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Contos-->A TURMA DA PRAÇA (livro) -- 15/07/2004 - 12:05 (Léo Leitura) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Todos os direitos reservados a Léo Leitura. Obra com registro na Biblioteca Nacional, protegida pela lei dos direitos autorais. ISBN 857493200-0

Para encomendar a versão impressa, com capa colorida, entre em contato com a Editora Papel Virtual: tel 2525-3936 (www.papelvirtual.com.br).


PRÓLOGO - ESCREVER UM LIVRO

Numa tarde, comecei a imaginar como seria meu segundo livro: a história de uma turma que tinha uma praça como ponto de encontro. As idéias ainda eram um tanto ou quanto desordenadas, mas elas começavam a brotar, cumprimentando - e marcando encontro com - as várias lembranças que guardava de minha juventude, vivida com uma turma que se reunia num playground semelhante a uma praça, com canteiros arborizados e bancos de ferro.

Comecei a visitar algumas pracinhas, em busca de inspiração para fatos e cenários, e posso dizer que muitas páginas desta obra foram escritas em praças do Rio de Janeiro, por vezes até altas horas da noite. Quem escreve sabe que isso não é mentira: “A Turma da Praça” foi feito em locais bastante insólitos. Às vezes, dentro do ônibus, ou na sala de aula, ou até mesmo no meio de um evento, também surgia alguma idéia e lá ia eu começar a escrever um esboço. Depois, em casa, dava uma relida e acertava a sequenciação dos fatos.

Como na época ainda não tinha computador e faltava-me verba para contratar alguém para digitar o texto, o livro teve que ser enviado às editoras escrito à mão mesmo. “Será que elas teriam boa vontade de ler e avaliar um texto com esta letra feia?”, questionava-me. Decidi, então, enviar, em anexo à obra, na maior cara-de-pau, um bilhetinho pra lá de fajuto: “O motivo pelo qual o livro foi escrito à mão, é um só: deixar transparecer, através de minhas letras, toda a emoção que senti ao escrever esta narrativa.” Acho que não fui muito convincente, uma vez que, das vinte e oito editoras que receberam “A Turma da Praça”, apenas duas se interessaram em lançá-lo, entre elas uma editora internacional, que me enviou uma resenha elogiosa do editor Mark Sykes. Só duas em 28, mas já era alguma coisa...



Convocadas as reuniões, os editores-chefe me informaram que eu teria que custear metade do valor da publicação, o que, para quem não pôde nem contratar um digitador, seria inviável e impossível. Além disso, meu livro seria submetido ao copy desk, ou seja, uma equipe de escritores iria mexer no texto inteiro, iria mudar a forma de escrita da obra, algo que não me agradava nem um pouco, já que tenho um estilo muito pessoal e popular de escrever.Decidi aguardar por novas oportunidades,enquanto tocava minha vida adiante.

Alguns anos depois, já com um computador em casa, passei a dedicar minhas madrugadas a digitar “A Turma da Praça” e a rebuscar o texto, lendo-o e relendo-o inúmeras vezes, à procura de uma palavra que melhor se encaixasse em determinada frase, ou de uma expressão que transmitisse com mais clareza o efeito que desejava reproduzir. Repensei também em alguns acontecimentos da narrativa – tudo deveria se encaixar, fazer sentido, não haveria ponto sem nó. Finalmente, depois de muito esforço e de noites passadas em minha escrivaninha ou no computador, o texto ficou do jeito que me satisfazia.

Foi nesta mesma época que eu conheci a Papel Virtual e, anos mais tarde, o site Usina de Letras, meios que considero excelentes para os autores novos e sem apoio de mídia,como eu, mas com muita vontade e talento. Estas empresas me deram a certeza de que cada frase, cada palavra e cada vírgula do meu texto seria mantida conforme eu havia escrito.

Descoberto os veículos, faltava-me agora o parecer positivo destes, o que de fato aconteceu, e enfim “A Turma da Praça” pôde ser publicado e lido pela população, dando-me uma grande alegria.

Abraços mil e uma boa leitura.
Léo Leitura



AGRADECIMENTOS:

Deus;
minha família;
meus leitores;
galera 138;


1 - Enfim, férias!
2 - Operação bola
3 - Os finais de tarde na pracinha
4 - Preparativos para a festa
5 - Hoje é dia de festa
6 - Mistérios ...
7 - A melhor turma do mundo
8 - Quadro-negro
9 - O padre e a praça
10 - A grande noite
11 - Espiões a postos
12 - Volta às aulas
13 - Dúvidas mil
14 - Setenta e cinco anos depois...
15 - Heróica resistência


1 – “ENFIM, FÉRIAS!”

Assim que chegou da escola, após ter feito a prova de recuperação de Matemática, Toninho estava exausto...

Largou a mochila no primeiro metro quadrado que pisara em seu apartamento, e foi logo deitando no sofá da sala. O menino havia passado por uma prova de fogo – literalmente falando. Passara a semana inteira estudando e se preparando para aquele teste, e, enfim, o resultado era positivo: Toninho havia passado de ano. Com dificuldade – é bom que se diga – mas havia passado.

Deitado no sofá, olhando para o teto de seu humilde lar, os olhos do menino chegaram a fechar, e por alguns instantes Toninho chegou mesmo a cochilar. Estudar nunca fora o forte do aluno Antônio Carlos de Sousa, e quando o fazia para alguma ocasião especial – a prova final de Matemática – o desgaste era muito grande. Daí, o cochilo ter sido mais do que justo.

Cochilou por não mais do que quinze minutos. De repente, seus olhos se abrem e o menino acorda assustado. Era como se algo estivesse chamando por ele. Inconscientemente, sabia que não podia dormir por mais tempo... Olhou no relógio; eram 6h:30min da tarde. Foi aí que Toninho se deu conta de uma coisa: estava de férias. E atrasado para a pracinha.

...

Levantou-se e olhou da janela de seu quarto, de onde podia avistar uma parte da praça. E lá estavam Luizinho e Japa, já jogando bola, como de costume. Toninho deduziu que os meninos deveriam estar lá desde 5h:30min, como sempre faziam, e então tomou um banho de três minutos, vestiu uma roupa qualquer e desceu correndo pela escada rumo à pracinha, o local de que mais gostava.

Os outros dois meninos, de tão concentrados que estavam no jogo, nem se aperceberam da chegada de Toninho. Afinal de contas, era o pênalti decisivo e Luizinho estava concentrado na cobrança e Japa na defesa.

Quando Luizinho ia enfim bater a penalidade, escutou a saudação entusiasta de Toninho, que chegava com um sorriso de orelha a orelha:

- Fala, galera!

Com apertos de mãos e tapinhas nas costas, Toninho cumprimentou seus melhores amigos, anunciando o começo de suas férias, e feliz por enfim poder retornar à pracinha e ver o resto da turma. Para Luizinho e Japa, uma certeza: a partir de então, as férias seriam bem mais engraçadas, já que o trio de garotos da praça ficava completo com a presença de Toninho.

- Quanto ’tá essa pelada aí? – perguntou, num tom de voz alto.
- Vou vencer agora, com este gol de pênalti. – respondeu, convencido, Luizinho.
- Não vai vencer nada, pois eu vou defender! – retrucou Japa.
- Japonês não entende nada de futebol! – desdenhou Luizinho.
- Entender, até que entende. O difícil mesmo é enxergar a bola. - acrescentou Toninho.
- Enxergo muito bem, e agarro ainda melhor. E duvido, Tôni, que você faça sequer um gol em mim! – desafiou Japa.
- Súbito resolvo chutar. – avisou, decidido, Toninho.

Na verdade, nem seria preciso que Japa enxergasse a bola. O chute dado por Toninho, sem nenhuma direção, passou longe, longe do gol. E pior: para desespero geral, a bola foi cair justamente dentro do quintal de uma casa. Lá dentro mesmo.

Os três “craques” tocaram quatro vezes a campainha daquele casebre, de portão verde, guardado por um enorme cachorro, e que dava para os fundos da praça. Aguardaram, ansiosos. Ninguém atendeu. Decidiram dar o caso por encerrado da seguinte forma: Japa vencera o jogo; no dia seguinte, retornariam àquela casa para recuperar a bola ou então comprariam uma nova; e agora, sentados num dos bancos da pracinha, iriam pôr a conversa em dia:

- E aí, Toninho, cadê as garotas, que não vieram jogar? – pergunta Japa.
- Não sei, eu entrei agora de férias. Cadê elas, Luizinho?
- Elas saíram, foram na videolocadora. Daqui a pouco devem estar de volta. Elas estavam aqui ontem de noite. Mas por que esta pergunta, Japa? Algum interesse?
- Não, que é isso? Até porque são as garotas quem têm que ter interesse em nós, e não nós que temos que nos interessar por elas.
- Ah, é? E por quê? - indaga Luizinho, encucado.
- Ora, vejam bem: - explica Japa. Nós, homens, estamos sempre inventando alguma coisa pra fazer: subir na árvore, andar de bicicleta, fazer bagunça... Já elas, não! Percebam bem. Garotas não têm nada pra fazer, a não ser gostar de algum garoto e ir atrás dele. É por isso que eu digo: cedo ou tarde, elas vão gostar da gente, podem escrever isso aí!
- Na verdade, já gostam. – completa Luizinho. – Só que gostam de nós como amigos...

De fato, as três garotas da turma – Rita, Cláudia e “Pizza” – gostavam dos garotos, eram amigas deles, mas, aparentemente, nada além disso. E gostavam de cada um deles por motivos diferentes.

Toninho era palhaço, comediante, estava sempre divertindo as garotas e fazendo todo mundo rir. Mesmo quando não queria, Toninho era engraçado, pois com ele aconteciam coisas inusitadas, como no dia do seu último aniversário, quando, sem querer, derrubou refrigerante no próprio bolo. Desde que aprendeu, nas aulas de Português, que a palavra “súbito” quer dizer “de repente”, Toninho pegou mania de usar este termo nas frases que diz.

Japa era um cara legal, muito inteligente. Estudava na escola das garotas, e quando não ensinava a elas a matéria, passava-lhes cola nas provas. Japa chegou ao Brasil há cinco anos. Veio de Tóquio, onde nasceu, e aprendeu o português mais rápido do que muito brasileiro. Ninguém sabia ao certo o nome do Japa; era tão complicado que a língua chegava a enrolar quando alguém o pronunciava. Após receber alguns apelidos que ele rejeitou e ficava vermelho de raiva quando era assim chamado – tais como “Spectraman” –, o apelido que pegou mesmo foi “Japa”.

E Luizinho era um cara que conversava muito com as garotas, já que era um tanto ou quanto fofoqueiro e andava sempre bem informado, motivo pelo qual todas elas viviam procurando-o para saber das últimas. Sua realização pessoal era estar sempre por dentro de todo e qualquer zunzunzum que se pronunciasse. Foi ele, por exemplo, quem descobriu e avisou a todos a chegada de Japa ao edifício vizinho ao seu.

Já eram 9h da noite, quando Japa terminava de filosofar e explicar a seus dois amigos sua profunda tese sobre mulheres, quando uma voz feminina o interrompe:

- Oi, meninos! Oi, Toninho, quanto tempo, hein!

Era Rita, garota que morava no prédio de Toninho há três anos.

- É, fiz a prova final hoje. Passei com sete cravado. – explica a ela.
- Fui na locadora com a Cláudia e a “Pizza”, devolver uma fita. Elas estão em casa já. Passei aqui rapidinho pra buscar a minha bola, que emprestei ao Luizinho ontem de noite. Cadê ela, hein?

...

Neste instante, os meninos se entreolham, como se estivessem se perguntando se contavam a verdade, ou seja, que Toninho zuniu a bola na casa de portão verde, ou se inventavam alguma coisa.

Nem precisava, já que Rita foi logo se antecipando a eles:

- Já sei! Perderam outra bola, né?
- Foi o Toninho! – entregou Japa, apontando para o amigo.
- Tinha que ser, né? Menos mal que a bola já estava bastante oval mesmo... - comentou Rita, conformada.
- Amanhã faremos uma “vaquinha” para te comprar outra. – avisou Luizinho. Eu mesmo já vou contribuir com dez centavos.
- Nada disso! Eu pulo o portão da casa e apanho a bola! – imaginou Toninho.
- Impossível! Naquela casa tem cachorro! – recordou Luizinho. Agora me lembrei de uma coisa: um pessoal se mudou pra lá há pouco tempo. Eles estão viajando, mas deixaram a fera aí. Não poderemos entrar lá enquanto eles não voltarem...

Naquele exato momento, a mãe de Rita a chamava para jantar, por intermédio de berros da janela. A menina não parecia muito preocupada com sua bola. Despediu-se dos amigos com a simpatia costumeira, e foi para casa. Os meninos ainda ficariam na pracinha jogando conversa fora:

- Que pena que ela já se foi... – comenta Toninho, desapontado.
- Não é tão bonita assim. – rebate Japa.
- Mas é a mais legal. – finaliza Luizinho.

Ana Rita era, das três garotas, a que mais se identificava com os garotos, a que mais andava com eles. Talvez pelo fato de ter perdido a mão esquerda em um acidente, durante sua infância em Curitiba, Rita não gostava muito de ir com as outras garotas da turma – Claudinha e “Pizza” – a discotecas, shows, e coisas do tipo. Com isso, passou a se identificar mais com o cotidiano dos amigos, participando mais das bagunças deles. Era, neste aspecto, bem diferente das outras duas garotas da turma, que tinham hábitos mais tradicionais. E era disso que os garotos gostavam em Rita: ela, por vezes, se metia no universo masculino...

Um homem passeando na praça com seu cachorro pitbull solto foi um excelente motivo para que os três resolvessem ir para seus respectivos lares: Luizinho e Japa moravam em prédios vizinhos; Toninho residia num edifício antigo, onde também morava Rita. Os três edifícios davam de frente para a praça.

E assim terminava o primeiro dia de férias de Toninho.


2 - “OPERAÇÃO BOLA”

Manhã do dia seguinte. O silêncio costumeiro já era quebrado por um insólito berro:

- Japaaaa! Japaaaa!

Era Toninho, já na rua, chamando o amigo.

Embora na grande maioria das vezes a turma se reunisse ao entardecer, em alguns dias era preciso antecipar o encontro, devido a alguma tarefa especial. Era o caso daquele dia: os meninos tinham que resolver a importantíssima questão da bola.

Como Japa morava no segundo andar de seu edifício, em geral as pessoas o chamavam da rua mesmo. Toninho já esboçava ir embora, quando na janela do apartamento 201 surge um garoto com o cabelo todo despenteado e os olhos quase que fechados. Por ser japonês, Japa tinha os olhos naturalmente semicerrados, mas, naquela ocasião, ele aparentava mesmo era estar com sono.

- Acordei você? - pergunta, desconfiado, Toninho.
- Deu pra perceber, é? - resmunga o japonês.
- Desce aí! Vamos chamar o Luizinho!
- Vou tomar café e já desço. Acordou cedo hoje, hein!

Enquanto Japa fazia sua refeição matinal, Toninho sentou-se em um dos bancos da pracinha para esperar o amigo. Na verdade, Toninho poderia até ter ido logo à casa de Luizinho, ou então ter voltado para sua própria casa, esperar Japa tomar café. Mas era tão grande o prazer que Toninho sentia em estar na pracinha, local onde passara por tantos momentos inesquecíveis, que, para ele, estar lá, mesmo que sozinho, esperando Japa, não era sacrifício nenhum. Sua mente viajava pelo tempo...

A Praça Valdir Constantino ficava numa área bastante tranqüila. Pelas ruas que a norteavam, quase não passavam carros. A praça era um local simples, bem arborizado, bonito, embora não tivesse nenhum brinquedo, nem tampouco quadra de esportes, tanto que o futebol da turma era improvisado numa área pequena, onde não havia moitas nem bancos. Na verdade, o que faltava em algumas outras praças, nesta aqui sobrava: histórias. E Toninho havia participado da maioria delas. Por isso, estar lá, para ele, era sinônimo de relembrar várias passagens de sua vida...

Após quinze minutos de espera, eis que surge Japa, já com uma aparência bem melhor e um barrigão que entregava a ingestão de um café da manhã reforçado.

- Fala, Tôni! Desculpe a demora! Rapaz, comi muito!
- Súbito resolvi te chamar. Acabei te acordando, né? Mas foi até bom, pois assim antecipei sua comilança, certo? A propósito, meu caro, o que tinha na mesa?
- Comi um queijo quente e tomei um copo de leite. Depois, ainda botei pra dentro o que sobrou do jantar de ontem!
- Ah, é? E o que teve de jantar ontem?
- Sushi.
- Sujou o quê?
- Não, Toninho! Sushi! É um prato japonês, feito de peixe cru.
- Ô Japa, se o fogão da sua casa estava ruim, poderia ter ido lá em casa fritar o peixe. Não era preciso comê-lo cru! Mas que cerimônia!

...

Ninguém nunca sabia ao certo se Toninho estava brincando ou falando sério. Talvez nem mesmo ele soubesse.

Mal Japa terminou de dar sua risada com sotaque oriental, Toninho já foi puxando-o pelo braço, para os dois irem à casa de Luizinho, arquitetar a “Operação Bola”. Luizinho morava no décimo andar de seu prédio, de forma que, para chamá-lo, estando os dois já na rua, só mesmo indo até o apartamento. E foi o que fizeram.

O próprio Luizinho logo atendeu à porta e convidou os dois amigos para entrar. Toninho foi logo introduzindo o assunto:

- E aí, Lula? Alguma novidade para a “Operação Bola”?
- Olha, o pessoal daquela casa ainda deve estar viajando. Minha mãe passou lá em frente hoje, e me disse que não havia ninguém. Só o cachorro.
- Então vamos comprar outra bola mesmo. – concluiu Japa.
- Nada disso! Vamos recuperar aquela bola. – falou, decidido, Toninho.

Não era só pelo futebol que Toninho queria recuperar a bola. Era também porque a bola era de Rita, garota pela qual Toninho sentia algo a mais do que uma simples amizade. Embora nunca tivesse dito isso a ninguém, Toninho tinha uma certa queda pela Rita, e via com outros olhos o gesto de recuperação daquela bola.

O espírito aventureiro de Luizinho e Japa fez que eles concordassem com Toninho, e resolvessem ir até a tal casa de portão verde. Luizinho já dava como certo o sucesso da operação, tanto que já foi para a rua com seu tênis próprio de jogar futebol, em estado deplorável. Não que o tênis que Luizinho usava para sair fosse muito diferente daquilo, mas este – o do futebol – estava realmente acabado.

