O pai, já desconfiado,
leva pro psicolinguista
o filho desmunhecado,
mas que sempre se despista.
O doutor a língua puxa,
pergunta com maestria:
— Se você fosse a xuxa,
o que bem cru comeria?
O pai logo imagina
o que ele vai dizer:
cenoura com semolina,
ou pepino, tem que ser.
Mas o rapaz bem responde:
— Chuchu bem esverdeado
com uma fruta-do-conde,
talvez um frango assado.
— Seu número predileto?
O pai logo imagina,
faz logo anteprojeto,
"vinte e quatro, é sina."
Mas o rapaz bem responde:
— Cento e onze, senhor!
Além da fruta-do-conde,
o moço tem seu pudor.
—Bichinho de criação,
qual gostaria de ter?
O pai então diz "essa não,
viadinho, vai dizer...".
O moço enche o peito
e a boca bem alarga:
— Jacaré, bem escorreito,
do que pega e não larga.
Sente-se aliviado
o pai, por mais este ponto
pelo filho bem marcado,
não lhe deixou desaponto.
— Em quê vai se deformar
quando adulto se ver?
O pai tenta não pensar
no que ele vai querer...
Alfaiate? Estilista?
Cabeleireiro famoso?
Será esteticista,
das artes estudioso?
O rapaz não pestaneja,
nem faz ninguém magoado:
— Se com sorte eu esteja,
serei mesmo advogado.
E para arrematar
o linguista lhe indaga:
— O que gosta de chupar?
Fruto carnoso, com baga?
O pai quase endoidou,
ficou branco feito cera,
e logo imaginou
que ia sair besteira...
O rapaz não se esconde,
e depressa dá resposta:
além da fruta-do-conde,
jaboticaba mais gosta!
— "Chega de tanta pressão,"
diz ao especialista:
" meu filho será machão,
ou será algum punguista?
— Raramente me engano,
pra mim, é gay embusteiro!
Chuchu, petropolitano,
pois dá o ano inteiro.
Cento e onze "uns" tem,
são três "uns" enfileirados,
e disso se diz, também,
que são três "uns" engatados.
Jacaré é como quiabo,
escorrega e faz lama;
se defende com o rabo,
enfeita o panorama.
Advogado nos ampara,
mas gosta de lentidão,
vive de vara em vara,
de fórum e petição.
É no jaboticabal
que cresce famosa fruta,
morre grudada no pal,
escurinha como gruta.
Minha língua nunca mente,
a dele, tenho certeza,
é doida pra ficar quente,
mas não é com sobremesa.
Não há dúvida, portanto,
é um ser deste milênio,
vai sempre gostar dum canto,
por causa do estrogênio.