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Artigos-->21. SEXTA PEREGRINAÇÃO ASSISTIDA -- 07/09/2001 - 08:41 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Rodolfo foi o que podemos chamar de bom menino. Tudo fazia de acordo com os pais. Obediente, não desandava jamais a vontade dos mais velhos, transferindo os mesmos sentimentos de respeito aos professores, até a idade dos treze anos. A partir daí, com o nascimento de um irmão, foi sentindo-se, não direi menosprezado, mas um pouco preterido em favor do outro, a quem passou a odiar desde logo. Mas a idade não permitiria muitos vínculos com criatura tão alheia aos conluios gregários, de forma que Rodolfo pôde sentir-se nas mãos dos colegas menos aprumados disciplinarmente.



Contamos histórias verídicas como se fossem imaginárias, tanto se lhe torna factível de descoberta a seqüência natural para o desarme das boas qualidades. Ora, o que havia, de fato, eram procedimentos oriundos da repetição forçada pelo conjunto fez/ganhou, ou melhor, atendeu/foi recompensado. Não se incrustara na consciência o valor dos princípios morais, que eram a casca envernizada, não o substrato sobre o qual se decalcaria a personalidade.



Vão perguntar-me se o roteiro de vida, caso não houvesse caçula nenhum, teria sido diferente. Claro que sim. O que fez o nosso amigo perlustrar outros caminhos foi o fato de se sentir em segundo plano, ele que sempre tivera o privilégio de todas as atenções, mais ainda pelo reforço que outorgava à vaidade dos pais pelo cumprimento de todas as obrigações.



Vão perguntar ainda se não teria sido a meia-volta para o lado da perversidade a maneira deplorável de continuar no centro das atenções, pela mania de se falar dele, mesmo que mal. Claro que sim. Todos esses elementos psicológicos se juntam, se somam, se canalizam para o mesmo fim, qual seja, o de se projetar familiarmente de algum modo, porque esse era o prazer estimulado desde sempre.



Rodolfo, pobre de espírito, se viu nas mãos de quem estava bem melhor preparado para os desvios de conduta provenientes pelos hábitos da rua, de sorte que, o que era natural para os demais, no sentido de saberem exatamente quando e por que parar, se tornou excepcional para o nosso colega, de forma que passou a operar no vermelho da contabilidade cármica.



Teriam os pais percebido o que se passava fora de casa e talvez tivessem agido a tempo de contornar a situação de desastre. Mas aí houve a conjuntura do alheamento dos professores, nem sempre interessados no desenvolvimento da personalidade dos adolescentes, especificamente quando sofrem o temor da ofensa, do desagravo, da armadilha e da pusilanimidade dos covardes, que soem não se apontar como responsáveis pelos maus atos, imergindo nas sombras do desconhecido ou na prepotência sobre a inibição ou timidez dos demais. Passou-se, pois, uma histórica fase escolar em que não se puniam os culpados, ainda que apanhados fossem em flagrante delito.



Quanto a Rodolfo, sobrara-lhe o resquício dos antigos temores de contrariar os mais velhos, de sorte que ocultava todos os malfeitos aos olhos de quem não acusava como os realizadores de sua desgraça. De resto, o episódio do irmão não deve ser colocado na conta de causa única. Talvez tenha sido a mais ostensiva e sobre a qual a consciência mais calcou, para a justificação de toda a vida. No etéreo, o rapaz (desencarnou aos vinte e dois vítima de latrocínio) prosseguiu inculpando os pais (não mais o irmão), até que compreendeu quem era na realidade pela revelação dos antigos pendores psíquicos. O que lamenta ainda é o fato de ter perdido a oportunidade de desfazer alguns entraves morais, pela aplicação generosa das incipientes virtudes, em favor dos parentes e amigos.



Deslanchamos um pouco na apreciação dos eventos carnais porque nos parece esta uma situação muito freqüente, sem que haja, todavia, o mesmo extremismo de reações, acabando a grande maioria por compreender a eventualidade da perda da primazia no coração dos pais, passando a agir em concordância com a realidade, aprendendo que nem tudo na vida deve pretender-se centrado na gente.



Ouvido em estado sonambúlico, esteve muito perto de acertar com os padrões mais corretos do procedimento de captação dos meios de superar os aspectos inferiores de seu triste aparato psíquico. Interessava-nos saber se mantinha algum ódio no coração, pelos sofrimentos supervenientes:



- Você acha que já perdoou o que seus pais realizaram em prejuízo de sua vida?



- Perfeitamente, ainda mais porque a alegria deles pela vinda tardia de meu irmão se deu em complementação à que sentiram quando eu mesmo lhes cheguei. Eu é que não soube compreender o quanto de amor ainda lhes restou no coração para mim, como não soube perceber o quanto sofreram quando descobriram o grande patife em que me transformara.



- Significa que eles o abandonaram, desvelando-se totalmente pelo outro, quando viram você perdido para os vícios?