E lá se foi o trio rumo à casa guardada pelo cachorrão. No meio do curto caminho, porém, encontraram uma grande amiga, a qual eles chamavam de “Pizza”. Ela estava indo na direção contrária à deles, e parecia um pouco apressada. Tanto que o diálogo ocorrido foi bastante breve:

- Oi, meninos! Vão aprontar o quê, hein?
- Estamos indo buscar a bola que o Luizinho zuniu numa casa. – disfarça Toninho. A pontaria dele não é das melhores.
- Mentira! Foi ele mesmo quem jogou a bola lá. – defende-se Luizinho, irritado.
- Foi o primeiro chute do Tôni nas férias. – acrescenta Japa. Pelo visto, começou bem! E você, “Pizza”, aonde vai? Não vai dizer que vai ao barzinho uma hora dessas, né?
- Acertou em cheio, Japa! A pizza gigante de presunto deve estar saindo agora, e eu vou lá comprar uma pra viagem. O Odin até já me ligou pra avisar...
- ’Peraí, você vai comer uma pizza gigante de manhã? – volta a perguntar Japa, intrigado.
- Não, Japa, ela vai comer peixe cru, igual a você! – brinca Toninho.

“Pizza” ri e segue apressada seu caminho, rumo ao Bar Odin, que ficava numa rua lá perto.

Assim era “Pizza”. Luizinho foi muito feliz quando deu a ela esse apelido: a garota só pensava em comer pizzas, uma atrás da outra, no almoço, no lanche, no jantar, dia após dia. Ela se defendia dizendo que naquela idade as garotas ficam muito ansiosas... Havia até quem dissesse que a “Pizza” gostava mais do Bar Odin do que da própria pracinha. Ela ia lá todos os dias, e até fizera amizade com Odin, o dono do bar. Era Luizinho o único a saber o nome de batismo da “Pizza”: Joana.

Vida que segue, nos fundos da praça uma cena patética ocorre: os três valentões, estáticos, sem mover sequer um músculo de seus corpos, olhando fixamente para a bola e para o ameaçador cachorro da casa de portão verde, pensando em como proceder para recuperar a bola da Rita. Não é preciso dizer que, entre os três heróis e o cachorro da casa de portão verde, havia o próprio portão verde.

Toninho bota as mãos na cintura e começa a analisar a situação, como se fosse um expert em comportamento canino. Quem não o conhecesse e assistisse àquela cena, poderia até pensar que se tratasse de um menino de Q.I. altíssimo.

De repente, Japa interrompe a complexa reflexão de Toninho, rompendo o silêncio com uma brilhante dedução:

- Temos que afastar o cachorro de perto da bola. Aí, alguém pula o portão, apanha a bola, joga ela pra fora da casa, e pula o portão de volta à rua.
- Perfeito, Japa! – apóia Luizinho. Então agora nós temos duas questões a serem resolvidas: 1a) Quem vai invadir a casa e apanhar a bola? 2a) O que usaremos para afastar o cachorro e atraí-lo para alguma outra parte da casa?

Neste instante, Rita chega ao local. Ela havia visto a movimentação toda de seu apartamento, e resolveu aparecer por ali para acompanhar de perto a operação dos garotos.

Inspirado, Toninho estufa o peito, encolhe a barriga e, num tom épico, vai logo avisando:

- A primeira questão já está resolvida: eu entro na casa!

...

Todos então batem palmas para a atitude corajosa do garoto. Rita olha para ele, num misto de admiração e preocupação. Embora já houvesse dito várias e várias vezes que não seria preciso recuperar a bola, os garotos – em especial Toninho – estavam mesmo decididos. Irredutíveis, até.

- Mas o que vão usar para afastar o cachorro? – indaga Rita.

Pronto! Foi só ela fazer aquela pergunta e “Pizza” ressurge, voltando do Bar Odin com uma suculenta pizza tamanho-família, que levaria para sua casa, onde a devoraria em dez minutos. O que estava se passando naquele momento na cabeça de Toninho, Luizinho, Japa e provavelmente até mesmo na de Rita – que também tinha algo deste espírito dos meninos – era justamente usar a big-pizza sabor presunto como isca para o cachorro. O difícil mesmo seria convencer “Pizza” a ceder seu almoço em prol da nobre causa.

Mas a tarefa foi facilitada, e como... A atabalhoada e comilona menina, na pressa de chegar logo em casa, acabou tropeçando numa raiz de árvore, e sua convidativa pizza caiu inteira virada para baixo, num canteiro de terra úmida, onde minhocas e besouros residiam.

Os meninos quase tiveram um infarto de tanto rir! Riam da cena circense proporcionada pelo tombo da garota, mas riam também comemorando a aquisição de uma isca para desviar o cachorrão daquela parte da casa. Rita, embora também tivesse achado graça, foi a única a ir até “Pizza” ajudá-la a se levantar. Luizinho foi logo tratando é de apanhar a outra pizza, que àquela altura já era tida como a salvação da pátria. Ou melhor, da bola.

Quando a turma explicou à “Pizza” o plano, esta resolveu também ficar por ali mesmo e torcer para o sucesso da presepada, à qual ela, mesmo que involuntariamente, já havia dado uma parcela de contribuição.

Japa, que jogara beisebol no Japão, seria o encarregado de arremessar a pizza o mais longe possível da entrada da casa, de preferência lá atrás, onde se podia avistar um tanque de lavar roupa.

...

O japonês estava decidido a acertar o alvo, ainda mais porque na platéia estavam duas garotas, e Japa não podia fazer feio.

O menino apanhou a pizza com a mão direita, curvou o braço do mesmo lado para trás, respirou fundo e arremessou. A pizza atravessou o portão da casa, foi se distanciando, se distanciando, se distanciando, e... foi parar bem embaixo do tanque! O cachorrão foi logo atrás dela.

- Vai, Toninho! – exclamou Luizinho, acenando para o amigo.

Toninho foi. Pulou o portão verde.

O cachorro, que estava lá atrás, perto do tanque, com um pedaço de pizza na boca, olha para trás.

Toninho pega a bola.

O cachorro sai correndo em direção ao garoto.

Toninho arremessa a bola para fora da casa. Luizinho apanha a redonda.

O cachorro se aproxima de Toninho.

Toninho sai correndo e trepa no portão para pulá-lo de volta.

O cachorrão abocanha a perna do menino.

Todos da turma gritam, assustados. Um instante de tensão acontece.

Estranhamente, porém, a perna do menino escorrega da boca do cão, e consegue o herói do dia, intacto, pular o portão de volta à rua.

Festejado por todos, Toninho cai todo desengonçado na calçada. Seus amigos vão até ele e abraçam o sujeito que arriscara a pele para apanhar aquela bola oval e murcha. Rita agradece com uma voz doce e um olhar de admiração, e vai abraçada a ele até a pracinha.

Lá chegando, Luizinho levanta a questão:

- Eu só não entendi porque a perna do Toninho escorregou da boca do bicho.

Japa mata a charada parcialmente:

- É que a boca do cachorro estava cheia de óleo de pizza. Por isso, a perna do Tôni deslizou feito manteiga.
- Mesmo assim o cachorro teria fincado os dentes... - analisa “Pizza”, pensativa.

Toninho dá uma risadinha, limpa o suor do rosto, respira fundo e desvenda o mistério:

- Quando o cachorro me mordeu, eu percebi um detalhe importantíssimo!
- O quê? – perguntaram todos, em uníssono.
- Aquele cachorro era banguela!

Depois dessa, sorrisos no rosto, foram todos embora, com a certeza de que aquelas coisas só aconteciam com o Toninho. Luizinho acompanhou “Pizza” até sua casa, no outro quarteirão. Os dois fofocavam sobre Claudinha, outra garota da turma. Toninho e Rita foram embora juntos, já que moravam no mesmo edifício. Japa deu uma passadinha no bar, para comprar refrigerantes para o almoço.

Ah, o futebol já estava marcado: 5h:30min da tarde, na pracinha.


3 - “OS FINAIS DE TARDE NA PRACINHA”

Quando o relógio da casa de Toninho marcava 5h:25min da tarde, o garoto vestiu a camisa da seleção brasileira, saiu de casa, entrou no elevador e foi rumo ao apartamento 305, buscar a bola de Rita, e, se possível, a própria Rita, para o futebol na praça.

Rita abriu a porta de casa e parecia realmente ter adivinhado a visita do amigo do sexto andar: estava pronta para o jogo também.

Chegando à pracinha, Luizinho e Japa já aguardavam por eles e pela bola:

- As outras meninas vêm mais tarde. – informou Luizinho. A gente começa logo o jogo, depois elas entram...
- Rola a bola aí! – acenou Japa.

A pelada começava, e bastava assistir a um curto pedaço do jogo que qualquer um poderia perceber o prazer da galera em estar lá, na pracinha, jogando futebol. Luizinho era o melhor. Não era nenhum fora-de-série, mas tinha uma certa habilidade nos pés. Os outros jogavam mais ou menos a mesma coisa, mas cada um tinha uma característica própria: Toninho jogava brincando e fazendo palhaçada – o resultado do jogo pouco importava para ele. Japa gostava mais de jogar de goleiro. E as garotas – sim, naquela praça garota também jogava bola – gostavam de aprender cada vez mais.

O jogo transcorria normalmente. A bola estava no pé de Rita, que observa Luizinho numa boa condição de fazer o gol, e então dá o passe ao companheiro, ficando este cara-a-cara com o goleirão Japa. O “craque” da praça ajeitou a bola com pose de decacampeão do mundo e chutou. Chutou e acertou. Acertou em cheio na cara de Claudinha, que vinha chegando à praça de patins, como era de seu hábito, e acompanhada de “Pizza”. A bola rebateu tão forte em sua testa que chegou a estalar, fazendo Claudinha cambalear por alguns instantes.

A partida teve que ser interrompida por causa das gargalhadas dos participantes. Luizinho, de tanto que ria, teve até dificuldades em pedir desculpas à amiga.

Cláudia, a patinadora, era tida como a garota mais bonita da turma. Era também a mais velha e andou um tempo namorando um garoto que morava a uma meia hora dali, e que não gostava muito dos meninos da praça. A melhor amiga de Cláudia era a “Pizza”: as duas moravam em casas vizinhas, numa ladeira lá perto, e também suas famílias eram bastante amigas.

- Senta lá no banco, Cláudia! A dor da bolada já, já passa! – aconselha Toninho.

Enquanto o futebol prosseguia, Claudinha – recuperando-se da bolada – e “Pizza” – sendo solidária a ela - ficaram sentadas, observando o jogo e conversando. Naquele anoitecer, provavelmente “Pizza” deveria estar contando à Claudinha os detalhes da “Operação Bola”.

Qualquer que fosse o assunto das meninas, ele teve que ser interrompido, já que o futebol se encerrara e os peladeiros se dirigiam ao banco onde estavam as duas amigas.

Japa foi o primeiro a chegar:

- Por que vocês duas não montam uma pizzaria? A “Pizza” faria as pizzas e a Cláudia as entregaria de patins...

Depois, veio Luizinho:

- Não ia dar certo. A “Pizza” ia acabar comendo tudo!

Logo após, chegava Rita:

- E quando a Claudinha fosse fazer as entregas, um monte de homens iria paquerar ela na rua.

O último a chegar foi Toninho:

- Súbito resolvo me sentar.

Sentados, alguns no banco e outros no chão mesmo, o sexteto tinha assuntos para passar a noite inteira conversando. Já eram por volta das 7h, e as luzes da pracinha se acendiam. Iluminada, à noite, a Praça Valdir Constantino ficava ainda mais bonita, e a turma estava em seu local mais romântico, perto de uma árvore enorme, acolhedora, cuja espécie, segundo Japa, não existia no Japão.

- Sabiam que este mês a pracinha completa cinqüenta anos de existência? – indaga Luizinho, com ares de sabichão.
- Poderíamos comemorar comendo uma pizza no Odin. – opina “Pizza”.
- Ou então podemos dar uma pequena festa no salão de festas do prédio do Japa. – rebate Cláudia, já recuperada da bolada.
- Uma festa? Excelente idéia! Nós nunca organizamos uma; só penetramos nas festas dos outros! Podemos também convidar o pessoal do colégio e dos arredores! – idealiza Luizinho.
- Uma festa em homenagem à pracinha? Contem com o meu apoio! – exclama Rita, erguendo a mão que lhe restava.
- Amanhã mesmo vou conversar com o síndico do meu prédio sobre a possibilidade do uso do salão de festas. – informa Japa.
- ’Peraí! – interrompe Toninho. Se a festa é em homenagem ao aniversário da pracinha, por que então não a fazemos aqui, na própria praça?

...

Um instante de dúvidas se faz presente na turma. A pergunta de Toninho pegara seus amigos de surpresa. Algumas questões deveriam ser resolvidas, mas, aos poucos, todos foram absorvendo melhor a idéia:

- Cada um poderia trazer uma guloseima. – sonha acordada “Pizza”, a mais comilona.
- Mas onde botaríamos os pratos? – pergunta Luizinho.
- Aí, cada um poderia trazer uma mesinha de casa, e juntando todas as mesas, formaríamos uma mesona. – soluciona Rita.
- Onde ligaríamos o som? Aqui não tem entradas para tomadas. – levanta a questão Cláudia, olhando para os arredores.
- Som? – pergunta Japa.
- É. Festa sem música não tem graça. – completa Cláudia.
- Eu posso trazer o meu toca-fitas portátil. O som não é lá grande coisa, mas é movido a pilha. – oferece Toninho.
- Podemos também enfeitar a pracinha com bandeirinhas, como se fosse uma festa junina. – propõe Japa, sem muita convicção.
- Só que estamos em dezembro. – lembra “Pizza”.
- Ah, mas isso é apenas um detalhe. Ninguém vai nem reparar se fizermos uma festa junina em dezembro. – brinca Rita.
- Gente, estamos nos esquecendo de uma coisa! – diz Claudinha, num tom de voz mais sério.
- O quê? – perguntam os outros cinco.
- Nós gostamos da pracinha. Isso não quer dizer que todo mundo goste... De repente, a gente vai convidar um monte de gente, eles até que vão se interessar, mas, ao saberem que a festa será numa praça, nem virão. – explica a patinadora.
- Se não vierem, tudo bem! Faremos a festa só para nós mesmos. – sugere, um pouco irritado, Toninho.
- Discordo do Tôni. Por mim, a festa deveria contar com outras garotas... – fala Japa, com cara de levado.
- E com outros garotos. – completa “Pizza”.
- Sim, mas como iremos convencê-los a vir à festa? – questiona Cláudia.
- Podemos anexar aos convites um folheto contando um pouco da história da praça. Coisas do tipo: seu ano de fundação, sua metragem, o tipo de vegetação etc. De repente, assim, os convidados se interessariam pela praça. – dá a idéia Luizinho.
- Ninguém quer saber disso, Lula. – discorda Toninho. Se ainda escrevêssemos neste folheto as nossas histórias, os casos que aconteceram conosco...
- Nem assim. – rebate “Pizza”. Cada turma acha suas próprias histórias mais interessantes... Nós gostamos das nossas histórias, mas os convidados que forem ler o folheto, assim como nós, também devem fazer parte de alguma turma, e preferir suas próprias histórias. Eles não vão se interessar pelos nossos casos...
- Acho que a solução é contar a história da praça, porém incluindo um “algo mais”. – conclui Luizinho com uma cara de traquina.

...

Ninguém entendeu nada.

Luizinho, então, chamou os outros dois garotos para trás da árvore, e cochichou alguma coisa no ouvido deles. Qual seria sua brilhante idéia? Enquanto as meninas se perguntavam o que eles estavam planejando, deu para ouvir nitidamente as gargalhadas de Toninho e Japa. O sorriso maroto dos garotos, voltando de trás da árvore, indicava que eles haviam aprovado a idéia de Luizinho. Às meninas, restava o mistério.

- Está tudo resolvido. – informa a elas Luizinho. Vocês, meninas, farão os convites, e nós faremos o “folheto explicativo”.
- Explicando a história da praça e esse tal de “algo mais”? – pergunta, desconfiada, Rita.
- Exato! – responde laconicamente Japa, sem querer dar margem a mais perguntas.
- Fechado! – aceita “Pizza”, falando em nome das garotas.

Fechado também estava o tempo. Um raio caiu lá por perto e uma forte chuva logo desabou. Já eram 11h:30min e todos resolveram ir embora, antes que a terra da pracinha se transformasse em lama.

Os meninos foram para a casa de Japa, fazer o tal folheto explicativo, de acordo com o objetivo da turma: atrair pessoas para a festa na praça.

Toninho e Luizinho eram os mais criativos. Foram eles que deram a maioria das idéias do folheto. Japa entrava com a correção dos erros de português e com a digitação em sua máquina de escrever dos anos sessenta. Após muito debaterem, o texto ficou pronto à meia-noite e meia.

Toninho e Luizinho foram embora satisfeitos. Japa foi dormir tranqüilo. Missão cumprida.


4 - “PREPARATIVOS PARA A FESTA”

O texto do folheto ficou da seguinte forma:


----- Histórico da Praça Valdir Constantino -----

Fundada em 1949, contando com 400m2 de extensão e uma vegetação das mais bonitas, a Praça Valdir Constantino foi palco de inúmeros acontecimentos importantes. Vamos a eles:

· Foi aqui que o craque Zico deu seus primeiros chutes numa bola, já demonstrando um pouco de sua arte, que se consolidaria anos depois.
· A pracinha foi também palco de acontecimentos enigmáticos. Dizem que, em 1992, caiu aqui um disco voador, e um ser extraterrestre foi arremessado para fora dele. Ele já foi visto por algumas pessoas, e reza a lenda que até hoje vive escondido atrás das moitas da praça.
· Também foi aqui onde algumas das mais belas modelos brasileiras começaram suas carreiras. Todo ano, a pracinha é palco de um desfile de mulheres de biquíni, com o objetivo de revelação de novos talentos das passarelas. E neste ano, o desfile ocorrerá justamente durante a festa de aniversário da praça.
· A festa de quarenta anos da pracinha, há dez anos atrás, já foi um tremendo sucesso! Porém, a deste ano promete superar aquela, já que contará com um equipamento de som de primeiríssima linha e comidas feitas pelas mais conceituadas cozinheiras das redondezas, incluindo até mesmo pratos típicos da cozinha japonesa.

Não Percam!
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Logicamente, as informações contidas não correspondiam exatamente à verdade absoluta, mas, se a meta era chamar a atenção dos convidados para a festa, até que os garotos foram bem inventivos.

Japa acordou cedo no dia seguinte e bateu cem xerox do folheto, para serem entregues juntamente com os cem convites que as meninas estavam fazendo.

