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Artigos-->12. GERMANO -- 29/08/2001 - 07:54 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Germano é um companheiro muito querido de todos, sempre pronto para atender ao que lhe seja pedido. Vai e vem com muito carinho, desempenhando os deveres e atribuições com gosto, seja por solicitação superior, seja por rogos de espíritos sofredores. Mas está perdendo essa mania, porque adivinhou que não trabalhava por seu engrandecimento espiritual, senão para comprometer os demais para o testemunho de seu valor.



Eis que o mensageiro do amor vai tornando-se arredio, embora jamais se negue a atender. Modificou o sistema e propõe a quem o chama que sejam considerados muitos aspectos relativos aos serviços pleiteados. Tem logrado alguns êxitos junto aos companheiros. Quanto aos mestres, descobriu que só reivindicavam trabalhos em que o mensageiro tiraria total proveito, verdadeiras lições adequadas à mentalidade do serviçal. No que respeita aos espíritos menos perfeitos que assistem na periferia da colônia, tem fracassado constantemente, porque não aceitam assumir sua parcela de responsabilidade na aplicação das diretrizes evangélicas em jogo.



Dou um exemplo deste último caso.



Um dia, houve uma senhora que desejava encontrar o filho perdido no Umbral, em região de muito sofrer. O rebento havia descaído através das drogas e morrera jovem ainda, perturbado por um crime passional. Até aí, nada de mais, uma vez que desses eventos estamos com as agendas cheias. Ocorre, entretanto, que a tal senhora havia rejeitado o filho quando mais necessitava dela. Mulher de posses materiais avantajadas, não se dava conta de que tinha de cuidar do filho, aliás único e muitíssimo protegido até o dia em que conheceu os prazeres da vida desregrada.



Abusando do diálogo, vamos à narrativa, segundo informação do próprio Germano.



- Soube que vocês estão dando proteção a um bando de malfeitores drogados, gente de quinta classe. Será que teria um lugar para o meu filho?



- Que aconteceu a ele?



- Desapareceu de casa muito novo e se entregou ao vício.



- Assim, sem mais nem menos?



- Do jeito que estou contando.



- E como é que ele veio para o lado de cá?



- Uma injustiça. Só porque se engraçou com uma mulher casada, o marido se julgou no direito de atirar nele.



- E onde está ele agora?



- Está na escuridão.



- A irmã já teve oportunidade de vê-lo alguma vez?



- Vi, mas ele não me reconheceu, pois atacou-me, como se eu fosse a causadora da desgraça dele. Eu não mandei que se metesse com a mulher dos outros. Até ia dizer que havia um mandamento nesse sentido, mas não me deu oportunidade de falar. Escorraçou-me de sua presença.



- Como é que a senhora acha que podemos localizá-lo?



- O nome dele é Roberto. O meu é Madalena, como a sofredora do livro sagrado.



- Vejo que a senhora seguiu a religião cristã.



- Com certeza. E dei muita esmola para os padres e freiras. Fui piedosa e caridosa.



- Muito bem! Então está na hora de orarmos uma prece para evocar o nosso irmãozinho. Se fizermos o pedido com muito amor, as vibrações atingirão o seu perispírito.



- É o que eu tenho feito mais, mas ele não me atende.



- Vamos orar juntos. A senhora puxa o pai-nosso e eu me concentro para lhe dar o devido apoio energético.



- Mas eu tenho medo de ser mal interpretada de novo. Vai que ele aparece e me agride, como da outra vez.



- Estou aqui para protegê-la.



- Não dá para me dispensar dessa parte? Eu acho que ia ser bem melhor que você arrumasse uns companheiros e saísse atrás dele. Pode dizer que foi a mãe que se interessou pela salvação de sua alma.



- Mas a senhora quer que a gente faça tudo? O que a senhora vai ficar fazendo enquanto isso?



- Eu fico sentada junto ao muro, me lembrando dos tempos em que tinha de tudo na vida. É o que me dá sustento para continuar existindo. Já pedi para ser levada para junto dos familiares, mas ninguém me ajudou.



- Vá a senhora mesma. Basta pensar firmemente numa pessoa querida, para que ela abra o seu coração e a receba durante o sono. Até se estiver acordada, a senhora poderá sentir que está sendo bem-vinda.



- E você pensa que já não tentei? Uma vez, há muito tempo...



- Quanto tempo?



- Logo depois que cheguei.



- Quem veio primeiro: a senhora ou seu filho?



- Foi ele, mas não estava me esperando, quando chegou a minha vez. Acho que foi porque eu não fiquei doente durante muito tempo. Adoeci, fui operada e não resisti, morrendo dois meses depois.



- Mas a senhora ia dizendo...



