Coisas do Juvenal
maria da graça almeida
Falávamos um dialeto estranho.
Todos se intrigavam. Meu marido perguntava-me:
-Por que fala assim com ele?
-Uso a linguagem dele, sempre nos entendemos.
- Coisa estranha! Nunca vai aprender o certo.
- Para ele, assim é o certo.
- Você poderia ensiná-lo...
- Claro que não!
- Por quê?
- Nunca pediu...
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-Juvenal, as làmpadas do jardim queimaram?
- Não senhora, elas "tão discoicheiada".(ufa, que difícil!)
-O remédio para as formigas, ao menos, voroçó?
- Não só voroçó, mató a trempa inteira.
- Preciso comprar gás, Juvenal?
-Precisa não, o "bunjão" tem folgo(fólego).
- A cortadora de grama inda tá "triscano"?
- Eu "fisso uma treta nela, agora ela tá
tininu".
-------------------------------------------------Um dia ele me ligou bem cedo, já imaginei que a coisa deveria "estar preta", como ele mesmo dizia.
Levantar cedo não lhe era comum .
-Dona Graça, o "orobu baxou aqui".
- O que aconteceu?
-Bruce bateu "as bota"
Eu repeti perplexa e pausadamente:
-Ba - teu as bo - tas?
- Bateu, sim!
Fiquei muda.
Bruce era o meu boxer de estimação, meu cachorrão amigo.
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Sensibibilidade? Oras! E o que é isto?
No dialeto de Juvenal não existe tal palavra.
Quanto aos sentimentos, propriamente, ah... sei lá, mas ainda assim continuamos a nos entender...razoavelmente.
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-Juvenal, é lindo o André!
-Não é André, Dona Graça, nóis mudamo de idéia.
- Qual é, então, o nome ?
- É...é...ó Maria, que nome ele tem?
- Ué, mas foi você que iscuieu, hómi...
- Deu branco, Maria.
- Hum...pera aí... é ...é...É Dogras, Juvenal!
- Douglas? -pergunto.
- Não, Dogras, é assim rapidinho: Dogras-responde o homem.
- Posso ver a certidão do menino?
-Oia aqui! Maria entrega-me o papel com autoridade.
Abro-o e lá está: Dogras Pereira Nascimento da Silva.
Sim, o menino foi registrado e batizado pela oral e escrita ignorància familiar.
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