Na casa de Claudinha, o assunto era um só: os preparativos para a festa. Rita e “Pizza” foram para lá logo depois do almoço. A data do evento já estava definida: seria no dia seguinte. Os convites já estavam feitos e impressos no moderno computador de Cláudia:


-------Você está convidado para uma festa!-------
Aniversário da Praça Valdir Constantino
(50 anos)
Local: Praça Valdir Constantino
Data: 05 de dezembro
Horário: a partir das 17 horas

Contamos com sua presença.
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- E agora, o que mais falta para resolvermos hoje? – pergunta “Pizza”.
- Temos que entregar os convites com os folhetos, dividir as tarefas de trazer os pratos de comida... – começa a responder Cláudia.
- ...Comprar bandeirinhas e enfeitar a pracinha. – emenda Rita.
- Amanhã, antes da festa, vamos ter que trazer as mesas pra praça. – lembra “Pizza”.
- E o Toninho terá que trazer o som. – finaliza Rita.

As garotas estavam realmente preocupadas com alguns pontos pendentes da festa. Enquanto isso, os meninos se reuniam na casa de Toninho, para reler o folheto, e, quem sabe, inventar mais um monte de mentiras para enriquecer seu texto inverossímil:

- Aí, Toninho! Que tal escrever aí que daqui da pracinha partiu um grupamento militar que lutou e venceu na primeira guerra mundial? – sugere Luizinho.
- Ô seu burro! Na época em que a pracinha foi fundada nem havia mais isso! – explica Japa. E, além do mais, não gosto nada, nada desta história de primeira guerra mundial...

TRRRIIIMMM! – toca o telefone na casa de Toninho.

- Alô. – atende o menino.
- Alô, Toninho? É a Cláudia. Tudo bem, amigo? As meninas estão aqui em casa, nós estamos organizando algumas tarefas. Vocês fizeram aquele folheto?
- Sim, sim, claro!
- E aí, ficou legal?
- Se ficou legal, Claudinha? (nesse instante os três garotos começam a rir). Claro, claro, ficou ótimo, Claudinha. Melhor, impossível!
- Nós queríamos combinar com você, o Luiz e o Japa quem vai trazer o quê.
- Vamos então até a pracinha. Lá nós resolvemos tudo.
- Você acha necessário irmos até lá? Por que não falamos logo pelo telefone?
- Minha mãe está querendo ligar agora. Ouça só ela reclamando: (nesse momento, Toninho cochicha com Luizinho, pedindo para ele imitar voz de mulher).
- Vamos logo, meu filho! Quero ligar pra sua avó! – disfarça Luizinho.
- Ah, Toninho, me desculpe! Se eu soubesse, nem teria ligado. Vamos então pra pracinha. Leve os folhetos. Peça desculpas à sua mãe. – despede-se uma envergonhada Cláudia.

Passaram os meninos um perfume de camelô que Toninho tinha e partiram, sorrindo, para a pracinha. Japa levava as cem cópias do folheto.

Na portaria do prédio, porém, Luizinho interrompe sua caminhada e questiona aos demais:

- Gente, será que a Cláudia vai aprovar isso aí?

Os outros dois param, pensam, e logo chegam à conclusão óbvia:

- Claro que não. Talvez a “Pizza” também não goste... E agora, o que faremos? - indaga Japa.

...

Os meninos novamente param, refletem, e Toninho opina:

- Vamos entregar os cem folhetos à Rita! As outras duas nem terão acesso a eles!
- Mas então será a Rita quem fará as entregas dos convites e dos folhetos? – pergunta Japa.
- Espero que sim! – torce Toninho.
- Isso a gente vê na hora! Vamos logo pra pracinha. – apressa Luizinho, seguro de que para tudo se dá um jeito.

Chegando lá, meninos e meninas se confraternizam.

“Pizza” fica em pé sobre um banco da praça e inicia uma explanação para a turma:

- Pessoal, temos aqui, já divididas, as responsabilidades por algumas tarefas. Por exemplo: a das comidas. As meninas vão fazer os doces e o cachorro-quente. Os meninos só terão que ir até o Bar Odin e comprar salgadinhos e refrigerantes.

Os garotos se entreolham e pareciam estar pensando nas vantagens de ser homem.

- Temos também uma outra missão já estipulada: a da entrega dos convites e dos folhetos. – prossegue “Pizza”, num tom decidido.

Nesta hora, os meninos respiram fundo, torcendo para que tal tarefa tenha sido entregue à Rita. “Pizza” , então, continua seu discurso:

- A responsável por isso, por andar de patins, e assim agilizar a entrega, será a Cláudia.
- De jeito nenhum! – urra Japa, dando um pulo do chão.

...

Um silêncio repentino acontece naquele momento. As meninas, assustadas, olham para o japonês, branco que nem uma vela, enquanto Luizinho e Toninho tentam prender o riso.

- Por que “de jeito nenhum”? – indaga Rita, desconfiada.
- É... bem... Precisamos da Cláudia para comprar as... as bandeirinhas! Ela tem bom gosto pra essas coisas. – despista Luizinho.
- Obrigada, Lula! Mas se não for eu, quem irá fazer as entregas? – questiona Claudinha.
- A Rita! – exclama Toninho. Sem dúvida, ela seria a pessoa certa para isso! Ela tem o perfil exato de entregadora de folhetos e de convites! Pode até ir com a minha bicicleta, para agilizar.
- A Rita? De bicicleta? – pergunta “Pizza”, preocupada com a amiga maneta.
- Ah, ela já está acostumada... – ameniza Toninho.

Rita olha para seu amigo e percebe que havia algo estranho no ar.

Olhares à parte, era hora do mãos-à-obra. Cláudia foi logo à papelaria, toda feliz com o elogio de Luizinho, e achando mesmo que para comprar bandeirinhas de festa junina era necessário ter bom gosto. Luizinho foi buscar uma escada em sua casa, para botar as bandeirinhas nas árvores. “Pizza” e Japa passaram pelo Bar Odin, para encomendar os salgadinhos pro dia seguinte. Rita foi até a casa de Toninho, apanhar a bicicleta do amigo.

Lá entrando, Toninho mostra a ela o tal folheto que os meninos haviam feito. Rita dá uma risadinha, pega a bicicleta, acomoda na garupa a sacola que continha os convites, os folhetos e a lista de endereços dos convidados, e já está pronta para fazer as entregas.

No elevador, a garota pergunta a Toninho:

- Não vai dar confusão não?

Toninho olha para ela e nada fala.

Ao saírem do prédio, Rita segue de bicicleta pela rua à esquerda, ao passo que Toninho vai até a praça. Claudinha já estava chegando com bandeirinhas mil nas mãos.

- Nossa, Cláudia, o Luizinho tinha mesmo razão! Muito bonitas as bandeirinhas que você escolheu! – dissimula Japa.
- Obrigada, Japa. A propósito, cadê os folhetos de vocês?
- A Rita já saiu para fazer as entregas! – antecipa Toninho.
- Tudo bem! Eu e a “Pizza” vamos pra casa, preparar as comidas. Tchau, meninos! – despede-se Cláudia.
- Tchau! Nós vamos ficar aqui até tarde, enfeitando a praça. – fala um animado Luizinho.

Os meninos trabalharam duro. Vários tombos da escada velha de Luizinho sucederam. Cada um tomou uns quatro. Mas, enfim, às 10h:30min da noite, a praça já estava toda enfeitada de bandeirinhas verdes, azuis, amarelas, vermelhas e brancas.

Também àquela hora, Cláudia e “Pizza” já estavam aprontando os doces, e Rita já chegara em casa, após ter feito as entregas, e terminava de preparar os brigadeiros.

Cansadas, as meninas vão dormir logo.

Acordados, em suas respectivas casas, os meninos têm um só pensamento em mente: “Será que vai dar confusão?”


5 - “HOJE É DIA DE FESTA”

“Pizza”, Cláudia e Rita acordaram cedo e já estavam fazendo o molho do cachorro quente. Almoçaram todas na casa de “Pizza”, e então ligaram para os meninos. Marcaram na pracinha às três da tarde. Cada um deveria levar uma mesa para apoiar os pratos.

Mesinhas foram postas lado a lado, formando uma grande mesa, e forradas com as toalhas de mesa de Rita. A última etapa seria a de apanhar os pratos nas casas das garotas e os salgadinhos e refrigerantes no Bar Odin. Mas isso era tarefa para ser feita instantes antes do início da festa, às 17h.

...

Toninho saiu do banho às cinco e meia da tarde. Vestiu uma roupa e apanhou seu som portátil da década retrasada. Saiu de casa atrasado para a festa, é bem verdade. Mas ele nem ligava, já que achava que àquela hora ninguém teria chegado...

Grave erro de cálculo. Seu prognóstico foi inteiramente equivocado. O local estava simplesmente abarrotado de gente!

Convidados mil iam surgindo de todos os lados com ares de curiosos.

Espantado, estupefacto, Toninho procurou pela turma e logo encontrou as garotas, bonitas e perfumadas. Cumprimentou-as rapidamente e foi então perguntando pelos meninos, que, àquela altura, deveriam com certeza estar em apuros.

Luizinho foi avistado tentando explicar o caso do E.T. a um dos convidados:

- É verdade, ele caiu bem aqui. De vez em quando, até sai dessas moitas aí e vem falar comigo. Mas só comigo! Dos outros ele não gosta. Só de mim!

Japa foi visto “informando” sobre o “Desfile de Mulheres de Biquíni” a uma convidada de corpo escultural:

- Sim, sim, vai haver um desfile, de fato. Você pode participar também. Vai fazer o maior sucesso!

Luizinho passou por Toninho, acompanhado de um colega, ao qual falava sobre a história do Zico:

- Olha, volta e meia ele ainda vem aqui, bater uma bola com a gente!

Toninho olhava aquilo tudo estático, com seu K-7 na mão. Achava muita graça.

Foi quando Teobaldão, garoto faixa preta em jiu-jitsu que morava num luxuoso condomínio perto dali, se aproximou para bradar com sua voz gutural e assustadora:

- Ei, você aí! O som de primeira linha que foi prometido é isso aí? Esse sonzinho portátil movido a pilha? Que negócio é esse?

De mansinho, Toninho tratou foi de apoiar o toca-fitas na mesa e sair de fininho, não sem antes cochichar no ouvido da “Pizza”:

- Súbito resolvo dar uma volta.

Saiu o menino à procura de seus amigos, tendo que desviar de todas aquelas pessoas. A pracinha nunca esteve tão cheia de gente.

De repente, dois braços puxam sua camisa. Eram Luizinho e Japa, que também estavam atrás de Toninho, já cansados de dar tanta explicação fajuta:

- Temos que ir até o bar, apanhar mais salgadinhos! – fala um preocupado Luizinho.
- Vamos lá, Tôni! – reforça um ansioso Japa, o suor a escorrer-lhe pela testa.

Lá se foi o trio, que era um misto de preocupação e divertimento, rumo ao bar. Nem perceberam, porém, que Teobaldão estava bem atrás deles, seguindo Toninho. E louco para arrumar alguma confusão, visando a enriquecer ainda mais seu já vasto currículo de encrencas.

Adentrando o estabelecimento, depararam-se com um Odin todo suado, com seu bigodão repleto de pingos de fritura e uma péssima aparência:

- Venham aqui até a minha cozinha! – ordenou o dono do bar.

Os meninos foram, seguindo Odin rumo à cozinha. O que ainda não haviam se dado conta é de que Teobaldão estava na cola deles, também entrando no recinto logo em seguida. Lá dentro, todos assistiram à lamentável cena em que Odin retirava os salgadinhos da panela com a própria mão, fritos naquele mesmo óleo de quatro dias atrás.

Foi Japa quem apanhou as guloseimas e colocou-as num recipiente para levar à pracinha. Deu meia volta o japonês e bateu de cara com um enfezado Teobaldão, desta vez bufando de raiva:

- ’Peraí, esse aí é o tal “cozinheiro conceituadíssimo”? – bradou o faixa preta.
- Calma, Teozinho! Nós explicamos tudo. – falou, trêmulo, o oriundo de Tóquio.

...

É, desta vez, os meninos não tiveram escapatória. Assumiram que era tudo mentirada, tudo invenção, mas fizeram um acordo com o brutamontes: Teobaldão não bateria em ninguém; em troca, poderia ficar com todo o recipiente de salgadinhos.

Enquanto isso, na festinha, Cláudia e “Pizza” estavam quase desmaiando, já sabendo de todas as invenções, ao acharem no chão da praça um folheto que um dos convidados havia trazido e deixado cair.

As duas chamaram Rita a um canto e fizeram à amiga, já um tanto desconfiadas, a seguinte pergunta:

- Você sabia disto, Ana Rita?

À Rita nada restou senão fazer que sim com a cabeça, assumindo daquela forma que fora também cúmplice da idéia do folheto explicativo de Luizinho. Claudinha e “Pizza” tiveram uma reação intempestiva: ao sentirem-se traídas pela amiga, resolveram romper relações com ela. Não estavam nem muito chateadas com os meninos, que fizeram o folheto, já que elas sabiam que eles eram assim mesmo, eram brincalhões, eram meninos. Mas com Rita, que era garota assim como elas, o sentimento de traição era muito maior.

Uma nuvem de mal-estar instala-se na praça. Isolada, Rita aguardava pelo retorno dos amigos do Bar Odin. Naquela conjuntura, eles seriam mais amigos do que nunca.

Quando os garotos voltaram à praça, trazendo apenas refrigerantes, um outro convidado insatisfeito indagou, em tom de cobrança e cara de pouquíssimos amigos:

- Cadê os pratos típicos da cozinha japonesa?

Realmente, os meninos haviam esquecido mais este detalhe prometido. Mas Toninho tem uma idéia brilhante:

- Lá em casa tem sushi! – informa ao convidado, de bate-pronto.
- O que é sushi, Tôni ? – pergunta Luizinho, curioso.
- Sushi, segundo o Japa, é peixe cru. Lá em casa tem. Vou apanhá-lo. – responde Toninho.

Enquanto Toninho foi a sua casa, os outros cinco componentes da turma se reuniram numa conferência para traçarem o destino da festa. Alguns eram favoráveis a contar logo a verdade aos convidados. Outros, não. Luizinho e Japa ouviram poucas e boas de Cláudia e de “Pizza”, até ficarem com os ouvidos roxos.

Transcorria o debate, quando de repente todos avistam Toninho voltando à praça com seu aquário de peixes na mão, provido de uma etiqueta onde se podia ler a palavra “SUSHI”, e avisando aos convidados em voz alta:

- Atenção, pessoal! Já temos o peixe cru! Mas é só pra enfeitar, hein!

...

Soluçando e cambaleando de tanto que riam, os garotos foram até o amigo palhaço com um banquinho para apoiar o aquário. Os tapinhas nas costas que davam em Toninho eram como se dissessem “Valeu, cara, essa foi demais!”, já que naquele momento não conseguiriam falar sequer uma palavra. E como todas as toalhas de mesa de Rita já estavam sendo usadas, o jeito mesmo foi utilizar a encardida toalha de banho de Luizinho, para forrar o banquinho do aquário.

A felicidade do trio era um espetáculo à parte. Os meninos da praça eram os mais alegres, mas também os mais maltrapilhos da festa. Luizinho veio com seu tênis todo furado. Japa usava a mesma camisa com que jogava futebol. Em Toninho, nenhuma roupa nova era notada. Isso, para eles, era apenas detalhe.

- Essa foi a gota d’água! – berra um dos convidados.
- Eles estão enganando a gente! – engrossa o coro outro.
- Essa festa está horrível! – completa um terceiro.

Foi quando Rita chamou Toninho para um canto. Queria saber até onde iria tudo aquilo, e contou ao amigo que Cláudia e “Pizza” haviam brigado com ela. Foram os dois andando calmamente em direção à mesa de doces. Toninho explicava a ela que o desentendimento era uma coisa temporária, que em pouco tempo tudo deveria voltar ao normal. Mas assumia também que a coisa estava tomando uma proporção enorme, e que a presepada estava fugindo ao controle...

Àquela altura, a pilha do toca-fitas já estava para lá de fraca, e o som, que já era péssimo, ficava pior ainda. A fita que “Pizza” havia trazido já tocava bem lentamente, fazendo com que a voz do cantor parecesse a de um monstro das trevas, tornando de certa forma sinistro o clima da festa. A revolta dos convidados aumentava ainda mais. A pracinha era, agora, algo como um barril de pólvora prestes a estourar.

- Gente, a situação está ficando insuportável! – alerta Claudinha.
- Temos que abrir o jogo. – prossegue “Pizza”
- Concordo com vocês. – apóia Japa, como se fosse um anjinho e não tivesse nada a ver com aquilo.
- Deixem comigo que eu conto tudo! – finaliza Luizinho.

...

Luizinho gostava muito de falar; era o fofoqueiro da turma. Para ele, não houve problema algum em trepar em uma das mesas e começar seu discurso:

- Boa noite, pessoal – começou o cara-de-pau, crente que alguém iria responder a seu cumprimento. Gostaria, em nome dos garotos da praça, de me desculpar pelas informações enganosas contidas naquele folheto. A quem veio aqui somente por causa do que foi prometido e estiver detestando a festa, só posso mesmo é aconselhar que tome o rumo de casa!

Era como se fosse o comunicado de um Chefe de Estado, que mudaria os rumos da humanidade. Todos olharam para o Luiz, que agora não tinha outra coisa que fazer a não ser prosseguir seu discurso, cada vez achando-o mais importante:

- Percebo, porém, que tem gente se divertindo. São pessoas que estão gostando da festa, mesmo sem as extravagâncias que acharam que iriam encontrar aqui. Gostaram de nós, da praça, das comidas que as meninas fizeram, que estão uma delícia... A essas pessoas, prometemos muito divertimento, se quiserem permanecer aqui conosco. Meu recado está dado!

Luizinho desceu da mesa realizado e foi saudado com palmas por seus cinco amigos.

Das noventa pessoas que lá estavam, pelo menos umas oitenta foram embora. As dez que sobraram haviam sentido uma energia especial naquela praça e naquela turma, o que de fato existia e ficava evidente para as mais observadoras.

E assim a festa prosseguia, a partir de agora mais tranqüila, mas também, segundo Toninho, menos divertida. Seria, agora, uma festa igual a todas as outras.

“Pizza” já estava de caso com um italiano, amigo de um amigo de Rita, o qual conhecera na própria festa. Ele, assim como ela, também gostava muito de comida italiana, em especial de pizzas.

Luizinho e Cláudia fofocavam. O assunto era formação de casais:

- Tem uma amiga minha interessada em você. Ela ficou impressionada quando te viu discursar. – fala Claudinha.
- É mesmo? Também tem um amigo meu a fim de você. É aquele lá de camisa vermelha. – rebate Luizinho, apontando para o garoto em questão.
- Jura? Eu também tinha reparado nele... – suspira Claudinha.
- Ah, outra coisa! – lembra-se Luizinho. O Japa gostaria de conhecer melhor a sua prima. Você poderia dar uma “forcinha”?

