Usina de Letras
Usina de Letras
250 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62152 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10448)

Cronicas (22529)

Discursos (3238)

Ensaios - (10339)

Erótico (13567)

Frases (50554)

Humor (20023)

Infantil (5418)

Infanto Juvenil (4750)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140786)

Redação (3301)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1958)

Textos Religiosos/Sermões (6176)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->19. OUTRAS ATIVIDADES NO CENTRO -- 11/06/2002 - 06:24 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Fernando estava cercado de pessoas silenciosas. A porta lateral não distava do ponto em que se encontrava, de modo que o remédio foi enfrentar a fila. Entravam de dez em dez. Logo chegaria a sua vez. Tinha motivo para comparar com a fila do confessionário ou da comunhão. Será que os nomes das pessoas lhe viriam à mente? Uma era Dalva. Ou Dalva seria o nome da conferencista? Outro Francisco, como o médium de portentosa voz. O menino Gabriel. Como saber? Contou as pessoas até a porta: oito. Entraria na próxima leva. No máximo, dentro de três ou quatro minutos. A cerimônia era rápida. Seria como o descarrego da Umbanda? Atiçava a curiosidade.

Ao adentrar, reparou que o quarto não era grande. Cadeiras se dispunham encostadas à parede. A luminosidade era escassa, da conhecida cor azul. Os que entravam se sentavam. Havia um “passista” para cada cadeira. Quando a porta se fechou, a moça que estava à sua frente solicitou que pusesse as mãos sobre os joelhos, palmas para cima. Que se concentrasse em Jesus, como se o Mestre estivesse presente. Fechasse os olhos.

Resolveu que não seria percebido se os mantivesse levemente abertos. Queria saber o que se passava.

A passista ergueu os braços, como se solicitasse as bênçãos dos Céus. E, com movimentos suaves, descia sobre a cabeça, sem encostar. Fernando era capaz de perceber que orava muito levemente. Leve aroma de alfazema. Aos poucos, a moça ia passando as mãos pelos lados de seu corpo, sempre sem roçar. Como se tivesse captado algo, arremessava os dedos para baixo, para livrar-se de alguns maus fluidos.

Não conseguia concentrar-se, mas longo arrepio passou-lhe por toda a epiderme. Era tênue frêmito, muito agradável, como se estranha energia o banhasse. Fechou os olhos. Queria aproveitar ao máximo a dulcíssima sensação. O dia todo tenso e agora aquele refrigério de paz. Quando começou a orar um padre-nosso em agradecimento, foi tocado no ombro. Devia retirar-se.

A saída era por outra porta. Encontrou-se em corredor a céu descoberto, escassamente iluminando. As pessoas encaminhavam-se para a direção da rua. Serviam água em pequenos copos descartáveis. Aceitou, bebeu e depositou o copinho no latão.

Do lado de fora, percebeu que saíra pela porta lateral que conhecera fechada no dia anterior. Mas precisava conversar com João. Entrou pela porta principal, encontrando o corredor que antecedia o auditório vazio. Vozes saíam das dependências a que dava acesso. Havia um pequeno balcão à entrada de uma das salas. Lá dentro, prateleiras com muitos livros novos. A senhora que atendia cumprimentou-o.

— O João está à minha espera.

— Na secretaria.

Era onde estivera recolhido.

— Precisamos conversar. Tomou a água fluidificada? Estamos com dificuldades em relação aos médiuns. Ainda bem que não veio muita gente. Soube mais alguma coisa do Jeremias? Fizemos uma “corrente” em sua intenção, agora há pouco. O Silvano quis “aprontar-lhe” uma. Gostou da conferência da Dalva?

João emendava os assuntos, com rapidez. Queria conversar, mas se via que não dispunha de muito tempo.

Fernando ia respondendo como podia. Só não entendeu a do Silvano.

— Aprontar o quê?

— Por enquanto está contornado. Ele acionou os canais competentes, para forçar devassa na sua empresa. Foi o Onofre quem me preveniu. Quando soube que eu estaria à frente da escrituração, adiou as providências.

— Não será difícil de mandar alguém avaliar as concorrências do Ministério.

— Não haveremos de incentivar as represálias. O coitado deve ter tido os seus motivos.

— Despedi-o, assim que você saiu.

— Foi o que imaginei. Quantas voltas o mundo dá! E com que pressa! Mas não vou preocupar-me com tão pouco. Você é peixe muito pequeno. Já pensou a que estaria exposto, se conseguisse o contrato de forma irregular?

— Que devo fazer?

— Deixe comigo.

Fernando desconfiou de que João pudesse estar envolvido na tramóia, para valorizar os serviços. Começava, porém, a avaliar aquele recinto como sagrado. Pelo menos para o contabilista. Assim, levar a cabo algo tão perverso no mesmo ambiente em que conversava com os espíritos que tudo podem saber a respeito das atividades humanas, seria, no mínimo, improvável hipocrisia. O que não padecia dúvida era o fato de o homem estar citando sempre que a melhor atitude é a honestidade.

— Vejo que você trouxe o meu livro. Leu alguma coisa?

— Tentei, mas adormeci. Acredita nisso? Quase perco a hora. Cheguei atrasado e não consegui concentrar-me nas palavras da Dona Dalva. (Confirmava-se a inspiração. Ou o nome do quadro de avisos lhe ficara no inconsciente?) Há alguma explicação para essa onda de devaneio, quando preciso estar atento a todos os atos, para não ofender a ninguém?

— Não pense que estamos em condições de responder a tudo. Aos pouquinhos, iremos ver se conseguimos as explicações. Venha conhecer o nosso estoque.

Uma porta se comunicava internamente com a saleta dos livros. João pediu outro EVANGELHO e passou a Fernando. Era presente seu. Se quisesse adquirir as outras obras de Kardec (indicava-as na prateleira), não iria gastar muito. Fernando quis saber quantas eram. Mais quatro, pelo menos. Jeremias já as levara e lera. Rapidamente, Fernando estava de posse de todas. Estranhou o preço módico.

— Kardec é baratíssimo. Afinal de contas, a falta do poder econômico não deve ser obstáculo para a divulgação da Doutrina. O que nós lamentamos é que poucos lêem. Mesmo os que estão conosco há bastante tempo. Às quartas-feiras, mantemos um grupo de leituras dessas obras fundamentais. Estamos lendo A GÊNESE. (Punha o indicador sobre um dos livros nos braços de Fernando.) Mas são poucos os que comparecem. É uma lástima. Se não fosse pedir muito, iria sugerir-lhe que venha. Mas é preferível que volte na quinta, pois as discussões sobre os temas técnicos poderiam enfará-lo.

Enquanto falava, João ia levando Fernando para a outra sala. Ali, pessoas o esperavam. Fernando reconheceu os que estavam à mesa, no dia anterior. Eram também passistas. Sentiu-se deslocado, apesar de o cumprimentarem efusivamente. Queria ver-se fora dali. Não se enturmava com facilidade.

Agradeceu a João, deu um adeus geral e saiu. Precisava do ar da noite.

Lá fora, uma mulher chamava o filho:

— Gabriel, vamos embora!

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui