O dia está propício para mensagens do tipo “chuvoso”, ou seja, lacrimejante. Não espere de mim muita sapiência, pois tenho acanhado o intelecto e curta a inteligência. O meu mais profundo pendor, no entanto, é a modéstia, a (por que não dizer?!) humildade, o bem-querer e o espírito vingativo.
Esta última palavra não fui eu quem disse. Obrigaram-me a dizer. Por isso, não vou liberar o braço do médium. Se quiser escrever, que se obrigue a isso ou busque em sua cabeça, em seu bestunto, as idéias para passar ao papel. Não que eu não seja capaz de exprimir-me por mim próprio. É que não quero submeter-me ao arbítrio de outrem. Neste instante, tenho o desejo de esganar alguém que está pedindo por isso. Não sei por que ainda não o fiz.
Acho que merecia melhor sorte do que ser trazido até aqui para ficar preso e obrigado a escrever. Que chatice! Não peço para me ouvirem; por que, então, tenho de ficar falando, falando e falando?
Está bem, vou direto ao assunto. Quando desencarnei, trouxe comigo dívida muito grande para com meus confrades encarnados. É que eu cobrava um preço de início e ia aumentando a quantia estipulada várias vezes, até sugar os miolos dos que tinham contratado os meus serviços.
Agora estou fazendo a mesma coisa do lado de cá, embora por influenciação. Espero não ter aborrecido o irmãozinho por estar contando história conhecida. Mas a verdade é essa. Sou eu que estou por trás do Sr. João e espero que me compreendam, pois aprendi com o pai dele, com o seu progenitor, a agir assim. Como me vi em situações muito penosas, pretendi fazer com que o filho aprendesse a mesma lição que o pai me legou. Bem, esse cretino não usou de seu poder para influenciar o pai, para que parasse de agir daquela forma comigo.
Ele tinha uns quinze anos de idade, quando o pai se retirou de minha companhia. Eu faz vinte anos que parti para esta nova vida, mas não estou satisfeito com os fatos que ocorrem comigo. Sei que não devo ficar aborrecendo as pessoas. Só fico mais um pouquinho. Então, eu vou, se for para ir a algum lugar de muita paz. Prometo não influenciar mais ninguém negativamente.
Como fiz para aprender a me comunicar tão bem? Vocês acham?! Eu ouvi muitas lições nas escolas que freqüentei desencarnado. Fui observando as coisas, pois isto eu tenho de bom, e fui vendo como as pessoas conseguem expressar-se por meio de palavras. Não foi difícil, pois faz tempo que estou desocupado. Aprendi também matemática, história, geografia etc. Sei contar nos dedos em vários idiomas e posso até cumprimentar em inglês: “How are you, my dear and my friends?” Viram só?
Está bem, vou sair, pois estão pedindo-me para deixar o lugar para outros que estão esperando. Vejo que o ambiente aqui é muito saudável e agradeço muito a atenção a mim dedicada por esta “plêiade” (esta eu aprendi com o médium) de espíritos bondosos, que me fizeram sentir gente outra vez.
COMENTÁRIO — MANUEL
O irmãozinho Ernesto não é tão ingênuo quanto tentou insinuar. Deixou o lugar ainda muito perturbado, quase enlouquecido. Foi necessário contê-lo sob os efeitos de nossos mais poderosos meios de submissão, os quais só surtem efeito quando o espírito apresenta algum traço de regenerabilidade.
Quanto ao que disse, a maior parte conseguiu extrair das preocupações do médium, tendo inventado alguns dados para imprimir verossimilhança à sua história. Neste instante, deve estar adentrando instituição de recomposição perispiritual, para, em seguida, após a devida análise de seu caso, ser direcionado para lugar de recolhimento mais adequado para sua situação.
Devemos ficar preocupados com este tipo de manifestação, pois demonstra que a equipe tem algumas possibilidades de deslizes na caracterização específica dos problemas que se instalaram na consciência dos seres que se apresentam para a doutrinação. De qualquer forma, o estado mental e emocional dessa criatura pode constituir-se em significativo exemplo de estágio evolutivo.
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