E assim, Luizinho, Japa, Cláudia e “Pizza” terminaram a festa acompanhados. Rita foi embora cedo, chateada e com dores de cabeça.

A Toninho, restou ficar contando piadas aos demais convidados.

Quando eles se foram, Toninho ficou contando piadas para os peixes de seu aquário.


6 - “MISTÉRIOS...”

Foi Luizinho o primeiro a chegar à praça no dia seguinte à festa. O fofoqueiro foi então chamando um a um todos os componentes da turma. Queria saber dos detalhes de alguns acontecimentos, como, por exemplo, sobre os casais que se haviam formado naquela noite.

Reunir o pessoal, como sempre, não foi tarefa difícil. A pracinha ainda estava enfeitada de bandeirinhas e a turma acomodou-se perto daquela velha árvore.

Luizinho começou seu questionário perguntando a Japa:

- E aí, Japa, como foi ontem com a prima da Claudinha? Quero o nome dela, idade, peso, altura...
- ’Peraí, Lula, o que é isso? – interrompe Japa. Vamos com calma e por partes. O nome dela é... bem... Valéria!
- Vanessa! – conserta Cláudia.
- É, isso mesmo, Vanessa. – prossegue Japa. Bom, a idade, acredito que deva ser a mesma que a minha, agora, peso e altura fica meio difícil saber, né?
- Bem, das quatro questões, você só respondeu a duas, sendo que uma erradamente. Nota dois e meio pra você, Japa! – avalia Luizinho, com ares de professor.
- O que é isso agora, Luiz, uma prova? - pergunta “Pizza”.
- Já que você se manifestou, amiga, a próxima a depor é você mesma! Vamos lá, pode começar! – solicita Luizinho.
- Olha, tudo o que eu tenho a dizer é que o meu caso com aquele italiano não teve nada de muito sério. Ele vai voltar amanhã pra Roma, de repente nunca mais nos veremos...
- O mesmo se aplica a mim e ponto final! – interrompe uma reservada Cláudia.
- Nota zero pras duas! Se dependesse de pessoas como vocês, minha fama de sabe-tudo iria por água abaixo! Mas vamos prosseguir com o interrogatório. Toninho, de pé! É a sua vez! Vamos lá! Com quem você ficou na festa?
- Com ninguém, Lula. Ela foi embora cedo...

Todos olharam para Toninho. O menino deixara escapar uma pista importante sobre seu amor por Rita. A turma, é lógico, ficou curiosa em saber quem era a tal “ela”, a quem Toninho se referira.

- Ah, uma garota desdentada que estava lá. Ela foi embora lá pelas sete horas. – desconversa Toninho, utilizando toda a sua criatividade.
- Tudo bem. Vamos dar seqüência à nossa argüição. – fala Luizinho. Rita: assim como essa tal menina desdentada, você também foi embora cedo, e não ficou com ninguém, certo?
Estava com dor de ouvido, não foi isso?
- Dor de cabeça! – retifica Rita.
- Isso mesmo! Tenho que guardar! Rita foi embora da festa de cinqüenta anos da pracinha às nove horas da noite, com dor de cabeça! Dor de cabeça! Dor de cabeça! Dor de ...
- E você, Luizinho? - interrompe Cláudia. Perguntou a todos nós, mas não falou nada sobre seu caso com a minha amiga. E aí, como foi?
- Olha, Claudinha, foi até bom você ter perguntado. Eu anotei o nome completo dela, idade, peso, altura, endereço, telefone, perfume que usa, tudo! Ainda estou no início do meu processo de memorização, mas pode me perguntar isso tudo daqui a alguns dias, que saberei te responder. – diz o fofoqueiro, na maior cara-de-pau.
- Não queremos saber disso, Luizinho. Queremos saber se foi legal. – observa Japa.
- Sim, sim, claro! A garota, como sempre acontece, ficou apaixonada por mim. – fala um convencido – porém não convincente – Luizinho.

Sem muito interesse por aquele papo, Toninho começou a caminhar pela praça, sozinho. Pensou que, se na festa não houvesse ocorrido tanta confusão, talvez ele até tivesse conseguido ficar com Rita. Por outro lado, sentia que acontecimentos engraçados como aqueles do dia anterior eram importantes para a turma e sempre estiveram presentes em sua vida. Assim sendo, no saldo geral, a festa havia sido mais do que válida!

Pensativo, Toninho de repente interrompe sua caminhada e pára em frente a um dos bancos da praça. Observou lá uma mensagem que alguém havia escrito a caneta e ficou olhando fixo para aquilo, encucado, curioso. Decidiu, então, chamar seus amigos. De início, não atenderam ao chamado; acharam que seria alguma brincadeira. Quando viram, porém, que Toninho estava sério – coisa rara – resolveram ir até ele, e, não menos intrigados, ficaram também olhando estáticos para aquele rabisco no banco:

A e A

...

- Quem escreveu isso? – pergunta “Pizza”, curiosa.
- Antes da festa não estava aí. – observa Toninho.
- Que estranho... – murmura Claudinha, intrigada.
- Será que algum outro casal foi formado? – pergunta Rita.
- Não necessariamente. Pode ser uma pessoa de nome que comece com “A”, e que goste de outra que também tenha a mesma inicial. – deduz Luizinho, olhando para o restante da turma.
- Pode ser também algum código alienígena. – brinca Japa.
- Gente, agora fiquei curiosa! – fala Cláudia.
- Como faremos para resolver este mistério? – indaga Toninho.

Todos ficaram quebrando a cabeça para descobrir quem seriam “A” e “A”. Até que Claudinha teve uma excelente idéia:

- Já sei! Vamos ver na lista de convidados os nomes que começam com a letra “A”!
- Boa, Cláudia! - apóia “Pizza”. Por sorte, estou com a lista aqui no bolso da bermuda. Vamos ver!

“Pizza” apanha a lista e a lê em voz alta. A turma ouvia atentamente:

- Bem, vejamos... De homens, foram chamados: Alexandre, André e Alex; de mulheres, só Alice.
- O Alexandre não pode ter sido. A namorada dele não começa com “A”, ela se chama Fernanda e também estava na festa. – informa Luizinho, logo de cara.
- Nem o André. A letra dele não é assim. – explica Japa.
- Essa Alice é lá do meu colégio. Ela gosta de um garoto chamado Pedro. – descarta Toninho.
- O Alex também não foi. Ele estava com o braço engessado e não poderia ter escrito. – finaliza Cláudia, desapontada.
- Então, podemos concluir que nenhum desses dois “As” estavam entre os convidados pra festa, certo? – raciocina “Pizza”.
- Quem serão eles, então? – questiona Luizinho, bastante perplexo.

De tão envolvido que estava com o mistério daquele escrito, o sexteto nem percebeu a presença de um garoto, aparentando ter uns dezoito anos, muito bem vestido, sentado em um outro banco da praça. Ele nada falava. Parecia um pouco tímido. Deveria estar esperando que alguém se aproximasse dele.

Japa foi o primeiro a avistá-lo:

- Ei, pessoal, quem é aquele indivíduo lá? – pergunta o japonês.
- Nossa, que garoto bonito! – cochicha Claudinha à “Pizza”.
- Vestido desse jeito, deve ser turista. – opina Luizinho, atento a tudo.
- Ele parece meio misterioso... – analisa Rita.
- Sem dúvida, é um forte suspeito. Sem sombra de dúvida! Será que seu nome começa com “A”? – imagina Toninho, botando ainda mais lenha na fogueira.
- Mas ele não estava na festa. – lembra “Pizza”.
- Isso não quer dizer nada. Ele pode ter escrito aquilo no intervalo entre o final da festa, ontem de madrugada, e a nossa vinda à pracinha, hoje à tarde. – raciocina Luizinho.
- Alguém poderia ir lá e perguntar o seu nome. – dá a idéia Rita.

O difícil foi achar esse “alguém”. Todos estavam meio reticentes. O feixe de luz de um dos refletores da pracinha, acompanhado de um punhado de bichinhos-da-luz, incidia em cheio no rosto daquele rapaz, estático feito um zumbi, formando uma cena um tanto ou quanto assustadora. Como ninguém se ofereceu, a turma combinou o seguinte: cada um passaria pelo misterioso garoto e o chamaria por algum nome que começasse com “A”, para ver se ele responderia. Uma fila então se formou.

O primeiro foi Japa:

- Fala, Alberto! Tudo bem?

O garoto nada respondeu. Depois, veio Rita:

- E aí, Alan? Como está?

O visitante continuava calado. O próximo da fila era Luizinho:

- Arquimedes! Você por aqui?

Nenhuma resposta fora ouvida. Na seqüência, viria Cláudia:

- Oi, Adílson, está arrumado hoje, hein!

O garoto já começava a achar que naquela turma só tinha maluco. Era a vez de Toninho:

- Asdrúbal! Quanto tempo, hein!

E nada de resposta. Por último, viria “Pizza”:

- E aí, Aníbal, quais são as novidades?

A seqüência da fila se repetiu por outras três vezes. A turma nem sabia de mais nomes com a letra “A”. Os mistérios daquele dia continuavam.

Até que o tal garoto arrumado resolveu abrir a boca, dizendo laconicamente:

- Eu me chamo Moacir.

Por um momento, o sexteto ficou olhando curioso para aquele garoto, ali sentado, sob enfoque do refletor, um tanto ou quanto tímido, vestindo roupas caras.

Toninho se aproximou e disse:

- Somos a Turma da Praça.

Moacir olhou firme para o garoto, e, para a surpresa de todos, revelou:

- Eu sei.

...

O espanto foi grande. “Pizza” chegou a dar um passo para trás.

- Sabe? - perguntaram todos, alguns para o visitante, outros para si mesmos.
- Assisti à festa que vocês deram ontem. – esclareceu Moacir.
- Assistiu de onde? – perguntou, curiosa, Rita.
- Do terraço de minha casa. Deu pra ver toda a bagunça que vocês fizeram. Foi muito divertido. – explicou Moacir, com um leve sorriso.
- Da sua casa você avista a pracinha? – duvidou “Pizza”, encucada.
- Sim. Minha casa fica logo aqui atrás. É uma de portão verde.
- Portão verde? – perguntou Luizinho, olhando com o rabo do olho para Toninho e rindo disfarçadamente.
- Sim. – continuou Moacir. É uma casa que tem um cachorro velhinho...
- Ah, sei, aquele cachorro banguela? – deixou escapulir Toninho.
- É. Como sabe que ele é banguela? – questionou, curioso, Moacir.
- Toninho é um rapaz muito observador... – dissimulou Japa.
- A propósito, Moacir, você estava viajando, não é? – perguntou Cláudia.
- Na verdade, eu vivo viajando. – respondeu o garoto.
- Como assim? – quis saber Japa.
- Meu pai é dono de uma rede de lojas. – prossegue Moacir. Ele tem uma loja em cada cidade do país, e viaja muito para visitá-las, ver como estão indo os negócios. Quando estou de férias, eu o acompanho nas viagens. Como não gostamos de hotéis, meu pai comprou uma casa em cada cidade, para nós ficarmos durante estas viagens. E a nossa casa aqui no Rio de Janeiro, é, como disse, aquela de portão verde, que compramos no mês passado.
- Puxa, você deve ser bastante rico, hein! – comentou Luizinho.

Moacir era de fato um garoto rico, acostumado a ambientes luxuosos e a programas caros, como andar de jet-ski e saltar de asa delta. No início, bem que achou estranho estar lá, em uma praça, conversando com uma turma. Ele nunca havia feito aquilo antes. Com o tempo, porém, iria acostumando-se a todo aquele contexto...

- Mas não é quem nós estamos procurando. – lembrou Japa, decepcionado.
- Como assim? – indagou Moacir.
- Estamos atrás de alguém cujo nome comece com a letra “A”. Essa pessoa escreveu, naquele outro banco, “A” e “A”, e estamos encucados com isso. – explicou o japonês.
- Por isso é que estavam me chamando de um monte de nomes que começam com “A”?
- Exatamente. – respondeu “Pizza”, brevemente.

Moacir pôs-se a rir. Seu riso era o sinal definitivo de que ele estava começando a se soltar.

Os sete ficaram conversando na praça até de madrugada. A turma contava a Moacir antigas histórias, comentava sobre o Bar Odin, e até assumiram que Toninho havia invadido sua casa. Moacir falava sobre a sua vida, seus programas, seus divertimentos. O papo era bastante variado. As diferenças de cultura e de vivência eram evidentes. Mas era uma conversa bem agradável, acima de tudo.

O mistério do “A” e “A”, porém, prosseguia sem solução...


7 - “A MELHOR TURMA DO MUNDO”

Odin tinha motivos de sobra para estar feliz daquele jeito. Por iniciativa de “Pizza”, seu bar recebia para o lanche aqueles sete ilustres convidados. Uma porção de batatas fritas e outra de empadinhas foi servida, sem demora, na agitada mesa. “Pizza”, porém, não se contentou somente com aquilo:

- O de sempre! – pediu a comilona, dando uma piscadinha de olho.

Odin sabia que aquilo significava uma pizza de presunto tamanho-família, com direito a catchup e mostarda, e ainda bastante orégano. Já estava até pronta, e, embora o pedido tivesse sido feito por “Pizza”, quando o prato veio à mesa todos avançaram e roubaram uma fatia.

Todos, menos Moacir:

- Como podem comer uma pizza tão engordurada? - perguntou, assustado.
- É gostosa, sim. Até seu cachorro gostou... – comentou Rita.
- Coma um pedaço também! A gente divide o meu! – ofereceu Japa.

Moacir nunca havia comido uma pizza de barzinho. O negócio dele eram os restaurantes finos, as pizzarias caras. Mas a pizza que Odin fazia, embora realmente um pouco oleosa, era uma delícia. Moacir, meio cauteloso, acabou aceitando metade da fatia de Japa, a qual o japonês apanhou com a ponta dos dedos e colocou no prato dele.

Moacir não teve como negar:

- Nossa! Esta pizza é mesmo muito boa!

Após uma rápida passada de olho no cardápio, o garoto concluiu:

- Mas é tão baratinha...
- E quem disse que para ser boa tem que ser cara? – indagou Luizinho, sob olhares de aprovação dos amigos.

Outra pizza foi pedida, desta vez de cebola. Todos dividiram. Moacir adorou. Depois, mais outra. Novamente, uma fatia para cada um. Àquela altura, alguns já estavam de barriga cheia; outros, simplesmente não teriam dinheiro para mais pizzas.

- Estou satisfeito. – comentou Toninho, que, na verdade, estava é duro mesmo.

O garçom traz a conta. Moacir a confere e abre sua carteira:

- Pessoal, hoje é por minha conta! Podem deixar que eu pago tudo! – anuncia o magnata.
- Súbito começo a sentir fome de novo. Odin, traga mais uma fatia! – brinca Toninho, estalando os dedos a pedir mais comida.

Todos começaram a rir. Moacir olhou para Toninho como se estivesse pensando “que garoto folgado!”. Mas a turma logo explicou-lhe que era tudo brincadeira:

- O Toninho é palhaço assim mesmo. – contou Claudinha.
- Ele tem essa mania de falar “súbito”. – esclareceu Japa.
- Mas, pra mim, ele realmente ainda está com fome. – observou “Pizza”.
- E você, não está não? – rebateu Toninho.

Mais uma pizza foi servida, desta vez apenas para Toninho e “Pizza”. Moacir fez questão de pagar tudo. E o fez com prazer. Não pelo simples gesto de pagar, mas sim pelo fato de estar sendo gentil com aquelas pessoas que tão bem o acolheram.

Todos agradecem, e, satisfeitos, partem do Bar Odin, andando rumo à pracinha.

- Ué! Pracinha de novo? – perguntou, abismado, Moacir.
- De novo e sempre! – respondeu Luizinho.
- A pracinha é o melhor lugar do mundo! – filosofou Toninho.

...

Os sete chegaram à praça ainda com gosto de pizza na boca. Já eram 5h:30min da tarde, e era a hora do futebol, mesmo que logo após o lanche. Mas a pracinha ainda estava enfeitada de bandeirinhas da festa, e algum chute mal dado pelos “craques” – o que era bastante provável que acontecesse – poderia atingir e rasgar aqueles enfeites, que a turma pretendia guardar para alguma futura ocasião.

Luizinho foi então em casa e apanhou novamente aquela escada velha. Os meninos iam retirando as bandeirinhas, e as meninas dobrando-as e guardando-as. Até Moacir ajudou. Era a primeira vez que ele subia numa escadinha, e, para cada tombo que os outros meninos tomavam, Moacir levava uns cinco. A calça social que o magnata usava já estava ficando toda suja de terra da pracinha.

Mas o futebol, enfim, já podia ser jogado.

- Quer brincar com a gente, Moacir? – propôs Claudinha, gentilmente.
- Garotos da praça contra o Moacir e as garotas. – sugeriu Luizinho.
- Ué! Aqui menina também joga? – indagou, perplexo, Moacir.
- Joga, e até melhor do que o Japa. – alfinetou Toninho.
- Claudinha e “Pizza” jogam no ataque. – informou Japa.
- A Rita só não pode jogar de goleira... – brincou Luizinho.
- Os gols estão demarcados por pedras, ’tá vendo? – explicou Rita, apontando na direção certa.
- Ué, não tem baliza? Não tem marcação de grande área? Não tem quadra de esportes? – bombardeou Moacir, parecendo confuso devido ao sem-número de improvisos.

Aquela partida seria igual a todas as outras, não fosse a figura exótica de Moacir, todo arrumado, de sapato de couro, tentando acertar a famosa bola oval e murcha. Não que os outros fossem excelentes jogadores, mas Moacir realmente não levava jeito algum.

Lá pela metade do jogo, os garotos resolveram ajudar o novo amigo a se sentir mais à vontade. Luizinho emprestou-lhe seu tênis, cujo estado de conservação não é preciso mencionar novamente; Toninho concedeu-lhe um short vermelho, o qual Moacir vestiu lá atrás da árvore mesmo; Japa lhe emprestou uma camisa da seleção da República de Camarões. O magnata, agora vestido de “garoto da praça”, era a imagem incontestável da felicidade: sorria, corria, chutava, atacava, defendia, vibrava... Até gol ele fez!

Terminada a pelada, Moacir ainda foi apanhar seus modernos patins para andar com Claudinha. Nisso ele era bom, e ensinou a ela algumas manobras que havia aprendido num curso. Já Claudinha teve que explicar a ele como conseguia a proeza de andar naqueles patins velhos, já sem freios, cujas rodas estavam todas empenadas, e até descer a ladeira de sua rua.

Após a exibição de patinação daquela dupla, Moacir ainda teve que aturar uma dúzia de perguntas de Luizinho:

- Quero sua ficha completa. Se alguém quiser saber alguma coisa sobre você, quero que venha a mim e pergunte. – explicou o fofoqueiro.

