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Poesias-->O SERTANISTA -- 11/03/2008 - 22:25 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O sertanista no trem

levava os teréns

que podia levar:

uma rede, um facão

e uma pá pequena

ajudava a sapar

alguma trincheira

que fosse cavar.





E no meio da noite

na mata Mafrense

muitas léguas distantes

da civilização

a lenha acabou

e o trem parou

porque a caldeira

não tinha pressão.





Ribeiro desceu

sem sol nem luar

deixou logo o trilho

e pegou uma senda

sem luz e sem brilho

sem nada enxergar,

sobre os olhos a venda

da noite escura

e por sobre abrolhos

começa a pisar





É aqui, disse pra si mesmo

vou cavar uma fossa

preciso abrigar-me

e esperar a aurora

que não tarda chegar

sem temer o perigo

de bicho selvagem

o bom sertanejo

com muita coragem

fez ali seu abrigo

para descansar





E assim, na trincheira

por ele cavada

a noite inteira

ficou a pensar

até que um raio solar

a incidir sobre os olhos

da fossa gelada

o fez levantar





O dia amanhece

no topo da serra

e o trem parece

querer galopar

como corcel arisco

nas rédeas do trilho

mas aquele filho

de além terra

não pode escutar

senão o clangor

naquela manhã

do triste acauã

solitário a cantar





Veloz sobre os trilhos

na curva dos montes

mais claros que via

a semana inteira

o trem desafia

o tempo e o espaço

quão rápido se sente

e a cada dormente

que vê passar

apita e fumega

mandando avisar

cumpri a missão

é o ponto final,

a última estação





Mas em longo percurso

ninguém se dá conta

que o passageiro

do norte mineiro

abandonara o trem

e seus passageiros

além, muito além

e por outro caminho

andando sozinho

Ribeiro está







Na sombra da mata

sem sol poder ver

não podia saber

onde estava

e rompia a trilha

que convergia

para as fendas do outeiro

era o fim da senda

em que longe, via

guerreiros tenazes

nativos da terra

bem no pé da serra

a tribo Aroazes





Mas o sertanista

sequer teve medo

daquele arvoredo

que tanto queria

guardar o segredo

da tribo que um dia

em suas entranhas

a mata escondia

e sem vacilar

debruçou sobre o rio

em concha, mãos vorazes,

águas aroazes

Ribeiro bebia





E quando recobrou

o vigor e a força

viu no espelho das águas

uma sombra de moça

doze anos, talvez não mais

curtida de sol, pele tenaz

cabelos negros,

seios róseos como romã

corpo esculpido pelo vento

da cor do pecado de Tizo

e cheiro de maçã do paraíso.





Cabelos negros, mamilos rosados

ralos pelos pubianos no regaço,

nudez de corpo e alma cunhatã tinha

Ribeiro desejou tê-la em seus braços

mas subir frondosa árvore não podia

na copa mais alta do jequitibá.

pueril índia aroazes se escondia.







Então resolveu, da mente inventar

uma língua possível que pudesse levar

alguma mensagem qualquer àquela

mais linda selvagem, tão perfeita e bela

mais linda e bela que a índia Alencar.



- Jequiriti, jequitá!





Gritou Ribeiro em seu linguajar

e como por encanto,

tomado de espanto e palpitação

viu cunhatã descer

do mais alto galho

do frondoso jequitibá

porque ao nascer,

pajé lhe dissera

tu és a deusa Jequiriti-Jequitá

palmeira frondosa, trepada no galho

quisera o espírito bom te mandar

cento e quarenta e quatro luas

e um deus de longe, vem pra perto

teu nome chamar



- Jequiriti-Jequitá.





Sem nada falar

Jequiriti-Jequitá

acenou para o deus

que há doze anos esperava

precisava fazer

o que pajé lhe ensinara

e pelo aceno Ribeiro sabia

naquele momento

Jequiriti-Jequitá

queria um instrumento

para o chão escavar





E ela num salto felino

numa mão tomou a pá

na outra, o facão

passou a cortar

rala e esparsa caatinga

e depois, a cavar

desenterrou a cuiapitinga





Cuiapitinga bem guardada

há tanto tempo enterrada

no tronco do jequitibá.

que cunhatã virou sobre si

derramando o líquido precioso

escuro e cheiroso daquela cuité

que pelo corpo a escorrer

fazia nascer a deusa-mulher





E logo que seu corpo nu

se viu embebido

pela porção mágica do pajé

atrelou-se em insaciável libido

ao sertanista em longo abraço

e entregou-se todinha

ao deus que ela tinha

por tanto tempo esperado

e em gozo medonho caíram

em profundo sono, sonharam

e abraçados dormiram.





Longas horas se passaram

e quando acordaram

valentes guerreiros Aroazes

dançavam ao redor

e aos deuses cantavam

a dança do lobo,

deus da fertilidade

enquanto mulheres lançavam

límpidas águas aroazes

sobre os corpos vorazes

de amor saciados

dos deuses Jequitibá

e Jequiriti-Jequitá





O sol já pendia quando

o valente cacique Cuiarana

deitado na rede tapuerana

mandou chamar o pajé

para invocar os espíritos

sobre marido e mulher

os deuses Jequitibá

e Jequiriti-Jequitá





Feita a pajelança

em silêncio todos ficaram

esperando a voz da selva falar

cuiú-cuiú a cantar

anuncia, por fim

a vinda da criança

o tempo será nove luas

para curumim chegar



Mas, enquanto dormia

Ribeiro a sonhar

intrigado ficou

porque parecia ouvir

carimbamba cantar

“amanhã eu vou”

“amanhã eu vou”





Sem demorar veio

a noite de um novo dia

Cuiarana e toda tribo bebia

aluá de milho e fumava diamba

a carimbamba calou-se

Ribeiro aproveitou-se

da alucinação da tribo

para empreender sua fuga

antes que nascesse o herdeiro

do cacique, seu filho, o deus

Cuiarana Jequiriti-Jequitibá





Porque curumim nascido

o pai seria oferecido

com a deusa Jequiriti

em sacrifício a tupã

na primeira aurora da manhã

e só havia um jeito de salvar

da morte a deusa Jequiriti

se o espírito de Jequitá

levasse em suas asas

o deus Jequitibá





No centro da ocara

frondosa palmeira

o vento torcia

enquanto por ela

Ribeiro subia

e por sorte,

soprou vento forte

feito tufão

derribando ocas

levando ao chão

quase toda taba

e na copa altaneira

da grande palmeira

Ribeiro cortou

uma enorme palha

e como uma gralha

Ribeiro voou





Passada a tormenta

Cuiarana juntara

o que sobrara de seu

pra reconstruir a ocara

como presente do deus

no alto da palmeira

a vinte metros do chão

Ribeiro deixara

o grande facão





Cravado na palmeira

o presente do deus

que trouxe a sorte

livrando da morte

Jequiriti-Jequitá

agora sozinha

podia esperar

nascer curumim

sem ter que morrer

com Jequitibá







Meninos!

Não minto

eu canto o que sinto

meninos eu vi

o corpo nu por inteiro

bonito e faceiro

de Jequiritii-Jequitá

eu vi Ribeiro abraçar

e depois desmaiar

eu vi Jequiriti

trepada no Jequitibá,

meninos, eu vi

Ribeiro por lá.









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