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Roteiro_de_Filme_ou_Novela-->33. FERNANDO TEM IDÉIAS -- 25/06/2002 - 06:04 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Almoçou só. Os serviçais estavam desolados. A patroa nada lhes havia informado a respeito do almoço nem das diretrizes gerais dos trabalhos domésticos. Fernando orientou-os quanto às compras, autorizando-os a preencherem cheques até determinado valor. Assim se tranqüilizaram mas puseram sob suspeita a harmonia conjugal.

De volta ao escritório, recebeu bilhete de João, alertando-o para que não efetuasse nenhuma grande compra. Quanto a vender, tudo bem, mesmo porque o almoxarifado estava bem fornido.

Chamou o gerente e expôs-lhe a situação relativa aos problemas com o fisco. Nada que devesse preocupar o pessoal subalterno.

— Joaquim está fazendo falta?

— Podemos dar conta da parte dele. Era eficiente nas vendas. Contudo, o relacionamento com o resto do pessoal...

— ... deixava a desejar.

Fernando estava formando um quadro muito desabonador da personalidade do antigo empregado.

— Melhor assim, pois pretendo pôr as coisas bem claras quanto às contribuições para o Governo. A idoneidade desta firma correu o risco de manchar-se. Agradeço-lhe a boa vontade. Se tudo der certo, vamos mudar a forma de remuneração da turma. Não sei se através de distribuição de quotas dos lucros, se pela produtividade. Converse com os outros. Talvez queiram bonificação por venda efetuada. O que lhes parecer melhor, dentro da lei e das possibilidades da empresa, eu farei.

— Tudo bem, Senhor Fernando. Pode contar comigo. E com os outros, que por eles eu me responsabilizo.

Só, Fernando pensava na razão de não adquirir nenhum produto. Seria por serem os fornecedores desonestos? Ou as despesas iriam onerar o capital da empresa, à vista dos saques que se efetuariam com o pagamento dos atrasados? Achou que não podia ser muito importante, caso contrário João estaria ali.

Lembrou-se de que o contador fora chamado por Joaquim. Se continuasse correndo, não daria conta de acompanhar o movimento de todas as empresas sob sua orientação e controle. É admirável que pessoa tão ocupada ainda tenha tempo, todas as noites, para o Centro Espírita.

Apanhou O Livro dos Médiuns mas não abriu. Voltava-lhe à mente a manifestação a que dera curso na noite anterior. Não se lembrava direito, mas o protetor pedira preces por Jeremias. Era como na Igreja Católica. O Padre Timóteo estava preparando a missa de sétimo dia. Isso não era a mesma coisa? Rezariam em ambas as instituições.

Voltou o pensamento para o sonho. Tinha a sensação de ter palestrado longamente com o amigo. Pela pobre experiência, parecia-lhe supor certo, pois julgava que os acontecimentos durante o sono se refletiam de modo atrapalhado na mente, formando as visões desencontradas na parte material do cérebro.

Habituava-se a aceitar as teorias complicadas que se formavam durante as meditações. Era assim, com certeza, que os benfeitores espirituais invadiam a privatividade dos médiuns, para lhes fixar as diretrizes sobre as quais deveriam tomar as decisões.

— Como poderei ajudar Jeremias?

Soltou a frase em voz alta, sem perceber que falava sozinho. Estivesse Joaquim espionando e diria estar ficando louco.

Ajudar o Jeremias? Se a consciência o acusar de suicida, por certo vai precisar de muita ajuda. De qualquer forma, porém, essa doença...

— Será que estou sendo preconceituoso? Por que não disse logo AIDS?...

Dessa vez, fez a pergunta mentalmente.

— Sobre que pensava? Ah! De qualquer forma a AIDS sempre é transmitida. No caso do Jeremias, por meretriz, em uma das “escapadelas”...