Moacir não se incomodou em responder ao minucioso interrogatório de Luizinho. Ele estava é achando muita graça de tudo. A última pergunta foi feita quando as luzes dos holofotes já haviam sido acesas, os bichinhos-da-luz a norteá-las.

Exausto, o grupo senta no chão da praça e começa a descansar. Todos estavam calados. A fartura de pensamentos contrastava com a escassez de palavras.

Moacir rompeu o silêncio:

- Sabem de uma coisa? – perguntou.
- O quê? – quis saber Rita.
- Vocês são a melhor turma do mundo!

...

Orgulhosos, todos sorriem. Era um prazer enorme escutar aquilo de uma pessoa que não fazia parte da turma, que não fazia parte nem mesmo daquele universo deles. O sorriso estampado no rosto de cada um pela satisfação em ouvir aquilo era visível. Mas pode-se dizer que o sorriso de Toninho era ainda maior. Era ele quem mais gostava da turma da praça.

- Vocês são alegres, divertidos, parecem ser pessoas felizes. – prossegue Moacir. Eu pensava que fosse impossível ser feliz sem ter luxo, sem ter montes de dinheiro. Mas vocês conseguem... vocês sempre arrumam alguma coisa pra fazer. Improvisaram um campinho de futebol; organizaram uma festa mesmo sem recursos; passaram horas debatendo sobre um simples rabisco no banco... Tudo isso pelo simples prazer de estarem juntos, uns com os outros, e de estarem aqui, na pracinha. Vocês realmente são demais!

Uma longuíssima salva de palmas foi dirigida a Moacir. O garoto descobria um novo mundo. Havia aprendido muito naquele dia em que passara com a turma da praça, talvez o mais importante de sua vida.

Mas Japa fez uma observação importante sobre o discurso do novo amigo:

- Só acho que já fomos mais unidos. – disse o japonês.
- Como assim? – perguntou Moacir.
- As meninas estão brigadas. A Cláudia e a “Pizza” não estão falando com a Rita...
- É... bem, nenhuma turma é perfeita. – concluiu, meio desapontado, Moacir.

Naquela noite, porém, não haveria espaço para desuniões. As meninas se abraçaram e fizeram as pazes. A mágoa de Claudinha e “Pizza” já havia passado, e a empolgação demonstrada por Moacir para com a turma havia sido fator decisivo para aquela atitude. Todos os sete então resolveram se abraçar.

- Moacir, agora que elas fizeram as pazes, você poderia repetir aquela frase que disse há instantes atrás? – solicitou Toninho.
- Qual frase? – perguntou Moacir.
- Aquela...
- Ah, sim, pois não: vocês são a melhor turma do mundo!

...

Moacir nunca mais seria o mesmo. Ele agora havia aprendido a enxergar que a felicidade está em pequenas coisas. Nos dias que se seguiram, Moacir e a turma se divertiram até dizer chega. O garoto até já participava de alguns “planinhos” com os meninos - quando não era vítima deles.

Foi engraçado o dia em que Luizinho, Japa e Moacir disseram a Toninho que aquele cachorro banguela estava com raiva, e que quem houvesse sido mordido por ele também iria contrair tal doença. Toninho ficou desesperado!

E aquela vez em que Luizinho e Toninho disseram a Moacir que o Japa adorava ser chamado de “Spectraman”? O magnata, ao chamar o japonês daquele apelido, por muito pouco não foi agredido e expulso da praça.

Também as garotas gostaram muito do Moacir. Ele tinha um álbum de fotos suas com pessoas famosas, as quais conhecera freqüentando locais da alta roda. As meninas pediam para que Moacir lhes desse algumas dessas fotografias, e o garoto as concedia sem pensar duas vezes. Moacir queria mais era bater um monte de fotos com a turma da praça.

Todos os dias daquela semana foram muito divertidos. Ao final de cada um deles, Toninho pedia a Moacir que repetisse aquela tal frase, que a turma adorava ouvir e que Moacir adora falar:

- Vocês são a melhor turma do mundo!


8 - “QUADRO-NEGRO”

- Tchau, pessoal! Foi muito bom ter conhecido vocês.
- Tchau, Moacir. Boa viagem e até breve. – despediu-se a turma.

Estavam todos na casa de Moacir. Não era um adeus, mas sim um “até logo”, já que ele iria viajar com seu pai para outras cidades do país, e em alguma outra ocasião teria que estar novamente no Rio de Janeiro.

Luizinho já estava informado sobre seu paradeiro:

- Moacir vai passar um tempo em Manaus, depois irá para diversas cidades do Nordeste. Aí, suas aulas já deverão ter começado, em São Paulo, mas ele deve voltar pra cá nas férias de meio de ano, em julho.

A turma, é bem verdade, ficou um pouco chateada com a partida do novo amigo. Porém, lembraram-se logo de que haviam sido muito importantes na vida de Moacir – o que os deixava orgulhosos – e que ele em breve retornaria. Todavia, como estavam um pouco chateados, resolveram ir à pracinha para espantar o baixo-astral (muito embora, mesmo que estivessem alegres, também teriam ido para lá).

Chegando ao tradicional ponto de encontro, Rita percebeu que, numa das latas de lixo da praça, alguém havia jogado fora um quadro-negro velho. Dependendo da criatividade de cada um, aquele artefato poderia vir a ter várias utilidades. E a turma resolveu então adotar aquele quadro-negro e introduzi-lo à paisagem da pracinha, pendurando-o num galho de árvore baixo. “Pizza” foi logo em sua casa e apanhou uma caixa de giz de sua prima mais nova.

Japa foi o primeiro a escrever no quadro:

“JOGO DE HOJE: BRASIL X ARGENTINA
ÀS 17h, NO CANAL 2”

- Bem lembrado, Japa! - exclamou Toninho.
- Este jogo é imperdível! – vibrou Luizinho, chutando uma lata vazia.
- E você, vai torcer pra quem, Japa? – perguntou Rita.
- Ora, eu já me considero quase um brasileiro. – explicou o japonês. Se depender de mim, o jogo será uns 4 x 0 pro Brasil.
- Poderíamos trazer uma TV pra cá e assistiríamos ao jogo todos juntos. – deu a idéia Claudinha, sob olhares de aprovação do grupo.
- Sim, mas você se esquece de que aqui não temos entradas para tomadas... – lembrou “Pizza”, quebrando momentaneamente aquela euforia.

Mas a sorte ajudou. Odin passava por ali naquele momento, e, ao escutar a conversa, se ofereceu para ajudar a turma. Odin era um típico transeunte da praça, que passava muito por lá levando comidas e utilidades para o bar. Como não poderia deixar de ser, auxiliou a patota em mais aquela questão:

- Eu tenho um fio de extensão bastante longo. Vocês podem ligar uma ponta na casa de alguém e a outra na televisão. Assim, seria possível trazer a TV e assistir ao jogo aqui, já que gostam tanto da praça.
- Boa idéia, Odin! Sempre fui sua fã! – exclama “Pizza”.
- Se soubéssemos disso, poderíamos ter trazido um som melhorzinho pra festa. – lembra Luizinho.
- Que nada! Com aquele meu toca-fitas horrível foi mais divertido! – opina Toninho, com um ar despojado.
- Daqui a cinqüenta anos ainda nos lembraremos daquele som do Tôni. – reforça Japa.
- Mas hoje precisamos mesmo é da extensão do Odin. – conclui Rita.

De fato, a idéia de Odin foi mesmo muito oportuna. A casa mais próxima da praça era a de Japa, uma vez que seu prédio ficava bem lá em frente e ele morava num andar baixo, o segundo. Não foi difícil puxar o fio de extensão até a tomada de seu quarto.

Foram Rita e Luizinho que trouxeram a TV para a pracinha, a dez minutos do início do jogo, e chamaram o restante da turma. Chegando lá, contudo, todos se depararam com uma mensagem escrita no quadro-negro:

“Ofereço-me para fazer faxina
nas casas do bairro.
Cobro barato.
Informações: Japa. (Tel.: 266-1907)”

...

Todos caíram na gargalhada.

- Isso é coisa do Toninho... – analisa Cláudia.
- Eeeuuu?! – tenta desmentir Toninho, sendo porém traído por seu inevitável riso.
- Pode esperar que vai ter volta! – avisa Japa, dedo em riste.
- Gente, vamos ligar logo a TV! O jogo já, já vai começar! – alerta Rita.

CLIC – ligou a TV Luizinho.

A televisão foi apoiada num banco da praça e a turma se sentou no chão de terra mesmo, exceto Japa, que assistiria ao jogo de cima de um galho de árvore. Os dois times já estavam entrando em campo, e a expectativa era muito grande. Se por um lado gostava de jogar, por outro Claudinha nunca entendeu muito de futebol, e os meninos se aproveitavam disto:

- Quem é que vai jogar mesmo, hein? – indaga a garota dos patins, inocentemente.
- Cortadores de Cana x Metalúrgicos. – brinca Luizinho.
- É mesmo? Nossa, mas o estádio está tão cheio... Este jogo deve ser mesmo muito importante! - conclui Claudinha, achando tudo meio estranho. Por que tem dois homens vestidos de preto e com bandeirinhas nas mãos?
- É porque, logo após o jogo, haverá aí no campo uma corrida de fórmula-1, e eles é que vão dar a bandeirada final. – improvisa Japa.

O jogo estava muito interessante, e, com o passar do tempo, a turma deixou um pouco de lado as brincadeiras, ficando todos concentrados na partida. O primeiro tempo terminara com o placar de 1 x 0 para o Brasil. No intervalo do jogo, foram em casa apanhar cadeiras, já que estavam muito mal acomodados.

Toninho e Rita foram juntos, tomando o rumo daquele velho edifício no qual moravam.

- Você está muito bonita hoje, Rita... – elogiou o garoto, na metade do caminho.
- Obrigada. Você também está muito bem, Toninho. – respondeu ela.
- Vou passar na sua casa pra te ajudar a trazer a cadeira...

Toninho achava que deveria logo fazer alguma coisa para realizar seu sonho. Os dias iam passando, as férias estavam sendo divertidas, mas Toninho achava que, se Rita se tornasse sua namorada, sua vida seria mais completa. Ele sabia que, nos próximos dias, deveria tomar alguma atitude...

De volta à praça, para assistirem ao restante do jogo em suas cadeiras, os seis amigos observaram que a mensagem escrita no quadro-negro havia sido modificada. Era a “volta” que Japa prometera a Toninho:

“Dou aulas particulares gratuitas de Matemática!
Aluno nota 10, nunca fiquei em recuperação.
Estudo por prazer, não por obrigação.
Contatos: Toninho. Tel.: 266-0694”

- Boa, Japa! - sorri “Pizza”.
- Apaga isso aí! – exclama Toninho.
- Se o Tôni desse aulas, os alunos iam é desaprender o que já soubessem! – provoca Luizinho, como se fosse um excelente aluno.
- Atenção pessoal! Vai começar outro jogo agora! – avisa Cláudia, acenando, toda empolgada, para todos.
- Não, Claudinha! É o segundo tempo do mesmo jogo! – conserta Rita.

...

A partida terminou Brasil 2 x Argentina 1, e serviu não só para a seleção passar para uma próxima fase da competição, como também para que as garotas aprendessem mais sobre futebol. Logo após o jogo, elas pediram para que os meninos lhes ensinassem, detalhadamente, regras, táticas e estratégias daquele esporte. Toninho, Luizinho e Japa o fizeram utilizando o quadro-negro. Foi uma verdadeira aula!

Mas o que a turma gostava mesmo de escrever no quadro eram aqueles recadinhos, onde um brincava com a cara do outro. Nos dias seguintes, várias mensagens foram escritas, tais como esta, por Luizinho:

“ - Transporte de Cargas Pesadas –
Faço tudo com meus patins.
Não importa a distância e o tipo de carga.
Informações: Cláudia (2ª casa da ladeira)”

Ou então esta outra, feita pelas garotas:

“Desafiamos Teobaldão para uma luta!
Pode nos procurar a qualquer hora,
já que acordamos supercedo.
Ass.: Meninos da Praça.”

Houve uma noite, porém, que todos combinaram de assistir na pracinha a um filme de suspense, que iria começar à meia-noite em ponto. Tipo de coisa típica de gente daquela idade. Sentir um friozinho na espinha ao sair de casa quase à meia-noite, para assistir com os demais a um horripilante thriller.

Quando chegaram, porém, a local e hora marcados, e para espanto geral, uma mensagem já estava esperando por eles...

A e A


9 - “O PADRE E A PRAÇA”

Assustados, resolveram todos assistir ao filme na casa de “Pizza”.

Lá, debateram muito o assunto em questão: Quem seriam “A” e “A”? Será que apenas um dos “A”s escreve as mensagens, ou os dois? Eram perguntas que deixavam os membros da turma da praça intrigados, até porque não tinham noção das respostas, até então.

Luizinho tinha uma opinião bastante pessoal sobre o assunto:

- Pra mim, é alguém que está querendo brincar conosco. Enganamos muita gente com aquela história de folheto da festa; não se esqueçam de que a primeira mensagem apareceu logo após aquele evento. Estão querendo se vingar de nós, pois não gostaram daquelas brincadeiras.

Aquela era a hipótese do Luizinho. Tão logo ele acabou de apresentá-la aos amigos, também se encerrara o filme de suspense ao qual assistiam sem dar muita importância. Já era madrugada. O vento lá fora fazia um barulho meio sinistro. Trovejava. O gato preto de “Pizza” entrou em casa pela janela tremendo de frio. Embora não admitissem, alguns estavam com medo de voltar para casa.

- Deixa o pessoal dormir aqui hoje, “Pizza”. - pediu Claudinha.

Cláudia estava preocupada com seus amigos. Não era nem por ela, já que sua casa ficava ao lado da de “Pizza”. Mas Luizinho, Japa, Toninho e Rita teriam que andar um pouco, e até passar pela pracinha, para chegarem em suas casas.

- Já pensou se eles encontram um dos “A”s, no meio do caminho, a uma hora dessas? - imaginou Cláudia.
- Ou até mesmo os dois ”A”s, né? – concordou “Pizza”.

Todos então ligaram para seus pais, avisando que dormiriam na casa de “Pizza”. Claudinha bem que podia ter ido dormir em casa, mas preferiu ficar com sua patota, por ali mesmo.

- Meninas, no meu quarto; meninos, na sala. – ordenou “Pizza”, apontando para os recintos em questão.
- Ah, que pena! - brincou Japa, olhando para os garotos.
- Meninos perto da porta de entrada, agindo como se fossem cães de guarda! - reforçou Rita, com ares de general.

Realmente, o sexteto andava um pouco assustado com toda aquela misteriosa história. Porém, lá no fundo, já enrolados debaixo de suas cobertas, sabiam que estavam passando por mais um momento do qual jamais se esqueceriam, e era por isso que estavam exagerando um pouco. Queriam escrever mais uma página da rica história da Turma da Praça. Queriam um dia poder olhar para trás e relembrar com uma dose de nostalgia: “Certa vez dormimos todos na casa de “Pizza”, com medo de alguém que escrevia mensagens enigmáticas. Era uma noite de trovoadas e suspense”.

Aquela noite, porém, na verdade foi muito tranqüila. Os meninos até fizeram uma visitinha secreta à geladeira de “Pizza”. As meninas conversaram mais do que dormiram. Era inevitável, porém, a atenção a todo e qualquer ruído que escutavam.

Quando o Astro-Rei os acordou, a primeira coisa em que pensaram foi ir até a praça e ver se havia mais alguma mensagem no quadro-negro. Tomaram rapidamente um copo de leite com chocolate em pó, e, ansiosos, partiram imbuídos de sentimentos desbravadores. “Pizza” levava uma bisnaga, com um filete de requeijão a escorrer.

Andavam todos juntos, quando Toninho parou e cochichou a seus amigos:

- Parem! Olhem lá! – apontou o garoto.
- Nossa! Um homem de vestido! - observou, perplexo, Luizinho.

...

De fato, havia um homem na pracinha. Parecia estar apanhando o quadro-negro, que ainda se encontrava pendurado na árvore, e com a mesma mensagem da noite anterior. Afastada, a turma não pôde perceber quem era. Foram então se aproximando do sujeito que lhes despertara tanta curiosidade...

O tal “homem de vestido” avistou o sexteto e cumprimentou:

- Bom dia. Este quadro-negro é de vocês?

A turma se reúne apressadamente. Japa murmurou para o restante da patota:

- A mim, parece suspeito. Devia estar indo escrever outra mensagem, e, ao nos ver, veio com essa pergunta fajuta pra disfarçar.

Toninho concordou e ainda acrescentou:

- Em se tratando de um homem de vestido, este seria o “A” ou a “A”?

O sexteto fez uma rápida conferência, pondo-se a debater. O homem, já meio impaciente, tornou a perguntar:

- Ei, não ouviram? Eu perguntei se este quadro era de vocês!
- Mais ou menos. – respondeu Cláudia. Na verdade, nós o achamos na lata de lixo, e acabamos ficando com ele.
- Ah, sim... bem, eu não me apresentei. – disse o sujeito. Sou o Padre Afrânio. Muito prazer em conhecê-los.
- Afrânio, com “A”? Então você gosta de outra pessoa de inicial “A”, certo? - perguntou “Pizza”, como se fosse a mais esperta menina do mundo.
- Ô sua burra! Não ’tá vendo que o moço é padre? - reprimiu Luizinho.

Todos riram disfarçadamente, mas logo pediram desculpas e tomaram a bênção ao santo homem. No fundo, ficaram aliviados ao saber quem era de fato aquele cidadão.

- Estou precisando de pessoas para fazer caridade. - solicitou Padre Afrânio.
- É, nesta idade, realmente, costuma dar muita cárie nos dentes. Daí o nome: “cárie-idade”. – disse Rita, imaginando-se uma perita em odontologia.
- Caridade, minha jovem. – consertou o padre. Falo de solidariedade...
- É, faz mesmo um bom tempo que não tomo um solzinho. – concluiu, erradamente, Toninho.
- Refiro-me a doações para as pessoas pobres. – prosseguiu Padre Afrânio. Estamos a três dias do Natal e estou colhendo alimentos e objetos para proporcionar um vinte e cinco de dezembro mais feliz aos menos favorecidos. Se puderem me ajudar, ficarei muito agradecido. Pensei que este quadro-negro pudesse ser útil em alguma sala de aula, ou para alguma criança desenhar, mas já que vocês gostam tanto dele...
- Que é isso, padre! Pode levá-lo, sim! – falou Toninho, em nome da turma.
- Ficaremos felizes em saber que ele foi útil a alguém. – concordou Japa, de imediato.
- Poderíamos ir até nossas casas e apanhar outras coisas pra doarmos... - sugeriu Claudinha.
- Poderíamos ainda invadir a casa do Moacir e apanhar um monte de roupas caras pra darmos aos pobres. – brincou Rita.
- Hô, hô, hô! – riu o padre. Vocês são muito divertidos! Que saudade que tenho do tempo que tinha a idade de vocês... Vamos bater um papo...

