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Ensaios-->A LEGÍTIMA LITERATURA DEVE SER VIDA -- 28/06/2000 - 19:54 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos




A LEGITIMA LITERATURA DEVE SER VIDA



É Guimarães Rosa quem nos alerta, na entrevista famosa que concedeu a seu amigo Lorenz, que a 'legítima literatura deve ser vida'. Esta afirmativa vem continuar uma tese presente em grandes escritores e sobretudo a tese que encontramos no clássico texto 'Literatura viva' publicado por José Régio na abertura da revista 'Presença' (1927), órgão oficial do segundo modernismo português.
Segundo o autor de 'Grande Sertão: Veredas', 'nada mais terrível que uma literatura de papel, pois que literatura só pode nascer da vida', e, para nascer da vida, 'ela tem de ser um engajamento do coração'. 'Literatura deve ser vida, insiste Guimarães Rosa, e o escritor deve ser o que ele escreve'.
Cecília Meireles reforça, por sua vez, a tese de Guimarães Rosa quando nos diz em 'O Espírito vitorioso', que 'a literatura nos mostra o homem com uma veracidade que a ciência talvez não tem. Ela é o documento espontâneo da vida em trânsito'.
Fazendo parte da vida em comunidade, o escritor terá a missão de decifrar quais são as coisas iimportantes para tornar 'viva' sua literatura.
Em 'O Grande Sertão: Veredas', Riobaldo, protagonista da narrativa roseana, diz:'Eu só queria decifrar as coisas importantes'. É por isso que o escritor de literatura não é simplesmente um expositor ou um tratadista e muito menos um filósofo. Além de uma matéria prévia que ele seleciona para a escrita, o escritor tem uma maneira própria de tratar esta matéria e também uma linguagem específicamente literária.
Quando se fala em matéria para a criação literária devemos entender que, no espaço infinito da realidade consciencial, o grande sinal será detectado pelo escritor no transbordamento da vida que se lhe oferece na observação. E, consequentemente, a maneira que ele escolher para tratar este transbordamento de vida será a própria forma literária do texto, que será desenvolvida em nível de linguagem conotativa, ficcional e metafórica. Essa linguagem assim caracterizada será a linguagem literária, que se distinguirá dos outros tipos de linguagem pela sua qualidade artística.
Para sermos mais claros ainda, diríamos que a linguagem literária presente em narrativas ficcionais ou na poesia lírica ou dramática e até no texto teatral de nível literário, deve buscar uma forma estética, ou seja, uma maneira de carregar artisticamente a palavra que por sua vez deverá estar intimamente ligada à experiência humana colhida na consciência observacional e emotiva do escritor.
Em rigor, a literatura não poderá nunca prescindir do ângulo subjetivo do escritor. Ela reflete sua análise e sua visão de mundo. Nela existirá, normalmente, por isso mesmo, um certo grau de adesão ou de compromisso. Há quem diga, mesmo que toda a literatura autêntica é comprometida. Esse compromisso encerra a consciência mediática do escritor. Sendo um humano, é a partir da própria condição humana que ele vai construir seu mundo literário. Vivendo ou imaginando um tipo de sociedade, ele tenderá a escrever em torno do homem e de sua circunstância ou em torno de grupos humanos, e não deixará, por isso, de destacar circunstâncias e condições humanas, vivências, idéias e lutas que tenham a ver com a liberdade, a felicidade, o sucesso ou o fracasso dos indivíduos ou da sociedade. A literatura tem a tendência em seus escritores maiores ou laureados de lutar pela libertação do homem seja como indivíduo seja como coletividade. Seu compromisso com ideologias e partidos políticos transitórios não tem a adesão dos teóricos maiores que tentam definir a essência dos objetivos da escrita literária.
As metas da literatura sempre tendem a apontar num sentido mais universal. 'Quando escrevo, repito aquilo que vivi anteriormente. E para essas duas vidas, meu vocabulário não basta.', diz Guimarães. O homem e suas vivências e sua aventura existencial sempre estão no centro da história narrativa. O vocabulário acompanha o desenho da narrativa e deve ser arrumado dentro da cabeça dos personagens numa linguagem apoiada em estruturas frasais e em unidades de sentido. Nesse trabalho técnico colaborará a inteligência e a sensibilidade. Ambas tentarão editar uma visão de mundo em cima de uma realidade que sendo pré-literária ou pré-artística, irá receber o tratamento da aplicação dos cânones estéticos próprios da arte literária.
Para os que tentam entender a arte da palavra literária sempre diremos que nela coexiste uma infinidade de processos aplicativos. Ela tanto processa e programa os dados de um mundo ou de uma consciência, como manipula e ajusta a palavra e o sentido no âmbito da realidade observada pelo escritor.
Como ser-no-mundo('Dasein-in- der-Welt'), o escritor parte da carga existencial e situacional que ele próprio e os outros carregam. Os fenômenos são encontrados na carga vivencial da sociedade e dos indivíduos. O escritor procura depurá-los e elevá-los literariamente a um plano reduzido e abstrato, e ao mesmo tempo tenta preservar o tônus da realidade a fim que a palavra a apresentr de modo a poder ser amada, sentida ou odiada. Aqui aparece a personalidade mais forte ou menos forte de cada escritor pois tudo dependerá de sua capacidade em tornar verossíl a realidade.
Torna-se evidente, por isso, que tanto a situação da realidade que se narra quanto a problematicidade do ser que nela ocorre são a base de toda a estruturação linguística do texto A técnica literária consistirá em o escritor saber inventar seus personagens, ajustá-los à realidade viva que eles representam, e arranjar a linguagem adequada para eles serem devidamente situados na dinâmica interna da ficção narrativa.

João Ferreira
Brasília, 28 de junho de 2000
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