Anacleto nunca foi má pessoa. Inclusive é capaz de atos heróicos.
Um dia, voltando para casa à noite, após a aula da faculdade, presenciou um marido batendo na mulher no meio da calçada. Ele descia o braço com violência e a chamava de vagabunda, rameira, imbecil.
A mulher parecia não saber a quem recorrer.
Anacleto penalizou-se e partiu para cima do cara, dando-lhe uns bons bofetões.
Foi surpreendido com vassouradas da mulher, que gritava:
- Não bate no meu maridinho, seu desgraçado!
Anacleto foi embora correndo, com a cabeça cheia de galos e sem nada entender.
Lembrou-se do ditado popular de que “em briga de marido e mulher não se mete a colher” e aprendeu a lição.
Aconteceu que uma das alunas da faculdade havia dado a luz a gêmeos e promoveu uma festa para comemorar o batizado.
Eu fui acompanhando duas professoras.
O salão de festas estava lotado, aquele burburinho, crianças correndo de um lado para outro, balões pelo teto e pelas paredes.
Olhei e vi o Anacleto sentado em uma das mesas, bebendo. Não percebi que ele já estava alto.
Convidei as professoras para conhecê-lo, afinal, tratava-se de um colega de trabalho.
Apresentei-as a ele, passamos pelas formalidades iniciais, mas Anacleto, bêbado, partiu para os problemas pessoais, causando um certo desconforto.
- Cara, estou com um problemão. Deviam proibir a fabricação de camisinhas de baixa qualidade. Acredita que a camisinha estourou e minha mulher está grávida. O que é que eu faço agora? – disse-nos.
Quem não sabia o que fazer era eu.Eu olhava para as professoras envergonhado, elas olhavam para mim com um ar de interrogação como a perguntar:”É assim que são os teus colegas de trabalho?”
Que situação!
Eu olhava para todos os lados procurando a mulher de Anacleto e ele continuava a lamentar-se e a contar das suas intimidades: que a gravidez era de risco, que ele estava há mais de três meses sem transar, que ele não estava agüentando mais...
E eu não sabia o que fazer, nem onde me enfiar. Eu não sabia que Anacleto, quando bebia, começava a revirar seu baú de ressentimentos.
As professoras deram um jeito de sair de fininho e eu tive que ficar escutando, pois ele me puxava pelo braço.
Fui socorrido pela mulher do Anacleto que, conhecendo o comportamento do marido depois de umas e outras, foi buscá-lo envergonhada.
Fiquei traumatizado. Mesmo tendo passado tanto tempo não consegui esquecer a saia-justa em que me meti.