Fernando imaginou se Jeremias já estaria à cata de caracterizar quem lhe passara o vírus. Será que se voltaria contra tal criatura? O mais certo não seria buscar auxiliar tal pessoa, que deveria estar disseminando a doença pelos clientes? O brasileiro é burro. Lembrava-se das entrevistas na televisão em que os médicos e os sociólogos reclamavam de que os homens renegam o uso de “camisinha”. Parece que lhes afeta a masculinidade. Ouviu um boçal dizendo que não gostava de chupar bala com papel.

Fernando parou para pensar em seu próprio caso. Nunca se utilizara de preservativo. Nem a mulher jamais tomara pílulas anticoncepcionais. E por que não engravidara? Os médicos atestavam a saúde de ambos. Podiam procriar. Apenas não conseguiam levar avante o plano de terem filhos. Se Dolores engravidasse e abortasse, haveria esperança. Nada.

— Estará pensando em mim como estou preocupando-me com ela?

Abriu o livro, mas não leu uma linha sequer. Vagamente, tinha a recordação de que alguém lhe pedira para ajudar as “mulheres da vida”.

— Outra vez estou com medo de dizer a palavra correta? Por que digo “meretriz”, “prostituta”, “mulher da vida” e nunca emprego os termos mais comuns: “puta”, “rapariga”, “barregã”, “cafetina”?

Fernando lembrava-se de que não tinha o hábito de falar palavrões. Quando alguém soltava expressões chulas no carteado ou nas corridas, sentia-se mal. Desde criança, policiava-se muito. Teria sido a circunstância do confessionário? Com toda a certeza.

— Se eu tiver de ajudar alguma dessas desgraçadas, que seja a que lhe passou a terrível moléstia. Será que Joaquim poderá me dar as informações exatas das casas que Jeremias freqüentava? Aposto que até Maria sabe onde ficam...

Sentiu que iria adentrar área extremamente perigosa. A exploração do lenocínio exige ampla rede de marginais. Conjeturou que a guarda de prostíbulo deve, no mínimo, considerar o apoio policial. Via, na televisão, que as quadrilhas que se desbaratavam sempre apresentavam algum soldado ou ex-militar. Aí se surpreendeu com o fato de não se lembrar de nenhuma reportagem a respeito do estouro de lupanar de alto luxo. Ouvira falar de exploração de menores em boates de quinta categoria. Lembrava-se, vagamente, de detenções efetuadas em casa noturna de nomeada. Havia, inclusive, juízes, capitães de indústria e professores universitários na clientela. Mas não lhe constava ter dado em algo. Se quisesse investigar, com certeza iria ver-se preso nessa tremenda rede do crime organizado.

— Por outro lado, não posso correr o risco de ser surpreendido com outros interesses. Se Dolores fica sabendo que entrei num desses lugares suspeitos (e ela já manteve espiões para me seguirem), aí é que as coisas desandam de vez.

Pensou em conseguir alguém que o auxiliasse. Joaquim lhe forneceria os dados. Quem estaria disposto a acompanhá-lo. Leonel? O estróina positivista era muito escorregadio. “Se precisar, comungo!” Não fora assim que se definira como materialista? Francisco, o capitão aposentado, lógico! Desconhecia-lhe o caráter, mas, ao menos, era militar e isso talvez o recomendasse para o empreendimento. Além do mais, adepto do Espiritismo, lhe estava sendo dada rara oportunidade de praticar a caridade. Qual o lema mesmo da Doutrina? “Fora da caridade não existe salvação.” Com João não poderia contar, mas ajudaria certamente com oportunos conselhos.

Se encontrasse a mulher contaminada, que lhe diria? Que estava doente? Que precisava medicar-se?

— Acho que basta informar que Jeremias morreu de AIDS. Vai pensar que foi ele quem lhe transmitiu a doença e irá cuidar da saúde. Se Dolores estivesse numa boa comigo, iria consultá-la. Quem sabe esteja aí bom assunto para mantermos acesa a conversação.

Antes de iniciar a leitura da Introdução, Fernando já se persuadira a levar avante o projeto.

— Dê no que der. Não custa tentar ajudar essa pobre infeliz.

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