PORÕES
Paccelli M. Zahler
Foi tudo muito rápido. Prenderam-me em uma sexta-feira, às dezoito horas, no exato momento em que meu candidato saía do Palácio e se dirigia à multidão para testar sua popularidade.
Cinco policiais militares agarraram-me pelos braços, tomaram meu revólver calibre 38, levaram-me para a delegacia e jogaram-me em uma cela escura. Fui interrogado exaustivamente até perder a noção das horas e dos dias. Imediatamente, fui coagido a assinar uma confissão, cujo conteúdo não me foi dado a conhecer. Julgaram-me e condenaram-me por ato subversivo. Em poucas horas, eu já estava confortavelmente instalado na penitenciária, após ter sido apresentado à imprensa.
Dez anos de prisão, dez anos da minha vida entre quatro paredes, com direito a um passeio pelo pátio todas as manhãs e a adorável companhia de Zé Doido, Tonhão Ferradura, Mangueirinha, Chupeta e Papa-anjo.
Nesse ínterim, o eleito procurava realizar frustrados sonhos de infância: passeava de helicóptero, submarino, jet-ski, jogava com a seleção natural de futebol, contra a vontade de sua mamãe e sob os olhares apreensivos do povo que o elegeu.
“Babaca!” Foi assim que me chamaram quando vibrei com a eleição democrática e a ascensão do meu candidato. E foi assim que me senti quando, uma semana depois da posse, minhas economias para a compra de uma casa modesta foram bloqueadas. O jeito foi alugar, porém a imobiliária ficava com mais da metade do meu salário.
Ninguém acreditou em mim. Eu queria simplesmente suicidar-me na frente dele em protesto pelo que ele fizera com a minha vida. Perdi minhas economias suadas, era sugado pela imobiliária, quase fui colocado em disponibilidade no serviço público. O que queriam que eu fizesse, pô? Havia outra saída?
Ensaiei por várias horas minhas últimas palavras: “Presidente, dei-lhe meu voto e a minha confiança. Acabei recebendo em minha cabeça a última bala que Vossa Excelência disse que tinha para disparar”. E não veria mais nada, não sentiria mais nada e o pesadelo acabaria de vez.
Hoje, tenho apenas quatro paredes, uma janela para o mundo e uma imensa vontade de correr pelos campos, sentindo o cheiro do mato e da terra molhada. Resta-me sonhar com um novo tempo enquanto minha vida não se transforma em mais um pesadelo.
Meus cinco companheiros de cela me apelidaram de Marajá. Alguns deles, mais especificamente o Tonhão Ferradura e o Papa-anjo, me olham com desejo.
O Mangueirinha costuma fazer comentários maliciosos: “Esses bacana têm mais é que pená, como nóis! São cheio de fricote e não-me-toque. Mas eu tenho uma solução pra eles...” Acariciando o baixo ventre, completa: “... no apagar das luzes, é claro! Ih, ih, ih!”
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