Mesmice
maria da graça almeida
Tola, deixa-se sentar à mesa de um bar,
onde apenas a suportam ou, fingem que.
As costas doem-lhe, também ombros e cabeça.
À medida que decresce o líquido dos frascos,
cresce no salão, o burburinho dos fracos.
Enquanto as garrafas, no fluidificar
melancólico das almas, rapidamente se esvaziam ,
também ela esvazia-se, constatando a morbidez
da insatisfação, afogada no torpor
inevitável do álcool.
Quando transparente o copo,
já em casa, obriga-se ao ressoar
de um sono etílico, anestésico,
num leito dividido, que, literalmente,
divide, não compartilha.
Amanhecendo, vem-lhe o dia vagabundo,
mesmo desperta, indolente, inda dorme
e de solidão embriaga e consome-se.
Tão-só tem a si como confidente
e nem sempre se faz boa ouvinte.
De suas pretensas verdades,
já conhece os detalhes.
A quietude interior, então, é vasta e só
os ruídos exteriores não mais lhe bastam.
Diminui-se. Faz-se pouca.
Permanece no lugar comum.
Todos rumam para outros lugares,
ela sai de si, para si.
Dialoga consigo um discreto monólogo e
odiando e amando-se, cega, absoluta,
volta-se à mesmice.
As conquistas, ainda que pequenas,
absorvem-lhe o ser todo mortal.
Pressente tênue a fronteira
entre a banalidade e a profundidade,
a vulgaridade e a nobreza.
Aí, perplexa, perpetua-se emudecida
tal qual ilha deserta, casa fechada,
tal qual trilha incerta...
......................................................................
Tola, deixa-se sentar à mesa de um bar,
onde, apenas, suportam-na ou, fingem.
As costas lhe doem, também ombro e cabeça.
À medida que decresce o liquido dos frascos,
cresce no salão, o burburinho dos fracos...
maria da graça almeida
|