Sentados nos bancos, o padre e a turma conversaram por um bom tempo. Os jovens tinham dúvidas a respeito de alguns assuntos, que o Padre Afrânio, pacientemente, tentava esclarecer. No início, foi a turma quem mais abriu a boca, fazendo perguntas em cima de perguntas. Depois de um tempo, porém, foi Padre Afrânio quem mais falou, explicando detalhes do seu projeto de caridade, e mostrando a importância da fé. Por fim, marcaram um encontro às quatro da tarde, na igreja, com os donativos que cada um pudesse levar. A turma tinha para aquele dia uma missão de caridade.

...

Foi um tal de abre armário, fecha armário, abre gaveta, fecha gaveta, procurar por algum brinquedo velho, apanhar alimentos na geladeira, perguntar por aquela roupa que não cabe mais... E, enfim, Luizinho, Japa, Cláudia e “Pizza” conseguiram uma boa quantidade de alimentos, roupas, brinquedos e outros objetos para doarem. Os quatro foram então à igreja de Padre Afrânio. Toninho e Rita iriam mais tarde, já que estavam recolhendo donativos junto aos demais moradores do edifício.

Claudinha chegou à igreja com seu par de patins na mão, para doá-lo. Ninguém entendeu nada. Estaria Cláudia com febre?

- Vou ganhar um novo, no Natal. – explicou a garota.

Luizinho, entre outras coisas, trouxe um livro de exercícios de Português, que, por puro desleixo seu, estava completamente em branco. Japa levou até algumas roupas japonesas, já pequenas para ele. “Pizza” foi a que mais doou alimentos para os pobres.

- Eles precisam mais do que eu. – disse a comilona.

Toninho e Rita, enfim, apareceram na igreja, arrastando dois sacos dos de lixo abarrotados de doações. Tinham até dificuldade em carregá-los. Padre Afrânio mandou dois ajudantes irem até eles e apanharem os sacos. Agradeceu e perguntou:

- Para quando é o casamento? Podemos marcar logo a data...
- Casamento? – perguntou Rita, olhando para Toninho.
- É. – disse o padre. Vocês não são namorados? Por que o rapaz não pede logo a sua mão?
- Qual das duas? – brincou Rita.
- Somos apenas bons amigos. – respondeu Toninho.
- Eles vieram juntos porque recolheram doações com seus vizinhos. – explicou “Pizza”.

A turma ficou na igreja ajudando o padre a separar os donativos que o bairro todo havia entregue desde o mês de outubro. Os meninos retiravam tudo dos sacos e das caixas; as meninas iam anotando as quantidades e os tipos de cada doação. No dia vinte e quatro, o padre e seus ajudantes fariam a distribuição, de caminhonete, pelos locais mais pobres das redondezas.

Quando tudo estava bem separadinho, Padre Afrânio chamou a turma para rezar com ele.

- Vamos agradecer por tudo de bom que temos. – ensinou o padre.

Era a primeira vez que Toninho, Luizinho, Japa, Rita, “Pizza” e Cláudia rezavam numa igreja, ajoelhados, com um padre. Gostaram muito da experiência. Para a turma da praça, havia sido uma tarde diferente, tanto pela caridade como por aquele momento, onde todos os amigos juntos rezaram.

Todos se sentiram muito bem com o que fizeram. Na manhã seguinte, as garotas chamaram os garotos. Não era para irem ao barzinho, ou à pracinha, ou a qualquer outro lugar. Era para irem de novo à igreja, todos juntos, rezar.

Rezas mil iam sendo enviadas ao Senhor dos Céus.


10 - “A GRANDE NOITE”

Véspera de Natal. Fazia um tempo nublado, um pouco frio, parecia que ia chover. Fazia um tempo que pedia um casaco. Fazia um tempo gostoso.

A turma estava lá, reunida na praça, jogando futebol, como de costume. Encontraram, em um dos bancos, um saquinho fechado de biscoitos de polvilho, e resolveram reparti-lo.

- É um belo presente de Natal. – brincou Toninho.
- Falando nisso, o que vocês vão ganhar, hein? – perguntou Rita, para a turma.
- Espero mesmo que seja um par de patins. Já faz dois dias que eu não ando num. – disse Claudinha, um pouco agoniada.
- Eu pedi um binóculo. Assim poderei bisbilhotar melhor a vida de todo mundo. – alertou Luizinho.
- Para os presentes, nem ligo muito. O mais importante é a ceia. – observou “Pizza”, já pensando no peru defumado.
- O mais importante neste Natal, foi o fato de termos ajudado outras pessoas. - lembrou Japa, num tom de ensinamento.
- Lógico, até porque... – começou a falar Toninho, sendo porém interrompido por um ensurdecedor ruído de motor.

Aquele barulho todo era da caminhonete velha de Padre Afrânio, sem silencioso, sem o farol direito nem o pára-choques traseiro, porém repleta de doações. Ele e seus ajudantes fariam a última viagem do dia.

O exótico veículo reduziu a marcha, parou na calçada rente à pracinha, e o padre chamou a turma por um instante:

- Jovens, não se esqueçam de que no Natal se comemora o nascimento de Cristo. Rezem com bastante fé, daquele jeito que lhes ensinei. Estou indo agora levar os últimos donativos. Os que vocês deram, já foram! Muito obrigado e um feliz Natal!
- Feliz Natal, padre Afrânio! – desejou o sexteto, empolgado.

Rita resolveu, naquela hora, entregar ao padre sua clássica bola murcha, com a qual a turma sempre jogava. Ela agora seria jogada por meninos mais carentes, e, por que não dizer – pensava Rita – por meninas também?

A caminhonete partiu espalhando fumaça por toda a rua. Iria agora espalhar alegria a muita gente também.

Já eram oito horas da noite. Estava na hora de os seis voltarem para suas respectivas casas, cearem com parentes e abrirem os presentes de Natal.

- Vamos voltar pra pracinha de madrugada! – sugeriu Toninho, de repente.
- Boa idéia! Eu vou até estrear os meus patins novos. – aprovou Claudinha.
- Que tal à uma hora? – propôs Japa.
- Pode ser. A esta hora já teremos aberto nossos presentes... – raciocinou Luizinho, fazendo um gesto parecido ao de um binóculo.
- Então está marcado, né? – perguntou Rita.
- Marcadíssimo! – confirmou “Pizza”, fazendo sinal de positivo com o polegar.
- Bom, então até amanhã, ou melhor, até daqui a algumas horas. – despediu-se Toninho, contente com a aceitação de sua sugestão.

A caminho de casa, com Rita, Toninho até pensou em ter uma “conversinha” com a garota. Mas logo mudou de idéia. Achou que talvez devesse deixar tudo para logo mais, de madrugada.

No fundo, ele queria mesmo é que tudo ocorresse lá, na pracinha, seu local predileto.

...

Em casa, Toninho foi recebido por alguns parentes que lá estavam. É bem verdade que alguns deles achavam Toninho um garoto muito levado, às vezes até mesmo um pouco inconveniente. Mas, naquela noite, até que ele estava mais calado que de costume, e ficou o tempo quase todo em seu bagunçado quarto, saindo de lá apenas na hora da ceia, para degustar o risoto que sua tia Hernemengarda trouxera.

À meia-noite, foi abrir seus presentes de Natal: uma calça de moletom, muito bonita; uma bola de futebol que achou um pouco pesada; e uma raquete para jogar pingue-pongue nos recreios do colégio.

Mas o pensamento de Toninho estava mesmo voltado para logo mais, para o encontro com a turma, no qual tentaria ficar com a Rita. Pensou que talvez devesse contar logo tudo para seus amigos, Luizinho e Japa, e juntos pensariam em articular alguma estratégia, algum plano, ou, como gostavam de dizer, alguma “operação” - no caso, seria a “Operação Rita”. Aqueles seriam os dois agentes secretos da operação: Luizinho seria o “agente-fofoca”; Japa, o “agente-sushi”.

Toninho achava que, se os três se encontrassem antes da hora marcada, poderiam ter alguma idéia brilhante.

- Vou ligar pro Luizinho! – falou Toninho, consigo mesmo. É 246-0406.
- Alô! – atendeu a mãe do falastrão.
- Alô, o Luiz está?
- Quem deseja?
- É o Toninho.
- Oi, Toninho! Sou eu, “tia” Roberta. Meu filho já foi dormir. Exagerou um pouco no vinho...

Luizinho não viria. Era menos um para ajudá-lo. Mas quem sabe Japa...

- Alô!
- Alô, Japa? É o Toninho.
- Fala, Tôni!
- Vamos logo pra pracinha!
- Ih... acho que não vai dar. Ganhei uma bicicleta nova, e estou aqui com meu tio quebrando a cabeça pra montá-la. Tem umas peças esquisitas...
- Ah, é?
- É. Meu tio entende disso e tenho que aproveitar que ele está aqui hoje. Mas de manhã a gente se vê...

É, seus melhores amigos não iriam poder articular nenhuma estratégia. E agora? Como ficaria a “Operação Rita”, sem seus dois agentes? Será que Claudinha e “Pizza” poderiam ajudá-lo? Toninho deveria pensar em alguma coisa. Alguma idéia deveria se passar pela sua cabeça...

Foi quando tocou o telefone.

- Alô!
- Toninho? Sou eu, Rita.
- Oi, Rita. Tudo bem?
- Tudo, e você? E aí, ganhou aquela bola nova?
- Ganhei. É de couro.
- Vamos jogar, com os meninos. As meninas não vão poder ir pra praça mesmo...
- Ah, é? Você ligou para elas?
- Liguei.
- Bom, os agentes “fofoca” e “sushi” também não poderão ir.
- Queeeem?!
- Quis dizer que o Luizinho e o Japa não poderão ir. E as garotas, por que não podem?
- A Claudinha acabou indo passar o Natal na casa de uma prima, que mora lá em Niterói. A “Pizza” teve uma congestão, de tanto que comeu na ceia.
- Ah, é?
- É. Nenhuma das duas poderá ir...
- Sei...

Naquele instante, Toninho fez uma pausa. Pensou que, enfim, havia caído do céu a chance que ele estava procurando. Ficaria a sós com Rita – o que era importante – e na pracinha – o que era mais importante ainda! Mas... será que ela iria querer ir para a pracinha, a uma hora daquelas, sem os outros componentes da turma?

A resposta, ele só saberia propondo...

- Vamos então só nós dois...
- Nós dois?
- Sim.

Foi a vez de Rita fazer uma ligeira pausa. Mas logo respondeu:

- Tudo bem. Daqui a quinze minutos ’tá bom?
- ’Tá sim. Um beijo.
- Outro. Tchau.

...

Desligado o telefone, Toninho era só ansiedade. Aqueles quinze minutos pareciam uma eternidade. Resolveu ir logo para a praça, e esperar por Rita lá, no local onde tudo deveria acontecer. Vestiu uma camisa de manga comprida e a calça bonita que havia ganho há instantes. Para completar, aquele perfume de camelô, que de vez em quando usava.

- Súbito resolvo sair. – disse a seus parentes, que não entenderam nada.
- O que ele disse? – perguntou uma tia.
- Súbito? – questionou a madrinha.
- Essa é dos meus tempos! - lembrou sua vovó.
- Ele quis dizer que de repente teve que ir pra rua. Deve ser por algum motivo importante... – explicou sua mãe às visitas, meio sem jeito.

Toninho ficou lá, sentado na pracinha, esperando por Rita. Estava no local de que mais gostava. Foi lá onde se divertiu de montão com seus amigos. Foi lá também que ele começou a gostar de Rita, pois a existência daquela pracinha possibilitou a formação do ponto de encontro da turma da qual a amiga maneta passara a fazer parte há três anos antes. Foi lá o cenário de quase todas as passagens que ele e Rita compartilharam juntos.

Foi lá onde passou os melhores momentos de sua vida, mas aquele momento, que ele desejava que acontecesse nos próximos instantes, com Rita, sem dúvida seria um momento todo especial.

E lá estava Toninho, na parte mais romântica da praça, perto daquela velha árvore. A praça estava bonita, iluminada, serena. O tempo estava ameno. A lua, cheia. O silêncio só era quebrado pelo barulho das cigarras.

Rita enfim surgiu. Andava calmamente. Nada falava. Vestia um casaco que acabara de ganhar de Natal e uma calça jeans. Estava muito bonita. E nada falava.

Nem seriam necessárias palavras àquele momento. Rita, já há algum tempo, percebia que Toninho a olhava de uma forma diferenciada. Por sua vez, Toninho sentia que, naquela noite, tudo parecia estar propício. O momento dos dois havia chegado...

...

A velha árvore e o gato preto de “Pizza” - que costumava vagar pela rua de madrugada, à procura de gatas e de ratos - acabaram sendo as únicas testemunhas daquela memorável noite de Natal, em que Toninho e Rita voltaram à pracinha na calada da noite, e Toninho realizou um grande sonho.

Mas não só ele. Na verdade, aquilo tudo foi também a concretização de um desejo da própria Rita. A exemplo de Toninho, ela também gostava dele de forma secreta. Ninguém sabia, mas também fazia um tempo que a Rita sonhava com aquele momento que eles enfim estariam vivendo...

Toninho e Rita: um gostava do outro. Era como se só estivessem esperando o momento certo de agir. E bastou uma noite onde tudo conspirara a favor, para que se formasse o casal Toninho e Rita. Ou, se preferirem, Antônio Carlos e Ana Rita.

Ou ainda, de forma abreviada, como Rita sorrateiramente gostava de escrever por aí, “A” e “A”.


11 - “ESPIÕES A POSTOS”

- ...E então a Rita me ligou e insistiu muito para nós irmos de madrugada pra pracinha!

Era Toninho, em seu apartamento, contando o seu caso com Rita a Luizinho e Japa, porém, modificando (ou até mesmo invertendo) os fatos a seu bel-prazer:

- E aí, Tôni, o que houve? Conte bem devagarinho, para eu já ir memorizando. – quis saber, curioso como ele só, Luizinho.
- Bom, quando cheguei, ela já estava lá, sentada no banco, me esperando. Foi logo dizendo que gostava de mim e me dando um beijo. Aliás, um não! Vários!
- É mesmo, Toninho? Não diga... – indagou Japa, com uma certa ironia de quem não estava acreditando muito naquela versão.

Três andares abaixo dali, no apartamento de Rita, o tom da conversa entre as garotas era bem diferente. Mais verídico, pelo menos...

- Que legal, Rita! Eu nunca imaginaria isso! Você e o Toninho... – surpreende-se “Pizza”, com a notícia.
- Acho que vocês dois serão muito felizes, Rita. Têm tudo a ver. – opinou, otimista, Claudinha.

Voltemos ao apartamento 604, onde Japa e Luizinho – mais Luizinho do que Japa – ouviam atentamente a história sob o enfoque um tanto ou quanto exagerado de Toninho:

- A Rita já gostava de mim há uns cinco anos! Eu é que não dava muita bola pra ela.
- Ué, mas há cinco anos ela nem morava aqui. – observou, desconfiado, Luizinho.
- Sim... mas... ela me escrevia sempre! - improvisou o garoto. Tenho dúzias de cartas da Rita em meu armário.
- Ah, então ela já te conhecia mesmo antes de se mudar pra cá? - questionou Japa.
- Hã... bem... a relação entre mim e a Rita é algo meio cósmico. Na verdade, nos conhecemos há mais de duzentos anos. Estivemos juntos em vidas passadas. – tentou convencer Toninho, apelando para o esoterismo, assunto no qual seu leque de conhecimentos era nulo.

- Já são seis horas! Vamos pra pracinha!

Aquela frase fora dita simultaneamente nos apartamentos 305 e 604 daquele edifício antigo, porém simpático. No apartamento de Toninho, dita por Japa. No de Rita, pela própria.

Foram os meninos os primeiros a chegar à Valdir Constantino. As meninas vieram alguns instantes depois, já que Rita levou um tempinho para pentear seu bonito cabelo.

Reunido o sexteto, a expectativa de “Pizza”, Cláudia, Japa e – principalmente – Luizinho recaía sobre o cumprimento de Toninho e Rita. Como seria? Acertou quem pensou em um beijo.

Os dois foram caminhando abraçados, passeando pela pracinha. Conversavam sobre a noite anterior e faziam planos para o amanhã. Resolveram que seriam mesmo namorados. Teriam um compromisso fixo e sério.

...

Quando se juntaram aos demais, contaram a última notícia sobre a relação que estavam vivendo. Todo mundo gostou e, como de praxe, aplaudiu. Mas Rita teve também que explicar como conseguia escrever as mensagens sem que ninguém a visse:

- Avisto toda a praça do meu quarto. Era só escolher algum momento em que não houvesse ninguém aqui. Por exemplo: na manhã seguinte à festa. Eu sabia que vocês, que haviam ficado aqui até de madrugada, iriam acordar tarde. Dei uma espiadinha do meu quarto, a praça estava vazia, e então vim escrever no banco.
- Por isso é que, dentre os convidados que começavam com “A”, não podia ser mesmo ninguém, né? - concluiu Claudinha.
- É. A “A” estava entre os organizadores da festa, e não entre os convidados. – analisou Toninho, apontando para sua namorada.
- E no caso do quadro-negro? Quando chegamos aqui na pracinha, à meia-noite, para assistirmos àquele filme de suspense, a mensagem já estava escrita. – indagou, encucada, “Pizza”.
- Não foi difícil. Imaginei que, às onze e meia, todos estariam em casa, se arrumando ou lanchando. Foi quando eu vim aqui e escrevi de novo “A” e “A”. Voltei pra casa e retornei pra cá à meia-noite, com vocês. – esclareceu, calmamente, Rita.
- Eu nunca iria adivinhar... Nem sabia que você se chama Ana Rita. – admitiu Japa.
- Pois eu já sabia! – avisou, convencido, Luizinho. A Rita é Ana Rita, o Toninho é Antônio Carlos, a “Pizza” é Joana, o Japa é... é... bem, o Japa... Ah, o nome do Japa é muito enrolado!

O papo prosseguia empolgante, como sempre. Vez ou outra, Toninho e Rita iam para trás de alguma árvore, ou caminhar um pouco, visando a ter um pouco de privacidade, um momento só deles.

Quando já eram onze e quarenta e cinco, Luizinho, Japa, Cláudia e “Pizza” se juntaram numa rodinha e começaram a cochichar. Toninho e Rita logo perceberam que eles estavam tramando alguma coisa, e acharam que poderiam estar lá, com eles, já que sempre participavam dos planinhos, das operações. Mas desta vez não seria possível, já que a trama daqueles quatro era justamente espionar o namoro daquele casal.

