Can, A Cachorra Escondida Por Trás da Palavra Cansada
Quando eu era criança pensava que o feminino de cão era can. Numa tarde de primavera, vi uma cachorra de rua e exclamei para a minha vó:
- Olhe lá:
- Uma can!
Porém ela corrigiu:
- Não é can.
- O nome certo é cadela, a esposa do cão.
Deste jeito eu perguntei:
- Mas se feminino de cachorro é cachorra, por que a esposa do cão não pode ser cã?
A idosa exclamou:
- Não faça pergunta difícil, menina!
A partir daquele instante, toda a vez que uma moça dizia:
- Estou cansada!
Eu imaginava uma cachorra de rua, velha, doente e macucada ao lado dela. Na verdade eu via uma can, uma cadela triste e imaginária que ficava ao lado de pessoas fadigadas depois de um árduo dia de trabalho ou de alguma atividade pesada.
O problema é que toda a vez que trabalho demais e me esforço além da conta chego a ver, até hoje, uma can ao meu lado. Esta cachorra idosa e triste só vai embora depois que tomo banho e durmo.
Mas a can sempre me deixa uma surpresa no dia seguinte:
- Um osso de esperança para ser roído, aos poucos, cada vez que me esforço.
Luciana do Rocio Mallon