A Casa
A casa onde nunca fui rainha
Está lá a apodrecer.
Havia lá um cão fedorento que
Nem sabia rosnar.
Dele eu até gostava. O seu olhar
me dizia o bem que ele me queria.
O dono desse cão, esse sim rosnava
Muito.
Defunto vivo, assombração.
A sombra era só uma, fundia-se com
a do cão, uma sombra que crescia.
Cheirava a podridão.
A minha alma se erguia e bem baixinho
Dizia: não deixes de ser quem és.
Fica aí até seres capaz de caminhar com
os teus pés.
Os dias se passavam e a missão chegava
Ao fim.
Até que chegou o dia em que me vi dona
de mim.
Se acharem que sou ruim.
Se pensarem mal de mim.
O que se passa lá fora.
O que dizem não importa.
O meu mundo trancou a porta.
Para ventilar o lugar abro janelas
E portas que dão para varandas onde
Se fazem cirandas.
E poemas que não destilam fel nem mel.
Falam mais de crenças do que de desavenças.
Roupa suja se lava em casa.
Nem a esse trabalho me dei.
Pus tudo dentro de um saco e ao lixeiro entreguei.
Junto com a roupa iam restos do que fui ali.
Não era eu. Era a sombra do que fingia.
Nem eram restos de mim, eu nunca fui assim.
Lita Moniz
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