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Cordel-->Maria Parideira -- 21/07/2002 - 11:50 (maria da graça almeida) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Maria Parideira
maria da graça almeida

Maria, olhos carentes, coração, perpétuo salto,
tinha sonhos indecentes de doar-se no asfalto.
Neta da velha Gertrudes, carpideira de primeira,
via avó sobre ataúdes comandando a choradeira.

Gertrudes para Maria: -Deságüe mais amiúde!
Mas, Maria era feliz!-Pra que chorar, vó Gertrudes?
A avó, sim, argumentava:-Temo o pão a nos faltar!
E Maria só pensava em rir, sorrir e folgar.

Numa tarde então fagueira, de um rapaz de muito trato,
a Maria hospitaleira inteira entrega-se ao tato.
Ao mocinho das botinas deu-se a beldade sem dó,
pois que o jovem da cidade era bonito que só!

E o desfrute de Maria preocupava a velha avó:
-Toma tento, ó guria, cuida de afinar seu pranto,
da barriga mais vazia só se ouve um triste canto!

Maria no traje florido ria-se de jeito atrevido.
Pensava nos remelexos, no visgo molhando o queixo,
nos seios empoeirados, no prazer inusitado.

E o rapaz das belas botas num triste dia sumiu.
Maria, por sina ou desdita, de casa não mais saiu.
Da figura avolumada já o povo maldizia:
-Maria assim engordada isso “tá” cheirando à cria!

E a moça enfim mulher quedava-se a recordar
do amor que inda queria, ingênua, alimentar!
Quando o ventre intumesceu, pôs-se ao rumo da cidade.
A buscar um sonho ateu, olvidava a realidade.

E por lá nasce o rebento da mocinha parideira,
que vivia à procura da botina domingueira.
Sob o vestido florido, o corpo cedia aos homens.
Quanto mais filho parido, tanto maior sua fome.

Quando cansada do asfalto, com os filhos em fileira,
rota, triste, sem sapatos, volta ao lar a parideira.

A pobre chora e se queixa, ouvindo a avó contrafeita:
- Nada de pingos, Maria, guarde todos, um por um,
pois que hoje, neste dia, morto aqui não há nenhum!
Reserve as gotas, mulher, para um defunto incomum.
Chorar assim com efeito, só em cima dos filós!
E Maria por respeito resseca as gotas no pó.

No dia seguinte, cruzes, Maria assim que acordou,
olhou dorida e com medo para a cena que a açoitou.
A avó recém-falecida debruçada sobre a pia.
Visão nua e sofrida, um repente de agonia.

A notícia correu presta na dor em vão manifesta.
Os soluços no ataúde já não eram de Gertrudes,
pois que ali sem emoção, os olhos sob a mantilha,
entrelaçadas as mãos, jazia alva no caixão.

Maria chorava e gemia sobre Gertrudes inerte,
por fim, naquele dia, as gotas desceram férteis.

Mas, eis que da parideira quase pára o coração,
pois, a avó, velha matreira, piscando, toca-lhe a mão,
vendo a platéia dispersa, arrisca com voz discreta:
-Agora sim, minha neta, este choro é dos bons.
Nenhum velório é festa, entenda a minha razão:
quando da falta do pão, chora-se em qualquer caixão.

Dessa hora derradeira, Maria não mais pariu,
lá nascia a carpideira mais chorosa do Brasil!

maria da graça almeida



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