- Tchau, Toninho! Tchau, Rita! Bom namoro para vocês! – despediram-se os quatro, a distância, e com um certo mistério no ar.

...

Sozinhos, Toninho e Rita trocaram declarações, carícias, beijos e abraços. A relação dos dois apontava para uma bonita e duradoura união, o que realçaria ainda mais a história deles junto à turma da praça.

Namorava tranqüilamente o casal, de madrugada, quando, de repente, surge a figura já por si só engraçada de “Pizza”, que passava pela pracinha para espionar Toninho e Rita.

- Aonde vai a esta hora? - perguntou Toninho, interrompendo um beijo em Rita.
- Vou até o barzinho. De supetão me bateu um desejo louco de comer uma “brotinho” de calabresa. – explicou a gulosa, de forma meio verídica – ela ia mesmo ao bar -, meio fictícia – seu objetivo primordial, ao sair de casa, era observar o namorico dos dois amigos.
- Ué, mas a esta hora o barzinho ainda funciona? - indagou Rita.
- Sim, pois de tarde não abriu. Nasceu o filhinho do Odin e ele estava no hospital acompanhando o parto de sua esposa. – esclareceu “Pizza”.
- Puxa, o Odin agora é pai? Que legal! - exclamou Toninho.
- É, e de um menino muito sadio. Tchau, pessoal, estou indo lá. Até mais! - despediu-se “Pizza”.

Voltando aonde haviam parado, Toninho e Rita nem puderam curtir muito aquele momento. É que logo escutaram um barulho de patins vindo da ladeira mais próxima, e então puderam avistar Claudinha, que chegava à praça patinando – o que não era raro – porém de madrugada – algo que nunca havia feito.

- Vai andar de patins agora, Claudinha? - questionou Rita, achando tudo muito estranho.
- É... vim estrear meu presente de Natal. – dissimulou a patinadora, na verdade de olho no casal.

Antônio Carlos e Ana Rita ficaram abraçados, vendo Claudinha praticar algumas manobras, meio sem graça por ali estar. Cinco minutos depois, a garota já estava indo embora, parecendo bastante envergonhada.

- Ufa! Enfim a sós de novo! - suspirou Toninho.

Que nada. Japa, por uma “enorme coincidência do destino”, também teve uma “vontade incontrolável” de ir para a pracinha naquela mesma madrugada, andar com sua bicicleta recém ganha, e já chegava dando um cavalo-de-pau e cantando pneu perto do casal, que, por um triz, não foi atropelado.

- Oi, pessoal! Legal a minha bicicleta, né? - saudou Japa, com uma cara-de-pau de fazer inveja a qualquer um.
- Realmente bonita. Mas por que não andou com ela de tarde? - perguntou, desconfiado, Toninho.
- Por quê? Bem... o sol da tarde poderia ofuscar a minha visão! Sabe como é que é, né: temos que dirigir com a maior prudência possível... – despistou o japonês.

Quatro voltas na pracinha bastaram para que Japa tomasse o rumo de casa, dando-se momentaneamente por satisfeito no que diz respeito à espionagem dos amigos.

Toninho e Rita enfim puderam ficar alguns instantes a sós, como desejavam. Mas não por muito tempo. “Pizza” já vinha voltando do Bar Odin, fingindo ter machucado o tornozelo e mancando propositadamente, com o intuito de fazer com que o tempo em que ela passasse pela pracinha demorasse o máximo possível. Uma eternidade, se fosse o caso.

E assim foi durante toda aquela madrugada. O casal tentando namorar sossegado e o restante da patota espionando.

Claudinha saiu de casa para patinar por mais quatro vezes:

- Ah, ’peraí! De novo, Cláudia? - perguntava Rita, já um tanto ou quanto impaciente.
- É que faltou eu testar uma manobra com meus patins novos. Olhem só! - tentava explicar a bonitona, demonstrando a tal manobra.

O Japa foi andar de bicicleta na pracinha em outras três oportunidades:

- Oi, pessoal! Cheguei! - avisava o menino de olhos puxados, tendo ciência de que estava sendo chato e inconveniente.

E em “Pizza” bateu por outras cinco vezes um “enorme desejo” de comer uma nova fatia no Odin:

- Estranho, “Pizza”, mesmo com a perna machucada, você vai lá de novo? - questionava Toninho, de certa forma sarcasticamente.
- Tenho que me alimentar muitíssimo bem, ficar forte, e só assim creio que poderei combater a dor no tornozelo.
- Ah, sei... E só quando chega em casa é que te dá vontade de voltar ao bar, né? – insinuava Rita.
- O mais interessante é que, justamente no mesmo dia, esses três resolveram sair de casa de madrugada... – comentava Toninho.

Com o passar das horas, o trio de espiões teve que inovar um pouco nos seus métodos, já que estava mais do que na cara qual era o real objetivo da empreitada. A bike de Japa passou então a ser vista como uma espécie de ponto de referência. O japonês ia pedalando, “Pizza” ia sentada na garupa e Claudinha, de patins, se agarrava à bicicleta, sendo portanto rebocada, formando-se assim um cômico aglomerado de espiões. Juntos, a vergonha de estarem passando por lá, a toda hora, era diminuída.

E Luizinho, o fofoqueiro, o curioso, o estudioso do comportamento alheio, onde estaria naquela madrugada? Ora, ele estava confortavelmente em casa, espionando tudo com seu binóculo, morrendo de rir com a patetice de seus amigos. E foi justamente para lá que Claudinha, “Pizza” e Japa, depois da investigação de perto, resolveram ir, para trocarem informações, quando já eram 3h da matina.

...

No apartamento de Luizinho, os três “espiões por terra” contaram o que puderam ver, ao passo que o “espião aéreo” lhes informou tudo o que conseguira observar. Juntaram todas as informações, todas as peças do quebra-cabeças, e redigiram então um relatório completo sobre o primeiro dia de namoro de Toninho e Rita. Batizaram-no de “Dossiê A e A”.

Fizeram uma tigela de pipoca e um bule de café forte. Ainda teriam muito de um árduo trabalho pela frente. Houve um revezamento no uso do binóculo: cada um ficava com ele por dez minutos, e ia narrando aos outros o que estava vendo. Montaram no quarto de Luizinho algo como um posto de observação, uma sede de espionagem, uma central de informações.

Mas uma pergunta ficou no ar: por que então Toninho e Rita não saíram dali, não foram para algum outro local? A resposta é simples: eles queriam mesmo era estar lá, namorando na pracinha, fazendo jus ao título pelo qual passariam a ser conhecidos a partir de então, e que muito os orgulhava. Afinal de contas, não eram o casal da escola, ou o casal do bar, nem tampouco o casal da festa.

Eles eram o casal da praça!


12 - “VOLTA ÀS AULAS”

Aquelas férias haviam sido maravilhosas.

Para Luizinho, Japa, Claudinha e “Pizza”, simplesmente pelo fato de terem sido semelhantes às outras, ou seja, as atividades corriqueiras da turma da praça e alguns acontecimentos inesperados tiveram presença certa. Para Toninho e Rita, porém, aquelas férias haviam sido especiais, já que significaram, para eles, a adição de um namoro aos eventos habituais com o grupo de amigos.

Mas, como todas as férias um dia terminam, com aquelas não poderia ter sido diferente. Era a hora de arrumar a mochila escolar, apontar os lápis, comprar canetas e dar um “até-logo” à vida-boa (porém, não a uma boa vida).

Toninho, que havia sido o último a ficar de férias, fora justamente o primeiro a entrar em aulas. Seu colégio ficava lá perto, de modo que ia às aulas de bicicleta mesmo. Na semana seguinte, começara o ano letivo da escola na qual estudavam Japa e as garotas. O japonês e Rita eram da mesma turma. “Pizza” já fizera parte da sala deles, mas fora transferida para outra, pela Coordenação, dado que os três conversavam muito durante as aulas. Já Claudinha estava uma série à frente, mas se encontrava com aquele trio nos recreios. Por último, Luizinho também teve que voltar para a escola. No seu caso, o uso de um horroroso uniforme colegial se fazia obrigatório, e, sempre que cruzava na rua com algum dos amigos da praça, o fofoqueiro era alvo de inevitáveis gozações.

Nas escolas, pouco se sabia sobre a turma da praça. Os colegas de sala daquele sexteto faziam apenas uma vaga idéia de que cada um deles era membro de uma turma, a qual tinha uma pracinha como ponto de encontro, como cenário de suas histórias. Mas eles não sabiam a fundo o que aquela praça realmente representava para os seis. Na verdade, seus colegas estranhavam o porquê Toninho, Luizinho, Japa, Rita, Cláudia e “Pizza” raramente saíam com eles, quase nunca participavam dos programas que o pessoal da escola costumava fazer.

E alguns colegas também vieram fazer comentários – mais críticos do que elogiosos – sobre a famosa festa de cinqüenta anos da Valdir Constantino. Era o reencontro de alguns dos convidados com os organizadores daquela confusa comemoração.

...

Em abril, no colégio de Japa e das garotas, houve um torneio de pingue-pongue, cujas etapas eram realizadas nos recreios. Japa era o melhor jogador, conhecido como o invencível das raquetes. Certa vez, Toninho e Luizinho até mataram aula e foram jogar pingue-pongue naquele colégio, a fim de conferir de perto as habilidades do japonês, e também, é claro, reunir toda a turma da praça.

Durante a época de aulas, o sexteto não costumava freqüentar tanto a pracinha como no período de férias. Mas, nos finais de semana, o encontro era certo. Em especial às sextas e aos sábados, quando podiam dormir mais tarde, ficando lá até de madrugada. E, por vezes, mesmo nos dias de semana, batia aquela vontade de jogar um futebol, e para lá iam todos, imediatamente após a aula...

- Chuta aí, Toninho! – canta a jogada Luizinho, ainda de uniforme escolar, dando o passe na medida.

Toninho arremata, e a bola vai parar no outro quarteirão, tendo descido rua abaixo e passado por entre as rodas de um carro.

- Rita, vamos lá comigo buscar a bola! – solicita Toninho.

Às vezes, tal fato acontecia. Poderia até ser sem querer – a pontaria de Toninho realmente não era das melhores – mas também se pensava ser proposital, para ficar um pouco a sós com Rita...

Naquele ano, aproveitando o feriado de Corpus Christi numa quinta-feira, os colégios resolveram emendar a sexta, e, juntando com o sábado e o domingo, fizeram-se valer quatro dias livres. Na quarta-feira de noite, a turma já estava reunida na praça, conversando sobre seus desempenhos escolares:

- Estou bem em todas as matérias. – envaideceu-se Claudinha.
- Estou mal em tudo. – contrapôs-se Luizinho.
- Este ano não estou muito bem, não. A culpa é do namoro com a Rita. – revelou Toninho, como se nos outros anos houvesse sido um excelente aluno.
- Isso é desculpa! Tem que ter espaço pra tudo. – reprimiu Rita. O meu desempenho, por exemplo, tem sido, digamos, satisfatório.
- Também, com as minhas explicações diárias, né? - entregou Japa, colega de turma.
- A cantina da escola melhorou muito este ano. Meu desempenho escolar é que seguiu o caminho inverso. – brincou “Pizza”.
- Todos vocês têm uma excelente desculpa por não se saírem muito bem na escola! Com uma turma dessas, estudar deve ser muito, muito difícil! - falou uma voz por detrás do banco onde a patota estava concentrada.
- Moacir! – avistou Claudinha.
- Oi, pessoal! Aproveitei o feriado prolongado e vim passar estes dias aqui, com vocês. Como estão? Tudo bem?

...

Moacir não agüentou esperar até as férias de julho. Em São Paulo, ele só pensava na turma da praça. Aproveitou os dias livres, apanhou o primeiro ônibus – isso mesmo; engano pensar que ele veio de avião – e se juntou ao grupo de amigos do qual havia se tornado fã. Por aquele feriado, valera a pena a viagem de Moacir.

Quatro dias não são nenhuma eternidade, mas, para matar as saudades e atingir alguns objetivos, até que vieram a calhar. No sábado daquele feriadão, o magnata convidaria Claudinha para ir ao cinema. Ele tinha pretensões de ficar com a garota que era tida como a grande beldade daquelas redondezas.

Antes, porém, consultou os meninos, para saber de suas reais possibilidades:

- A Claudinha é muito assediada. Tem sempre algum garoto atrás dela... – alertou Toninho.
- Só lá no colégio são uns três... – acrescentou Japa.
- Mas ela tem ficado com alguém? – indagou, bastante interessado, Moacir.
- Creio que não. Se tivesse, a Rita teria me contado... – respondeu Toninho.
- Com certeza não! Posso te garantir isso! E se quiser saber mais, ela ’tá louca pra ver o filme que está passando lá no cinema do shopping center. – informou, de forma segura e precisa, Luizinho.

O programa ele já tinha. Moacir também tomou o cuidado de se certificar de que Luizinho e Japa não sentiam alguma queda pela Claudinha, a fim de evitar qualquer tipo de mal-estar com seus amigos. Como o sentimento deles pela garota era pura e simplesmente o de amizade, Moacir se viu livre e desimpedido para ligar para ela.

Os dois conversaram pelo telefone e combinaram assistir ao tal filme no shopping center. Hora e local foram marcados sem maiores dificuldades.

Mas não iriam sozinhos. Uma figura exótica, de longe, vigiava seus passos. Era Luizinho, que também fora àquele cinema, no mesmo horário que o projeto de casal, porém, disfarçado de “menino acidentado”, enfaixando-se - com a ajuda dos comparsas Toninho e Japa - da cabeça aos pés, só deixando de fora os olhos e o nariz.

- Nossa, Claudinha, olha só aquele menino! Deve ter sido atropelado! - apontou Moacir, na fila de entrada do cine.
- É mesmo. Coitado. Mas, engraçado, seu olhar me parece um tanto ou quanto familiar... – observou a garota.

Tão logo Moacir e Claudinha deram o primeiro beijo, lá pela metade do filme, Luizinho já saiu em disparada para contar a novidade em primeira mão aos amigos da praça, provocando no cinema e nas ruas um enorme espanto pela cena que proporcionara – um indivíduo “acidentado”, enfaixado até a alma, mas que corria como o mais saudável dos seres vivos.

...

E assim era o período de aulas da turma da praça. De vez em quando, pintava um feriadão; de vez em quando, Moacir aparecia por ali; de vez em quando, iam para a praça mesmo nos dias de semana; de vez em quando, tinham que estudar – e até isso faziam na pracinha, levando para lá livros e cadernos.

Mas o certo mesmo é que, sempre que estavam juntos, alguma coisa divertida acontecia. E, em se tratando de diversão, união e formação de caráter, a praça era, para eles, de fato, a melhor escola.


13 - “DÚVIDAS MIL”

- Ele completou ontem seis meses de vida. Não está grandinho?

E como estava.

Sempre que falava de seu filho, notava-se um certo brilho nos olhos de Odin. Orgulhoso, passeava na pracinha com seu bebê, que, por sinal, fazia o maior sucesso naquela área. Era o novo xodó das redondezas.

- Ele nasceu junto com o namoro do Toninho e da Rita. – lembrou Claudinha.
- E no dia do Natal. – completou “Pizza”.
- O Odin Júnior foi um dos maiores bebês que já batizei. – observou Padre Afrânio, que por ali passava e resolveu dar uma paradinha.
- Daqui a pouco, já estará comendo suas pizzas, hein! – comentou Luizinho, dando um tapinha nas costas do dono do bar.
- E jogando futebol conosco. – imaginou Rita.
- Aí, o Japa que se cuide! – brincou Toninho.
- Aí, o Odinzinho que se cuide! Do jeito que anda a pontaria dos meninos, o risco de ele tomar alguma bolada é enorme! – disse “Pizza”, provocando os amigos.
- Cuidar... Este verbo ainda será muito usado por vocês. – falou o padre, num tom profético.
- Como disse? - indagou Japa.
- Jovens, temos que cuidar do mundo de hoje, para proporcionarmos uma vida melhor a todos os seres vivos do amanhã. – ensinou Padre Afrânio. E também devemos cuidar de nós mesmos, visando a um futuro promissor...
- Bênção, padre. Vamos lá no bar fazer um lanche comigo. Hoje o senhor é meu convidado. – propôs papai Odin.

A turma ficou observando, em silêncio, Padre Afrânio e Odin – com seu filho nos braços – se dirigirem ao tradicional barzinho. Sorridentes, os dois pareciam felizes, de bem com a vida.

A patota é que estava numa tarde um tanto ou quanto reflexiva:

- Pessoal, hoje o padre tocou num assunto ao qual nós nunca demos muita importância. – disse Japa, parecendo um pouco preocupado.
- Qual? – questionou Rita.
- O futuro.

O japonês fez uma pequena pausa. Havia cinco pares de olhos arregalados direcionados a ele. Logo prosseguiu:

- O que será de nós?
- É mesmo. Nunca pensamos nisso... – concordou “Pizza”.
- Será que vamos viver por muito tempo? - indagou Luizinho.
- Será que a turma ainda existirá? - perguntou, levantando-se do banco, Toninho.
- Bem, dizem que as amizades que começam na infância são as mais honestas e duradouras... – lembrou Rita.
- Em compensação, quando crescermos, a tendência será nos separarmos... – disse Claudinha, com um melancólico tom de voz.
- Como assim? - questionou “Pizza”.
- Em geral, quando as pessoas viram adultos, cada um vai para um lado...

Claudinha fez uma pequena pausa. Havia quatro pares de olhos arregalados e um par de olhos puxados direcionados a ela. Logo prosseguiu:

- Existem faculdades em outras cidades, bons empregos em outros estados, e até mesmo oportunidades irrecusáveis no exterior...
- Quer dizer que, em breve, vamos todos nos dividir? - indagou, cabisbaixo, Luizinho.
- Não, não foi o que eu disse. Não precisamos ser tão pessimistas! Isto é apenas uma ligeira tendência... – amenizou a garota.
- Mas... e se quebrarmos esse tabu? - idealizou Toninho, enquanto acariciava os cabelos de sua namorada.
- Quebrar um tabu? – perguntou, surpreso, Japa.
- Será que alguma turma já conseguiu isso? – questionou “Pizza”.
- De repente, ninguém nunca tentou... – analisou Luizinho.
- É... só saberemos do nosso futuro quando o tempo nos permitir... – finalizou, reflexiva, Rita.

Ficaram os seis deitados, olhando para o céu. Era uma noite repleta de estrelas. As nuvens, que se deslocavam lentamente, e o relógio de Rita, que fazia um tiquetaque bem alto, facilmente audível, transmitiam a nítida impressão do passar do tempo.

