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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->17. TARDE MOVIMENTADA -- 10/06/2002 - 11:59 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Nem se havia instalado no escritório, Fernando chamou Joaquim. Queria pôr as coisas a limpo.

O empregado não estava. Saíra com a desculpa de não estar sentindo-se bem. Fora dispensado pelo gerente.

Eis que a rede tem meios de proteção...

— Pronto!

Era João. Informava-o de que Jeremias tinha sido levado a hospital. Esperasse por ele no escritório. Precisavam conversar.

— Venha mesmo. Falaremos também de negócios.

E agora? O que estaria acontecendo com o amigo?

Olhando para a loja, viu adentrarem os dois fiscais que a Corregedoria investigava. Em má hora, que não estava para conversas. Maria o havia aborrecido demais e as emoções do dia se acumulavam.

— Sentem-se, por favor. Tenho uma barganha para oferecer-lhes...

Não dera tempo para que abrissem a boca.

— Se vocês desaparecerem da minha vida, não vão correr o risco de abrir os meus livros para os corregedores.

— Isso é alguma ameaça, Senhor?

— Saibam que, assim que saíram, eles apareceram na fábrica de Jeremias, à sua procura. Essa informação parece valer o seu preço. Aliás, o fato de terem vindo até aqui poderá comprometê-los, caso estejam sendo seguidos. Sei que foram atrás de Jeremias por ser meu amigo...

Os dois trocaram expressivos olhares e concordaram com a proposta. Já haviam sugado a laranja até o bagaço. Estava na hora de procurarem outra freguesia.

— Muito obrigado, Senhor Fernando! Sua informação foi muito valiosa. Estaremos reconhecidos.

No salão, cruzaram com o contador, que entrava apressado. Cumprimentaram-se ligeiramente e sumiram atrás da vitrina.



— Estou muito preocupado, caro Fernando. Recebi diversos avisos espirituais a respeito da saúde do Jeremias e aguardava com ansiedade que algo pudesse vir a acontecer-lhe. Foi muito teimoso, pois não deu atenção às recomendações para procurar o médico. Soube da discussão na fábrica e da triste conseqüência. O meu filho Eduardo, que você deve ter conhecido na fábrica, é que me comunicou de imediato, assim que a ambulância partiu.

— Aquela jararaca da mulher foi atrás de mim, quando soube que estava lá.

— Mas não vim para falar do Jeremias. Vim por causa dos fiscais que acabaram de passar por mim no saguão.

— Fiz que desaparecessem da minha vida.

— Como assim?

Fernando reproduziu os acontecimentos, pondo João a par de tudo.

— O confrade Onofre é que me advertiu a respeito do andamento das investigações. (Fernando começava a perceber que o Espiritismo poderia constituir-se em confraria, para a ajuda mútua das pessoas.) Assim que ligaram da fábrica, pôs na ativa os corregedores.

— Foi o que depreendi pelo oferecimento dos serviços ao Jeremias.

— O meu temor é que viessem a ser detidos justamente nesta loja. Se isso acontecesse, é certo que o Senhor...

— Você, por favor.

—... que você seria envolvido, já que nem todas as taxas devem ter sido recolhidas. A sua cumplicidade iria implicá-lo.

— É por isso que estou contratando a sua empresa contábil. Você me prometeu que iria até sair mais barato...

— Usaremos a tabela do escritório, que é das mais acessíveis. Tomaremos conta da papelada, com o máximo prazer. Apenas quero preveni-lo de que pagaremos todos os impostos atrasados. Não haverá moratória, mas o Governo permite parcelamento dos débitos, caso a iniciativa parta do contribuinte. Acredite que tudo farei para regularizar as contas.

— Isso irá dar muita tranqüilidade ao meu espírito. No começo, achei muito bom ficar com mais algum. Mas o crescimento da sonegação aumenta a perspectiva da devassa. Estava começando a acreditar que as duas ratazanas aí, na hora certa, iriam abandonar o barco.

— Com o advento da informática aplicada às contas do Governo, está cada vez mais difícil escapar. Os nossos amigos tinham acesso aos computadores e apagavam os dados oficiais. Mas qualquer levantamento nas faturas dos fornecedores irá revelar o quanto a sua firma desviou. É por aí que o meu escritório irá começar. Eu só quero que ponha o almoxarife à minha disposição. E que o instrua a me fornecer todos os elementos de que precisar.

— É pra já!

Enquanto Fernando descia até o depósito, João observava a facilidade com que todas as exigências estavam sendo atendidas. Jeremias o havia feito crer em que Fernando colocaria obstáculos. Não era o que estava acontecendo. Teria o negócio com o Ministro dado certo? Estaria o comerciante escondendo a parte do leão? A ida ao terreiro gorara. Estaria frutificando o comparecimento ao centro? Fora tão recente... Que misteriosos caminhos percorre a mente humana até chegar à verdade!

Quando Fernando regressou com o funcionário, encontrou João lendo um livro ensebado. De onde estava, João levantou o volume e, apontando a capa, esclareceu:

— Allan Kardec. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Leitura obrigatória. É o breviário dos espíritas. Um pouco a cada dia, saúde para sempre, como dizem os americanos sobre a maçã.

O almoxarife sentiu-se à vontade. Não esconderia nada. Estava determinado a atender ao chefe, que era bom patrão e que lhe garantia excelente retirada mensal. Temia a presença dos agentes do governo, sempre enxeridos, metendo o bedelho em tudo, fazendo desaparecer faturas e notas fiscais. A presença de pessoa especializada, oficialmente remunerada, satisfazia-o muito mais. Se tivesse sido desonesto, teria dado para aproveitar-se da situação.

