Disfarce
maria da graça almeida
A pedra lá firme, segura, e, incomodada, com o prédio sobre ela, perguntava eu ao meu marido:
-Como é que a pedra suporta tal peso?
- Ela aguenta. Não se desloca, nem flutua. Já imaginou os prédios todos boiando, mar adentro? -respondia-me Cláudio, o meu carioca bem- humorado-.
Ríamos e eu esquecia-me do prédio e da pedra.
Naquele dia, a praia estava vazia e, na lerdeza da tarde, sob um calorzinho ameno, eu esfolava a areia com a ponta da sandália.
Olhava com preguiça à minha volta.
-Vê aquele prédio sobre a pedra?
Ele sorriu e disse a imitar minha voz fina:
- Como será que ela suporta tal peso?
Fiquei sem graça e emendei:
Nem era o que eu ia dizer!- e continuei séria- O Ari comprou um apartamento ali...
-E a Cleuza, a mulher dele, disse que todos os dias é preciso limpar os vidros que a maresia embaça.- completou Cláudio tentando conter um risinho engraçado-.
Ainda mais constrangida, como se engasgasse com o primeiro gole de um licor açucarado, perguntei-lhe:
- Repetitiva, eu, não é?
Ele balançou a cabeça, olhou-me com carinho e respondeu sem ironia:
-Claro que não!
Ainda assim, fiquei preocupada e em seguida disfarcei, explicando-lhe :
- Falei isso várias vezes, eu sei! É que, ao olhar o prédio, lembro-me da queixa da Cleuza e volto a comentar para que você saiba por onde anda minha atenção. Sou assim, gosto de compartilhar o que penso, sempre!
Às vezes, certas desculpas brotam-nos tão de repente, que passamos a acreditar nelas.
Continuei, então, convicta:
-Adoro mesmo dividir meus pensamentos! Por isto, escrevo...
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