A turma toda apontou os dedos indicadores para o céu, pondo-se a acompanhar o andar das nuvens. Havia seis mãos direitas e cinco esquerdas a seguir o deslocamento das nuvens e do tempo.

E assim é o tempo. Ele só anda para a frente. O tempo não pode voltar. Mas por que um tempo – e agora tempo no que se refere a alguma época, alguma etapa de nossas vidas – não pode ser mantido?

Será que não poderia o tempo ser prolongado?


14 - “SETENTA E CINCO ANOS DEPOIS...”

Pensaram que a turma da praça não existiria mais? Pois bem...

- Puxa, Rita, você está tão bonita hoje. Como sua pele está macia! - elogiou Toninho, vagarosamente.
- Obrigada. É o creme que estou passando. Comprei cinco frascos ontem, numa liquidação. Agora só resta um... – brincou Rita.
- Veja. Lá vem o Japa, com sua bola na mão.
- Oi, pessoal! Desculpem o atraso. O Luizinho já está vindo. Só está terminando de tomar sua papinha. – falou o japonês, alegremente.
- Aquela papa que ele toma é muito ruim. – disse Toninho. Gosto mais da sopinha que a Rita faz.
- Não é ele quem vem chegando lá? - perguntou Japa, apontando em uma direção.
- Não, Japa. Aquilo lá é um poste. – consertou Rita.
- Oh, desculpe-me! Esqueci meus óculos de grau quatro em casa.
- Mas agora é ele mesmo! – avistou Toninho.
- Olá, turma! Hoje estou com “fome de bola”. Cadê o restante da turma? – saudou Luizinho, ao chegar à pracinha.
- Olhem lá a “Pizza” voltando do Bar Odin. – forçou a vista Rita.
- Oi, pessoal! Querem um pedaço? É de presunto com cebola. – ofereceu a ainda comilona.
- Ô, “Pizza”! O seu médico não disse para você reduzir os alimentos gordurosos? - criticou Luizinho, preocupado.
- Sim, mas esta pizza do Odin Jr. não é tão oleosa assim. Eu comia a do saudoso Odin, que era gordura pura, todos os dias, e nunca me aconteceu nada... – explicou, de modo muito fajuto, “Pizza”.
- Estranho, que barulho é esse? - perguntou Japa, levando uma das mãos à orelha.
- Parece alguma coisa rangendo... – observou Luizinho.
- Parece um guindaste velho. – analisou Toninho, inocentemente.
- Ô, meu amor! Não viu que foi a “Pizza” que se sentou? - reprimiu Rita.
- É, essas minhas articulação estão mesmo um pouco enferrujadas... – admitiu “Pizza”.
- Oi, turma! Demorei, né? Estava dando um lustre nas rodas da minha cadeira de rodas. Ficou legal, né? – perguntou Cláudia, chegando repentinamente à praça.
- Muito bem, Claudinha! Parabéns! – exclamou Rita.
- Ficou mesmo lustrosa! – concordou “Pizza”.
- Cláudia sempre foi muito caprichosa e teve bom gosto. Foi por isso que nós a designamos pra comprar bandeirinhas naquela tumultuada festa, lembram? - dissimulou Toninho.
- Bom, então vamos começar logo a pelada. De quanto tempo vai ser a de hoje? - indagou Rita.
- Que tal o mesmo tempo do jogo de ontem? - propôs Toninho.
- Ontem? - perguntou Japa. Ontem o jogo foi de.. hã... de... não me lembro bem...
- Dois tempos de dois minutos. O intervalo foi de meia hora. – lembrou Luizinho, o eterno sabe-tudo.
- Isso! – apoiou Rita, mostrando o polegar possível.
- Súbito começa o jogo! - avisou Toninho.

Rita pega a bola e faz o gol.

- Súbito termina o primeiro tempo! - voltou a avisar Toninho.
- Vamos sentar lá no banco pra descansar. – sugeriu um cansado Luizinho.
- Trouxe vitaminas para todos! Podem pegar! Estes jogos têm sido muito desgastantes... – ofereceu, ofegante, Japa.
- De fato! Bem, não vamos terminar o jogo? - lembrou Luizinho.
- Vamos. Amanhã. – respondeu um exausto Japa.
- Ah, falando nisso, o Moacir voltará de viagem amanhã. – informou Claudinha. Disse que está com saudade do futebol.
- Que bom. Posso dar uma voltinha na sua cadeira de rodas? – pediu Japa.
- Pode. Mas tome cuidado, ’tá? – emprestou, de bom grado, a bela senhora.
- E aí, pessoal, como passaram a noite? - perguntou “Pizza”.
- Muito bem... – disse Toninho, olhando com cara de levado para Rita.
- Esta pergunta me lembra uma coisa... – falou Luizinho.
- O quê? - indagou Cláudia.
- Certa vez dormimos todos na casa de “Pizza”, com medo de alguém que escrevia mensagens enigmáticas. Era uma noite de trovoadas e suspense... – recordou o velhinho fuxiqueiro.
- E esse alguém era a Rita! – exclamou “Pizza”, efusivamente.
- Ah, gente, mas foi divertido, não foi? - perguntou a amiga maneta.
- É verdade. E quem diria que, um dia, os dois ”A”s iriam se casar, hein! - refletiu Claudinha.

...

Toninho e Rita se casaram quando tinham vinte e seis anos de idade. A cerimônia foi na igreja do saudoso Padre Afrânio. Ele e Rita tiveram um filho, Edinho, também muito brincalhão, que logo que cresceu foi ser jogador de futebol no interior de São Paulo, onde se casou e mora até hoje.

Claudinha volta e meia era vista andando de cadeira de rodas. Não, não, não! Não que ela tivesse alguma doença, ou algum problema nas pernas. Nada disso. Claudinha estava ótima, e bonita, como sempre. É que, com o passar do tempo, os patins se tornaram um pouco perigosos para ela, e, como sempre gostou de andar sobre rodas, encontrou na cadeira um meio de se divertir sem correr riscos. Ela até já experimentava algumas manobras!

E Cláudia, quem diria, acabou se casando com Moacir. Os dois começaram um namoro que era mantido nos intervalos em que ele passava no Rio, naquela casa de portão verde. Após alguns anos, tornaram-se noivos, e, logo depois, marido e mulher. Mesmo casado, Moacir não perdeu o hábito de fazer viagens a negócios, mas, sempre que podia, passava o dia com a turma da praça.

Luizinho, Japa e “Pizza” não se casaram, mas namoraram bastante ao longo da vida. Luizinho, que não perdera a mania de saber da vida de todo mundo, agora tinha que guardar na memória dados de várias garotas – e depois, moças e senhoras – que havia conquistado. Japa, ou, para muitos, Sr. Shiritakumonai, até que andou namorando uma coreana, durante alguns anos, mas não chegaram a se casar. “Pizza” foi namorada, já quando senhora, de Odin Jr., filho de Odin. Dizem que, muitas vezes, “Pizza” ficava no bar até que se fechasse, de madrugada, só para ficar a sós com ele...

Todo o sexteto estava relativamente bem de saúde. Quem andou um tempo no hospital, porém, foi Toninho. Ao beijar Rita de um modo mais efusivo, ele acabou engolindo a dentadura da esposa. Mas rapidamente o problema foi resolvido, e, em poucos dias, ele já estava em casa. Ou melhor, na pracinha.

E a praça, com estava? A paisagem daquele local quase não havia sido modificada, mesmo com o passar de setenta e cinco anos. A velha árvore ainda estava lá, agora com mais de um século de vida, enfeitando a pracinha com sua majestade. Aquela mensagem que Rita havia escrito no banco, também existia. É que, de cinco em cinco anos, ela reforçava o rabisco original com uma caneta.

O Bar Odin era agora administrado por Odin Jr., mas mantivera as mesmas características. E todos moravam nos mesmos locais, a exceção de Toninho, que residia no apartamento outrora apenas de Rita. Claudinha ainda morava na mesma casa, só que com seu marido Moacir. Vivia também com eles um descendente daquele cachorro banguela de Moacir, que agora andava implicando com um gato pardo da casa vizinha - a casa de “Pizza” – que, por sua vez, era descendente daquele gato preto que viveu há setenta e cinco anos.

- Lembram-se de como tudo começou? – perguntou Toninho, olhando ao longe.
- Eu te encontrei um dia na rua, e fomos conversar sobre desenhos animados, na pracinha. – recordou Luizinho.
- Aí começou este hábito de irmos pra praça, às tardes. – completou Toninho.
- Um dia, passou por lá uma garota bonitona, lembra? – indagou Luizinho.
- Era eu, não era? - perguntou Claudinha, levando as mãos à cintura.
- Convencida você, hein? - brincou Toninho.
- Aí, então, puxamos assunto com ela... – lembrou Luizinho.
- E eu disse que tinha uma vizinha muito legal. – emendou Cláudia.
- Daí, marcamos um encontro a quatro: eu, Luizinho, você e sua vizinha. – falou Toninho.
- No dia do encontro, vocês ficaram surpresos ao ver quem era a tal da minha vizinha legal, não foi? – indagou Claudinha.
- Se foi... – admitiu, de imediato, Toninho.
- Era justamente aquela garota que, todos os dias, passava pela praça sem falar nada, ia até o Bar Odin e voltava pra casa, novamente passando pela praça, em silêncio, mas com uma fatia de pizza na mão. – explicou Luizinho.
- Aquela garota nos intrigava! - exclamou Toninho, com as mãos na cabeça.
- Mesmo antes de sabermos quem era, eu já a chamava de “Pizza”. – revelou, rindo, Luizinho.
- É verdade. Ele vivia me dizendo: “Olha lá a garota da pizza, Tôni”; “Ei, Toninho, lá vem a “Pizza” de novo”. – confirmou Toninho.
- No dia do encontro, eu achei o Luizinho muito, mas muito chato mesmo! Ele falava demais... – contou “Pizza”, provocando o falastrão.
- E eu achei o Toninho muito bobo! - falou Claudinha.
- Sim, mas assim mesmo começamos a nos encontrar em todos os finais de semana. – lembrou Toninho.
- Até que, um dia, um menino muito feio se mudou pro prédio ao lado do meu. – disse Luizinho.
- Outro feio? – brincou “Pizza”.
- Pois é. Rapidamente me informei sobre quem seria aquela figura... – prosseguiu o fofoqueiro, fazendo um pouco de suspense.
- Era o Japa, né? - deduziu Rita.
- Sim, era eu. E foi a partir da minha chegada que a gente começou a jogar futebol! - envaideceu-se o japonês, apontando para si mesmo.
- É mesmo. – confirmou Claudinha.
- E depois de mais ou menos dois anos, descobri que, uma garota que havia se mudado lá pro meu prédio, ficava observando os nossos jogos, da janela do seu quarto... – recordou Toninho, num tom nostálgico.
- Na verdade, ela estava é louca pra vir jogar conosco. – analisou “Pizza”.
- Era a Rita! – completou Claudinha, sem pensar duas vezes.
- Um dia, eu parei o jogo e a chamei, da pracinha, lembram-se? - perguntou Toninho, abraçado à esposa.
- Aí, eu desci imediatamente... – confessou Rita.
- E deu um show de bola! - exagerou Luizinho.
- E rapidamente se tornou uma grande amiga nossa. – emendou Japa.
- É... com Rita, o grupo ficou completo. – observou Luizinho.
- Era a peça que faltava. – analisou Cláudia.
- Formado o sexteto, pudemos dizer: “Somos a Turma da Praça”. – sintetizou Toninho.
- E nos unimos para sempre... – finalizou Rita.

Foi isso mesmo.

E até no lado profissional a turma foi unida. Quando se tornaram cronologicamente adultos, formaram uma equipe de animação de festas infantis, que durou e lhes deu sustento por várias décadas. Era a profissão que pediram a Deus. A equipe deu festas no Brasil inteiro. Moacir, que viajava muito, agendava eventos para a turma nas mais variadas cidades do país. Como nunca foi tão extrovertido quanto os outros, Moacir se tornou uma espécie de empresário da equipe. A turma, segundo estatísticas de Luizinho, animou mais de quatro mil festas. Dentre todas elas, porém, a que mais gostaram foi a festa de cem anos da Praça Valdir Constantino.

Na equipe, cada um era um palhaço diferente:

Luizinho era o palhaço fofoqueiro. Ele segurava os convidados pelo braço e saía cochichando em seus ouvidos coisas do tipo: “o Japa ’tá com o cabelo cheio de piolho”; “a “Pizza” come muito porque tem vermes na barriga”; “o Toninho foi eleito o cara mais feio do mundo”.

Claudinha atuava como a palhaça de patins. Suas manobras exóticas – algumas delas aprendidas com Moacir – eram realçadas com a enorme peruca ruiva que usava nas festas, a qual, durante sua performance, ia pra cá, pra lá, pra cá, pra lá, e muitas vezes até caía. Bem, quando não caía, seus amigos a tiravam!

Japa vinha de palhaço japonês. Um tipo bastante exótico, convenhamos. Este não precisava fazer palhaçada alguma. Bastava que os convidados olhassem para a cara dele, e pronto! Já caíam na gargalhada. Sem dúvida que um palhaço de olhos puxados não é a coisa mais normal do mundo. E você, já viu um palhaço japonês?

“Pizza” era a palhaça comilona. É bem verdade que ela aproveitava a personagem que fazia para comer muitas guloseimas nas festas, mas a criançada se divertia para valer, com a imagem daquela palhaça enfiando um monte de salgadinhos na boca e outro de doces no bolso.

Toninho e Rita interpretavam o casal palhaço. Durante as festas, simulavam casamentos, nos quais Toninho sempre dormia em pé na hora de dizer o “sim”. Rita divertia – ou assustava - as pessoas, arrancando uma mão postiça e deixando à mostra seu defeito físico, ao passo que Toninho sempre inventava alguma coisa, de improviso, na própria festa, para provocar risos mil.

O mais engraçado era que nenhum deles aparentava ser um palhaço profissional, daqueles que fazem piruetas, acrobacias e coisas do tipo. Davam a impressão mesmo de amadores. As maquiagens, por exemplo, não tinham a devida simetria, e, volta e meia, estavam todas tortas e borradas. Nos últimos anos da equipe, com todos já bem velhinhos, ocorriam algumas trapalhadas durante as festas, mas era aí que tudo ficava ainda mais cômico. Na realidade, o sexteto se divertia tanto quanto os convidados.

Quando ficaram muito cansados para aquele tipo de serviço, decidiram escrever um livro, contando casos e histórias da turma, enquanto foram crianças e adolescentes. Chamou-se “As Aventuras da Turma da Praça”. Escreveram sem muitas pretensões, e enviaram cópias para algumas editoras do Brasil.

Eis que uma editora se interessou pelo livro, e resolveu lançá-lo. Foi um tremendo sucesso. A primeira tiragem rapidamente se esgotou nas livrarias. As histórias da turma eram agora de conhecimento geral.

Quando o livro já estava na sua décima sexta edição, foram solicitados pelos leitores a escrever um “volume dois”, desta vez contando os acontecimentos da vida adulta e da velhice da turma – embora, no coração e na mente de cada um deles, continuassem sendo jovens. Foi mais um estouro de vendagem.

A partir daí, a turma nem precisou mais trabalhar. Bastava, ao final de cada mês, o sexteto repartir os lucros ganhos pelas vendas dos dois livros, ambos best-sellers, aclamados pela crítica especializada, e, principalmente, pelo povo.

Mas suas vidas nada mudaram com isso. Não ficaram ricos; apenas dava para viverem bem. Até porque, uma boa parte daquele dinheiro ia para igrejas, asilos, orfanatos e instituições de caridade em geral. Por sinal, ainda conservavam o hábito de ir à igreja do saudoso Padre Afrânio. Enfim, na essência, a turma continuava a mesma.

- Resistimos ao tempo. – disse Toninho, certa vez.

Era verdade. A turma ainda existia. Estava lá. Era agora, um espécie de lenda viva. Olhavam para trás e viam imagens que se perdiam no turbilhão do tempo, mas também percebiam que, estando vivos, eram algo como uma fábrica de acontecimentos para o presente e para o futuro. Eram um monumento à felicidade.

Constituíram-se na única geração da turma da praça. Os jovens que vieram depois deles preferiram outras formas de divertimento, mais modernas, ainda que menos saudáveis, e não deram a menor bola para a pracinha.

Mas os seis prosseguiam fiéis àquele local, àquele grupo, àquelas histórias. Histórias do ontem, do hoje, e, é claro, do amanhã.


15 - “HERÓICA RESISTÊNCIA”

- Temos que dar continuidade à saga da Turma da Praça! - dizia Toninho, repetidamente, todos os dias, a seus amigos.

E o faziam com prazer. Aquilo lá era a vida deles. A cada dia que se encontravam, sabiam que mais uma página da tal saga dita por Toninho estava sendo escrita. E era por tudo isso, por este aspecto ao mesmo tempo épico, nostálgico, mas também divertido, que continuavam lá, todos juntos, na pracinha.

Mas poderia não ter sido assim...

A exposição da vida e dos hábitos do sexteto, expressos nas linhas e entrelinhas dos livros que lançaram, provocou a chegada de propostas e possibilidades das mais tentadoras aos membros da turma...

“Pizza” foi convidada a ir trabalhar numa famosa pizzaria, no sul do país. Ela só teria o trabalho de receber os fregueses, e ganharia muito bem para isso. O dono do restaurante apostava nessa jogada de marketing; achava que a simples presença de “Pizza” poderia ser útil para aumentar sua clientela...

Japa recebeu ligação de um primo rico, convidando-o a ir morar no Japão, local onde a terceira idade era mais respeitada do que por aqui, e, financeiramente, teria uma vida bem mais tranqüila...

A Claudinha foi chamada para ser presidente de honra de um clube de patinação da Argentina. Os membros daquele clube gostariam de tê-la em tal cargo, pois ficaram impressionados com sua história – sempre ligada à patinação – e até ofereceram a ela e a Moacir moradia em Buenos Aires....

Já Luizinho foi contactado para ser o apresentador de um programa de TV, de uma emissora goiana. O programa seria pautado em fofocas, é claro. Luizinho com certeza teria desembaraço e competência suficientes para apresentar tal atração...

Toninho e Rita poderiam ter ido morar perto do filho, em São Paulo, ou até mesmo construir uma vida conjugal num local mais luxuoso, em algum bairro nobre, por exemplo...

- Daqui eu não saio! – dizia Toninho, enfaticamente.

Nem ele, e nem nenhum deles. O sexteto permanecia intacto, concentrado em seu ideal de vida. Todos tiveram propostas e possibilidades de sair dali.

Nada, porém,

Em momento algum,

Mostrou-se mais forte

Do que o desejo

De manter viva

A TURMA DA PRAÇA.




















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