- De modo algum. Eles se empenharam sinceramente em me ajudar, buscando todos os recursos disponíveis, dentro dos poucos haveres que possuíam, para me darem condições de restabelecimento da saúde mental. Mas não houve medicina que me curasse nem clínica que me atendesse, tanto mergulhei na demência das drogas.



- Quer dizer que não haverá nenhum atrito se vocês se encontrarem?



- Tanto não haverá como não houve, pois nós já nos reunimos por duas vezes, durante o sono deles. Se fossem espíritas (vejam a malícia desse se), iriam pleitear junto à mesa de desobsessão que me apresentasse para poderem prosseguir atuando sobre a minha educação, o que lamentam, sem saber como ressarcir-me da invigilância fatídica, a não ser protegendo o meu irmão, agora com a idade de dezesseis anos e começando a vida de rebeldia própria dessa fase, tal qual ocorre no seio das famílias da classe média.



- Por que você nos chamou a atenção para a condicional? Terá sido para nos dizer que, se os seus pais fossem espíritas, teriam tomado as providências cabíveis na época mais oportuna, evitando o seu descalabro de comportamento?



- Aqui não pretendo levantar o problema dos filhos de espíritas convictos, porque sei que existem de todo tipo, desde aqueles ferrenhos defensores da doutrina sob a autoridade paterna e materna, porque vêem e compreendem os eventos mediúnicos e sabem sopesar os conceitos filosóficos e morais, em confronto com as tarefas de assistência, tendo em vista a necessidade alheia, até quem se ria da ingenuidade dos que vêem nos fenômenos paranormais (notem que modifiquei o nível vocabular) simplesmente a sugestão anímica dos próprios médiuns ou a transmissão telepática dos pensamentos e dos sentimentos dos outros encarnados, tudo dentro apenas da matéria, na qual são incapazes de constatar qualquer mistério.



- Você está expendendo idéias das quais não irá recordar-se quando o chamarmos para a realidade? Está parecendo-nos que são meditações muito próximas dos estudos que levamos a cabo na Escolinha, para serem o resultados das lucubrações inconscientes.



- Têm razão. A hipnose está servindo-me para ser o mais claro possível a respeito de temas sobre os quais venho pensando há algum tempo. Se vocês não atinaram ainda, creio meu dever dizer-lhes que o volume de meus débitos não é demasiado grande. Vou ter de restaurar o princípio cármico, o que se dará apenas por meio de nova encarnação, talvez um pouco menos abonada do ponto de vista social. Mas isso é ilusão minha, não o resultado de profundo exame da realidade psíquica em função das provas a que deverei ser submetido.



- Estamos sentido que você tem o vezo das programações. Terá sido esse o pior conflito íntimo que venha enfrentando, por não haver dado à vida o exato valor quanto aos efeitos de melhoria geral do espírito?



- Sei que estão apenas provocando-me, para saber se percebo que uma resposta direta venha a demonstrar certa inocência ideológica, e uma resposta brusca, o espírito de rebeldia contra as diretrizes metodológicas desta instituição educacional. Não sou muito inteligente, mas temo que, desta vez, descobri as intenções que se acobertavam. Ou não?



- Deseja uma resposta franca?



- Por certo. Digam a verdade e não irão ofender-me.



- Pois estávamos certos de que você seria capaz de responder ao que lhe perguntávamos. O que não sabíamos era se cairia na armadilha para a revelação do sistema impregnado em sua personalidade fundamentado nas desconfianças. Esse foi o defeito maior que descobrimos. A sua atuação na carne, tendo em vista as decepções sofridas, firmou o princípio de que as outras pessoas estão sempre mal intencionadas. Mas, como não temos razão para condenar ninguém, muito menos para recomendar que se atue diretamente sobre o mal que apontamos afoitamente, atenuamos a observação para mera intuição da nossa parte, dado que os elementos que nos serviram de base não podem ser conclusivos. Fique apenas para sua pesquisa interior.



- Em suma, vocês vão recomendar que eu saia em peregrinação assistida, para intentar melhorar ainda mais o meu relacionamento com meus pais?



- Vamos recomendar mais do que isso. Vamos pedir aos mestres que nos ajudem a refletir sobre como abrir a mente de seus parentes para o espiritismo.



- Espero que vocês tenham algum sucesso, porque já tentei esse alvitre e fui rechaçado como pretensioso, apesar da lhanura com que me trataram. Eis o desconfiômetro em ação...



Quando nos reunimos para os debates do caso de Rodolfo, Resildo orientou-nos da seguinte maneira:



- Deixem Rodolfo em paz, que ele precisa auxiliar os demais membros da equipe. A sua situação junto aos parentes é muito cômoda, no momento atual. Não há crise alguma a ser vencida por ele mesmo. Guardem as anotações para passarem aos encarnados, tão comum é essa situação. Não terá grande proveito, tendo em vista que nenhuma solução foi dada. Mas quem sabe encontrarão os leitores algum elemento que possa servir-lhes para enredarem-se nos meandros dos conceitos superiores do espiritismo, examinando com mais sagacidade do que nós os preceitos de aplicação imediata em suas próprias vidas. Não é este um final bastante feliz para mais um capítulo?



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