Saia do casulo. Sonhe acordada. São os sonhos que tornam a vida mais bela. Não fique triste. Tristeza não cabe em teu rosto. Sorria.
— Estou mais para o tom cinza...
— Não gosto da cor cinza. Dá tristeza...
Olhou discretamente para o garçom.
— Pois não, senhorita!
— A conta, por favor!
Morgana deixou sobre a bandeja uma nota de cem reais.
— Não quero troco.
O garçom liberou um sorriso comercial e acumulou em suas reservas mais vinte por cento além da comissão.
— Vais de táxi?
— Meu motorista já chegou. Queres uma carona?
— Não, obrigada! Vou de metrô.
— Não é por acaso que te chamam carinhosamente de ‘a dama do metrô.'
— Gosto de reparar o rosto das pessoas na estação.
— E queres trocar a cidade por uma ilha desabitada?...
— Vivo numa ilha dentro de um universo de falantes que não me compreendem.
— O homem é uma ilha, se assim o quiser. Que tens a fazer numa ilha deserta? Dirias para teu filho que há um mundo perigoso, depois do paredão das águas? Que depois da muralha existem pessoas que matam seu semelhante para roubar um tênis? Não estarias instituindo a teoria do medo? Talvez tenhas medo da solidão. Neste caso, o veneno é antídoto do próprio veneno. Por isso queres morar numa ilha.
Fez uma pausa. Tomou mais um gole de chá. Olhou para Ravenala que se mantinha em silêncio.
— Se teu filho perguntar: ‘ Existe outro mundo além deste universo de águas, mamãe?' Não lhe falarias de moda, avanços tecnológicos e outras coisas boas que há no mundo. Não queiras tornar-se pregoeira do niilismo.
- Ainda dá para reconstruir sem destruir. Alguma coisa precisa ser feita para retomar a vida de paraíso que tiveram nossos primeiros pais. Não cruzemos os braços! A chuva cai do céu, mas é preciso por a mão no arado. Preparar a terra se desejar boa colheita.
***
Adalberto Lima - fragmento de Estrada sem fim..
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