“Tô” fora!
maria da graça almeida
O espírito não envelhece tão rapidamente quanto a matéria, porém se possível fosse, tentaríamos envelhecê-los juntos, de mãos dadas.
Pobres dos "experientes” que se vangloriam por considerarem seu espírito jovem. Estes, com a chegada da “decadência” física, ainda sofrem mais do que os que assumem a idade por dentro e por fora.
Não vejo vantagem nenhuma ao ouvir de alguém: tenho muita idade, mas meu espírito ainda é adolescente...
Azar o seu!- penso imediatamente.
De que adianta ter um espírito jovem, aprisionado num corpo cheio de limitações?
De que adianta ter o espírito jovem e não poder: correr, pular, dançar a dança da moda, ter a convicção que não é de bom tom espiar pelo buraco da fechadura, nem escovar os dentes com os dedos?
De que serve a jovialidade espiritual, se aos "experientes" não é permitida a expressão de súbitos desejos, de pueris vontades, assim como saltar pela rua num pé só, chutar as pedras das calçadas? Bem, a não ser que quisessem passar por caducos ou malucos.
Para que serve esse tal do espírito adolescente se a visão não mais contribui para a leitura de um bilhete carinhoso?
Por que enaltecer o espírito-menino quando não mais se conta com boa audição para ouvir um hino ao amor?
Valha-me Deus.
Bom seria envelhecer conjuntamente, corpo, vaidade, expectativas, capacidade de amar, necessidade de novas experiências. Seria providencial! Tudo à sua hora, ao seu tempo. Aí não se teria impressão de caminhar para frente, com a cabeça voltada para trás. Aí se teria a conformação de envelhecer harmoniosamente e, no envelhecimento, a conquista de um novo lugar ou a certeza de uma aquisição invulgar, intransferível e necessária.
Espírito jovem? “Tô” fora!
Meu espírito tem, no mínimo, a idade do meu nascimento, ou muito, muito, muito mais...
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