NEVE NA FLORESTA.
Ana Zélia
O poeta é o pintor que usa a magia, não das tintas, mas das palavras. Ana Zélia
É Monte Alegre no Pará. Fim de tarde.
Mata densa junto ao cais.
Com a chegada da noite, revoada de garças alvas como a neve, em bando elas pousam para o descanso, vindas de toda parte.
É mais uma noite.
O caboclo adivinho diz:
“– Garças subindo, águas crescendo. Enchente grande, até junho quando haverá a primeira parada”.
Ilhas flutuantes de murumurú ou murerus, a gasolina do futuro descem rio abaixo...
Passageiros pegam carona, são garças, urubus que saboreiam a carniça.
A floresta se fecha alva com tantas garças;
Num contraste urubus negros como a noite, modulam o branco-negro na floresta.
É Monte Alegre! É Amapá! A Serpente Marítima da ENASA.
A boca do mundo. Um Gigante de boca aberta, um caboclo em sua inocência tenta fazer girar um motor na pequena canoa. Dentro dela seus dois filhos.
Ele tenta fazê-lo pegar e se distrai. De repente o perigo iminente.
Gritos de toda parte, tarde demais, a Serpente traga o motor e sua tripulação que passam adernados de um lado ao outro.
Talvez do barco nada reste a não ser o susto, o medo pela imprudência, imperícia de seu condutor.
É o Catamarã AMAPÁ! É Monte Alegre no Pará.
Um acidente!...
Parece ter imã a Serpente. Atrai tudo em sua passagem!
É Yara de certeza, camuflada. A Mãe d’Água chama a si o caboclo desatento.
Incrível! A pequena embarcação bate de frente, ei-los do outro lado. É cômico se não fosse triste!
A solidariedade na pequena cidade se faz ver em segundos. Barcos se deslocam, montarias com remos ágeis, logo chegam ao local e salvam os três. Um pequeno cochilo gravado eternamente na lembrança.
Nunca mais um barco, o prejuízo. Quem sabe pequeno. Mas a lembrança do “impossível” eternamente.
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Monte Alegre, bordo do catamarã “AMAPÁ” da extinta ENASA, em 30.04.1994 (18.45h) Ana Zélia
Nota da autora: A extinta ENASA, tinha quatro catamarãs, dois turísticos (Amazonas e Pará) e três regionais (Rondônia, Roraima e Amapá) na rota Belém-Manaus e vice versa, fiz 99 viagens. Conheci o rio Amazonas. Seus mistérios, sua gente, as Amazonas que vivem, nas margens do Estreito de Breves, que entram e saem dos navios com crianças remando em pequenas montarias (canoas mínimas). A extinção desta Empresa destruiu sonhos dos ribeirinhos que os utilizavam com segurança. E nossos representantes, nada fizeram, nem os do Pará, nem os do Amazonas. Eles não viajam de barco. Manaus, 30.12.2008. Ana Zélia
Um sonho que findou e a Amazônia continua sem navios confiáveis. Acordem, por favor! Ana Zélia
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