Mal bateu a campainha,
do interfone ouvi
o correio; a cartinha
logo, logo recebi.
Era da delegacia,
a do imposto de renda;
vi que entrei numa fria,
não pedi tal encomenda.
Três páginas preenchidas,
frente e verso, sem delongas,
as contas bem definidas,
não havia trapizongas.
Omitido eu teria
na minha declaração
determinada quantia;
daí: notificação!
Fui chamado de omisso,
por fineza do leão.
Já que era compromisso,
fiz a verificação.
O leão se enganou,
não havia omissão;
a quantia já constou
em outra declaração.
Deus sempre quis que a gente
se cuidasse desse mundo,
minha reza é pra frente,
meu coração vai ao fundo.
Perante o tal leão
me separo da mulher,
farei tal separação
sempre que me convier.
A cópia eu preparei
do DARF correspondente,
outra cópia eu juntei,
não fui nada displicente.
Peguei logo condução
e quase não pego senha,
cheguei a um quarteirão
donde faria resenha.
Eu cruzei a avenida,
sem direção defensiva;
um pedestre só tem ida,
quando vai pra ofensiva.
Durante a travessia
entre carros em fileiras,
quase quebrei a bacia
com tombo de más maneiras.
Fraturei o cotovelo,
mas cheguei ao tal balcão;
a senha, com meu desvelo,
descansou a minha mão.
Guichet quarenta e oito,
"Seu" Sávio me recebeu;
esperei, não fui afoito,
ele logo entendeu.
Mas o danado cortou
meu barato duma vez,
a dependente tirou,
me multou com avidez.
Isso eu achei errado,
sou cabeça do casal,
ela fez em separado
declaração femeal.
Entre as pernas enfiei
meu rabo longo e frio,
novo DARF eu paguei,
a sábio não contrario.
Mas depois eu refleti:
a jurídica pessoa
disse que eu omiti,
bateu em mim numa boa.
Sem mais nem menos bateu,
e não vai se desculpar,
o pau duro que ergueu
já guardou pra noutro dar.
Pau duro dessa pessoa
não tem juízo também?
O da física, à-toa,
esse é que nunca tem.
Entidade com direito
a ter pau duro na mão,
mesmo assim, com respeito,
só polícia de plantão.
Mas agora o leão
racha a lenha na gente,
vai de pau duro na mão
e bate inconsequente.