vida se sentir importante, não titubeou mais.
No outro dia de manhã acordou bem cedo e foi pro quintal. Depois de fazer o que tinha planejado seguiu pra aula. Chegando em casa, a segunda parte do seu plano seria posta em ação.
Timidamento ao adentrar pela porta, falou para sua mãe:
_Mãe, o diretor da escola quer falar com você. Me desculpa, eu não quis que isso acontecesse.
A mãe sem nem pensar duas vezes bateu no menino como nunca batera antes. Ele apanhava e chorava, mas por dentro sua felicidade foi tão grande que explodiu num riso. A mãe não entendia e continuava batendo, até que cansou... Pegou sua bolsa e foi pra escola, que não ficava mais de dez minutos distante de sua casa.
Agora o tempo era cronometrado. Ângelo teria que executar todo o plano em menos de quinze minutos, pois apesar de gastar quase esse tempo até chegar ao colégio, depois de descobrir que tudo não passava de uma farsa, sua mãe não demoraria mais do que cinco minutos para voltar. E dá-lhe mais surra.
Chegou no quintal e encontrou tudo como deixara. O banco que ficava no quartinho estava colocado debaixo da árvore e achava que com ele conseguiria subir. Apesar de não ter sido fácil, conseguiu. Chegando lá em cima sentiu-se gente pela primeira vez, uma sensação indescritível, afinal são poucos que correm cegamente atrás de seus sonhos. Encostou no tronco e não quis descer de la nunca mais. Queria que algum dos meninos do colégio tivesse ali para ver aquela cena: um príncipe sorria sentado em cima de uma arvoré. Com certeza todos eles se surpreenderiam. Com o passar do tempo aquela felicidade foi diminuindo. Percebeu que , com o tempo, os nossos feitos vão perdendo a importància se não tivermos ninguém para quem contar.
Olhou pro chão. Estava num galho alto. Viu que não seria fácil descer. Olhou para o galho acima. Também era difícil, mas queria de novo sentir a sensação de poder e de conquista, pois em sua vida nunca sentira sensação melhor. E mais uma vez subiu, com dificuldades, mas subiu. Agora o chão se distanciava e o topo da árvore se aproximava. E esse era agora seu objetivo. A cada galho que subia, voltava o sentimento de conquista, o tédio que o seguia e a vontade de alcançar mais e mais...
Até que no topo chegou, e por poucos segundos pode vivenciar aquela experiência de ter a cidade a seus pés. O galho se partiu e Ângelo voou, se transformando agora num anjinho. Afinal anjos são crianças que vem pra terra ensinar algo à s pessoas mas que depois ,de súbito, são levadas aos céus para ensinar à s outras que vivem lá.
Da janela da cozinha, a mãe observara o fim de seu filho. Agora se aproximava do corpo que se estendia sobre o chão, sem saber o que fazer. Encostou seu rosto no dele. Não percebeu mas naquele instante, surgia no céu, uma nuvem com formato de coração. Era pra mãe. Um coelhinho também surgiu. Muitas pessoas que viram ficaram maravilhadas com o acontecimento. Apontavam para as nuvens e sabiam que elas não tinham sido formadas ao acaso. Riam, celebrando o amor, com esperança de que algo maior fosse acontecer.
Mas nunca ninguém descobriu que a causa de tanta alegria foi Anjinho, que na falta de argila, brincava de moldar as nuvens. Aquilo que sua mãe o proibira de fazer a vida toda.
