Está a muitos milhões de milhas de distância da Lua. Do pico mais alto se vê Marte brilhante, muito claro. As paisagens são monótonas. É uma cidadezinha vulcânica. Insignificante, mas específica, pela raça ostentada por seus habitantes. Chama-se Blábláblá. Ama concursos de jogos florais com seus vizinhos. Tem apenas em torno de 25 habitantes. Todos adultos e ameaça desintegrar-se se houver uma metamorfose social.
Como a maior parte dos moradores é analfabeta, há uma estratégia fundamental na cidade. Pelo povo falam dois ou três intelectuais reconhecidos em assembléia para representar a plebe e manter a cidade em sintonia.
O estatuto da cidade foi aprovado mediante votação secreta e ordena em certo artigo que quem não estiver em sintonia com a orientação da troika será expulso da cidade sem dó nem piedade. Há colônias penais e a pena máxima é o ostracismo.
Tudo o que sabemos dessa distante e insignificante cidade foi-nos dado por uma repórter que visitou a urbe liliputiana tempos atrás. A paisagem é monótona. Nas esquinas das ruas há cobras venenosas ameaçadoras e nos bairros do subúrbio encontram-se alguns antigos colonos punidos pela nova ordem e retidos longe do poder.
A população vive de arroz, de frutas tropicais e de pesca. A raça ainda não está devidamente estudada mas os antropólogos trabalham com a suspeita de que esta etnia deve ter sido atacada outrora pelo vírus da ipseidade solitária. Em virtude desse vírus deve ter chegado à maníaca depressão de se achar fundadora do mundo e protagonista de uma existência superior neste deserto . Curiosos pela situação, alguns antropólogos os classificam como herdeiros de raças milenares atacadas pela doença da solidão. O espasmo estelar da solidão terá criado neles a necessidade de exposição. De preferência uma exposição em plena praça, em palanque pré-organizado que faça sentir a cada cidadão sua singularidade. Da singularidade passaram à necessidade de criar uma bandeira, e de se proclamarem raça esperta e descobridora. Ficam expostos ao sol e julgam-se descendentes dos deuses. Proclamam vantagens. Embora limitados, registram sua ascendência aos sete sábios da Grécia. Mas as pretensões, são apenas balbucios. Nada mais. Desprezam os restantes humanos. O grito fraternal com que se saúdam é um grito histórico que enraíza no moderno grito dos iluminados espanhóis do século XVI.
Quando decidem descer à rua mostram o olhar, gesticulam, abanam com a cabeça. Todos os gestos para dizer que eles são. Há a tendência para interpretar que quando eles dizem que são, talvez queiram dizer que são da raça dos deuses e que estão muito acima da platéia plebéia. Os jornalistas e os antropólogos que os visitam de quando em quando dão um sorrisinho cético. Pela pesquisa nenhum cientista garantiu até hoje que sejam melhores. Mas têm papo. Barafustam. Mostram que estão vivos. Usam sandálias tipo hawaianas. Não são simpáticos. A platéia não bate palmas. Acha que estes caras são chatos e ignorantes. Alguns descobridores de rotas galáticas já passaram na praça deles. Juram que não entenderam patavina do discurso deles. Um segundo jornalista ao visitar Blábláblá garante que têm a síndrome da gente soberba que construiu a Torre de Babel, mas que são tremendamente frágeis. Mais do que supõem.