- Um dia, estava muito triste e, de repente, me vi perante meu marido. Ele estava em casa. Era a mesma casa mas os móveis eram outros, aliás de muito mau gosto. Quando ia tentar conversar com ele, percebi que as vibrações dele impediam de me aproximar. Aí, fui de cômodo em cômodo, para ver se encontrava alguém conhecido. Havia uma mulher na cozinha, com a cozinheira que era do meu tempo. Ela dava ordens, como se mandasse em alguma coisa. Fiquei enciumada, porque logo vi que era a segunda do meu marido. Nesse momento, entrou uma corja de espíritos malfazejos e eu fui obrigada a me retirar correndo.



- Bem, vamos voltar a falar do Roberto. Por que a senhora tem tanto medo de evocar o espírito dele? Não é verdade que a senhora o ama?



- Não penso em mais ninguém. Ele foi tudo que me restou. Se até o João, o meu marido, me abandonou por aquela sirigaita...



- Mas eu acho que a senhora devia, ao menos, tentar.



- Escute aqui, seu... Como é mesmo seu nome?



- Germano.



- Se existe um serviço altamente especializado que não serve para nada, por que você acha que é que devo entrar nessa gelada?



- Mas...



- O meu filho se encontra drogado completamente. Se vocês não quiserem ajudar o garoto, digam logo que eu vou procurar ajuda noutro lugar.



- Não estou vendo mais ninguém comigo. Por que a senhora coloca os meus companheiros nesse rolo?



- Não queira desconversar. Você vai ou não vai me ajudar a encontrar o Robertinho?



- Vou, sim, mas existe aquela condição de a senhora me ajudar numa simples prece de evocação.



Aí, a D. Madalena se retirou, deixando o colega embasbacado, meditando profundamente se não teria sido melhor ter ido logo atrás do filho, como medida profilática dentro das leis evangélicas do amor, da caridade, da piedade... (E desfilou todos os conceitos das elevadas virtudes que lutava por absorver.)



Era o que julgava mais frágil na nova deliberação de colocar um pouco de resistência ao impulso do auxílio imediato.



Posteriormente, tendo exposto o problema aos colegas, ouviu diferentes considerações a respeito, de molde a configurar a idéia de que toda ajuda é pertinente no plano das realizações socorristas, conquanto nem sempre se atinjam os corações necessitados de compreensão, apoio e carinho. No entanto, inconformado com o fato de ter deixado a mãe escapar, talvez para ir curtir seus sofrimentos em algum canto mais tenebroso, resolveu que deveria saber por quais vicissitudes passava o Robertinho.



Pediu ajuda a três colegas e puseram-se ao encalço do rapaz. Não demorou para que descobrissem que estava internado ali mesmo, num dos hospitais de desintoxicação da colônia, razão pela qual a mãe se encontrava tão próxima.



Agradeceu Germano a atenção da equipe de amigos e foi atrás do pequeno sofredor, julgando que algo havia de estranho, porque, se estava merecendo a atenção dos socorristas, era porque não estava em tão dramática condição cármica, conforme a descrição materna. Estranhou também que a mãe não soubesse que ele tinha sido recolhido, como ainda que ela não estivesse sob o amparo da colônia, por solicitação do filho.



Mas Roberto estava sob sedativo, de modo que teve de conversar com o enfermeiro de plantão.



- Meu caro Germano, o que sabemos é que a mãe escorraçou o filho em vida e depois de morto. Ela está dependente dos efeitos do egoísmo, do orgulho, da vaidade, do amor-próprio, do desejo de se impor aos familiares. Não é uma pessoa rigorosamente má, mas não se condicionaria a aceitar a disciplina desta instituição. Não se perturbe, se considerar a nossa assistência discriminatória. Talvez você demore ainda para compreender que o jovem, apesar de contumaz no uso das drogas, está em melhores condições do que a genitora, que, como você sabe, contribuiu muito para as obras de benemerência da Igreja Católica. Talvez devesse ter olhado mais pelo filho. Agora, se não se inteirar dos próprios defeitos, irá perambular pela erraticidade, sem grandes ânsias de cura, aspirando apenas por volver ao plano material, para o gozo do que julga direito seu, já que lamenta profundamente as quantias do estipêndio oferecido às obras eclesiásticas. Mas não se iluda, pois cada um de nós irá ter de perpassar por todos os crivos da consciência, para depuração espiritual, até que sejamos merecedores da divina ascensão evolutiva.



Germano agradeceu e se ensimesmou por um período bastante longo, deliberando, em seguida, deixar de atender aos rogos dos sofredores de maneira amadorística. Solicitou e foi atendido quanto à descrição psicológica ora em fase final de transmissão. No exame, o que mais o impressionou foi o quanto estava isento dos eflúvios perversos inoculados em seu sistema nervoso por anos a fio de consumo de diferentes tipos de psicotrópicos e alucinógenos. Teria sido efeito dos trabalhos de benemerência, no atendimento indiscriminado de todas as requisições de ajuda?



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