Lau persignou-se ao cruzar o cemitério das Sete Passagens. — O senhor acredita em assombração, Nhô Velho? — Tenho pesadelo com um desconhecido que despachei, lá na praça Afonso Pena. Mas fantasma nunca vi. Nem quero! Sabe, Lau! Mexo com essas coisas do outro mundo não! Morreu, vai para onde Deus for servido. No mais, encomendo um pai-nosso e três ave-marias pela alma do defunto e sossego! Tem coisa que se faz passar pela alma de algum morto e não é...por isso, dou assunto não! Só rezo. Rezo o credo também e pronto! — Conto como vantagem não Nhô, mas já dei um tiro numa coisa... — Atirou numa visagem? — Dei um tiro num vulto! Era branco e grande. Muito grande!... Eu voltava da casa do patrão. Confiei que a lua estava clara e dilatei a visita. No caminho um vulto apareceu em minha frente. Crescendo, crescendo...se avantajando...Atirei! A mula deu uma upa e afinou no caminho de casa. Se o amigo prometer não zombar, conto o resto da história. — Pois diga! — No outro dia, Urso Branco amanheceu esticado no pasto. — Urso branco no Brasil, Lau? — Era um reprodutor nelore! Mas não prestava. Não deixou cria. — Boto-cor-de-rosa também era assim. Acabou indo para a balança. — Nem me fale em pesar boi...dá dó. — Já vi gado chorar, cheirando sangue de animal morto. — Se depender de mim, não mato nem uma galinha.
*** Adalberto Lima - trecho de Estrada sem fim..
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