Feitas as solicitações, João dispensou o empregado, determinando a hora em que o seu pessoal iria aparecer para o início dos trabalhos. Quanto antes melhor.

— Caro amigo, preciso fazer uma pergunta que não me diz respeito, mas que poderá determinar o rumo do nosso relacionamento comercial.

— Se é sobre o contrato com o Ministério, tenho pensado que não devo prosseguir insistindo. Errei quando fui levado a julgar que o dinheiro está acima de tudo. Na Umbanda foi que percebi que as forças espirituais podem influenciar de maneira maléfica. Quando me afastei, foi porque fiquei temeroso de um envolvimento desconhecido com entidades sem escrúpulos. Se eu estava a pique de fazer o mal, que dirá quem está acostumado a isso?!

— Está absolutamente certo!

João admirava a lucidez de raciocínio do novel amigo. Começava a gostar dele, pela franqueza da exposição.

— Vejo que está em condições de iniciar as leituras para aprendizagem teórica da doutrina.

Sem hesitar, passou-lhe o livro que conservara nas mãos.

— Quinta-feira, eu lhe darei um novo. Enquanto isso, ponha-se em contacto com a moral evangélica. Está acostumado a ler?

— Leio pouco.

— Pois essa obra é bastante acessível. Caso lhe apresente alguma dificuldade, tome notas para perguntar no Centro. Também não precisa ler em seqüência. Procure os assuntos que mais lhe interessem. Quem começa o aprendizado espírita pelos livros (e esse não é o seu caso), sempre leva a vantagem do acompanhamento dos benfeitores espirituais, pois acende-se uma luz que atrai os bons e afasta os maus. Sozinho, em casa, se estiver conservando o poder da visão espiritual, poderá observar quem irá estar ao seu derredor. Quando alguém lê com fé, com esperança, também pratica a caridade de oferecer aos menos dotados as explicações...

João percebeu que se empolgava e que poderia assustar o postulante:

— Em suma, não vamos colocar o carro adiante dos burros...

Fernando notou que estava bem mais sereno. A notícia de Jeremias é que estava tomando vulto em seu pensamento:

— Que faremos, quanto a Jeremias?

— Vamos ligar ao hospital. Com licença.

João mesmo discou e solicitou as informações.

— Está sob observação, tomando soro. Somente amanhã teremos o resultado dos primeiros exames. Se permanecer internado, só poderá receber visitas na quinta-feira, à tarde. Em qualquer caso, não transmitiremos qualquer notícia sobre o estado de saúde por telefone. Queira desculpar.

Linguagem protocolar. A atendente devia repetir a mesma ladainha para todos. Se fosse gravação, desligaria de pronto.

— Temos uma palestra interessante no Centro, hoje à noite.

— Não poderei ir. Compromissos com a esposa.

— Pode levá-la. Às oito horas.

— Não prometo.

Era o fim da entrevista. João saía muito satisfeito. Ganhara um cliente e, mais do que isso, estava levando mais alguém para a Doutrina. Enquanto se regozijava, concentrava-se em prece de agradecimento aos protetores. Sabia que, sem eles, o desfecho das conversações seria outro.



Sozinho, Fernando resolveu livrar-se de um peso na consciência, definitivamente:

— Alô! Quero falar com o Silvano.

Era o contacto com o Ministro.

— Meu caro Fernando! Como vai?

— Você está livre de mim.

— Como?

— Esqueça a concorrência. Estou fora.

— Você vai dar de mão beijada...

— Não utilize o meu nome, por favor, para incentivar os interessados. Se ligarem para mim, vou falar que estou fora.

— Mas o Ministro estava cedendo...

— Não se fala mais nisso. Agradeço ter segurado a negociação até agora, mas não farei mais qualquer oferta. A minha proposta irá em envelope lacrado, como reza o edital.

Do outro lado da linha, bateram o telefone.

Fernando encheu o peito de ar. Recostou-se na poltrona. Precisava meditar sobre tantos acontecimentos. Mas o telefone não deixou.

— Fernando, sou eu. Dolores. Você soube o que aconteceu com o Jeremias?

— Soube que está internado.

— Maria pediu que passasse a noite com ela. Os pais só vão poder chegar amanhã.

— Mas o caso é para tanto?

— Claro que é! Você não está saindo da religião?

— E daí?

— Pois Maria não vai deixar o marido fazer o mesmo.

— Eu quero conversar com você ainda hoje.

— Não acho que temos muito que falar. Você já disse tudo. Não me faça bater o telefone na sua cara. Você tem a sua liberdade. Não era o que queria?

— De onde você está ligando?

— Que importância tem isso?

— Pois eu acho que a Maria está aí do seu lado. Ou o Timóteo.

— Não seja tonto. Estou em casa. E mesmo que não estivesse, isso não seria da sua conta.

— Querida...

Não respondeu. Desligou. Imediatamente Fernando ligou para casa. Não se conformava com o andamento das coisas. Parecia-lhe que tinha tudo sob controle. Agora, sentia forte reação à sua declaração de direitos. A empregada atendeu. A patroa não estava.

Fernando hesitou em ligar para a casa de Jeremias. Poderia ser acusado de ter provocado os distúrbios. Santo Deus! Quanta complicação!

Nem bem descansara o fone no gancho, dá de cara com o Roque sentado na poltrona do canto, charuto fumegando na mão. Que desejaria?

— Vá ao Centro hoje à noite.

Disse e desapareceu, para aturdimento do encarnado.

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