Era o vento a soluçar a perda do valor,
ao longe, junto da verdade imanente,
distante do eu que sou e que serei:
contínuo revolver de antigos pensamentos.
A nau que já partiu há tempos
não sei se tornará, esguia e azul,
como a visão do mastro que se eleva
verticalmente na distância horizontal,
no brilhante amarelo-azulado do ar úmido e frio.
Deus, ó Criador, experimenta-me!
Tu que és e tens consciência disso,
tu, conhecedor do valor e jamais enfastiado,
por que não me levas contigo?
Por que não te aproveitas de mim?
Serei acaso um inútil?
Tudo nada é para mim, porque não sou humilde.
Não estou preparado para receber Deus.
O mundo todo ainda não merece.
Como tudo é vago, como tudo é vão:
incerteza, martírio e dor.
Pedra, sempre pedra,
sobre ti edificarei minha igreja,
sobre ti erguerei meu santuário de devoção,
sobre ti chorarei as mágoas de minh’alma.
Pedra, serei igual a ti:
insensível.
Não! Não é isso. Pedra, não és insensível:
tu és em ti mesma.; existes em ti mesma,
dentro de mim.
E eu serei tu.;
terei toda a tua vivência.;
projetar-me-ei para fora.;
sentirei a comunhão universal do ser.
Deus, és pedra!
Ilusão perdida, volta!
A nau já torna ao porto antigo.
E eu, onde estarei?
29-30.04.58.
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