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Ensaios-->OS MEANDROS E AS FRONTEIRAS DA INTERTEXTUALIDADE -- 08/07/2000 - 20:14 (João Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos



Os MEANDROS E AS FRONTEIRAS DA INTERTEXTUALIDADE



Como temática, a intertextualidade é uma questão moderna. Ela ganha espaço quando através de seu intermédio aportamos às relações interliterárias no campo da criação e da leitura. Cita-se a frase de Mallarmé, no século XIX, como chamada de atenção para a importância intertextual: 'mais ou menso todos os livros contêm, medida, a fusão de qualquer repetição'.
Partindo da realidade intertextual, é fundamental dizer que não há obra radicalmente original, pelo simples motivo de que há um elo profundo que une toda a criação e composição literária, seja no aspecto da linguagem, seja no do gênero. Sem a intertextualide seria muito difícil entender uma obra literária. Todo o sentido e estrutura de uma obra literária é explicada a partir de seus arquétipos. Mas os arquétipos são provenientes de vários 'gestos literários' que foram ajudando a codificar as várias formas de uso da linguagem em geral e a da linguagem literária em especial. Através desta codificação arquetípica a literatura entra na contextura de um sistema.E é dentro do sistema literário que a analisamos e compreendemos. Por este motivo, a obra literária, arquitetada dentro de um gênero de linguagem já é concebida dentro de arquétipos e estes dentro do sistema. A gênese da composição literária parte, por isso, de gêneros, que aliás podem ser mais ortodoxos, ou menos ortodoxos, transgressores ou cheios de fidelidade, mas que em qualquer hipótese sempre guardam a relação com o seu genotipo. A relação da obra literária com seus arquétipos e com seus códigos dá a ela o caminho da inteligibilidade e leitura. Mas não é só geneticamente que a obra literária tem em si os termos da intertextualidade. Por dentro, na expansão de seu conteúdo, na elaboração de suas expressões através de narrativa,personagens, estruturas e linguagens, a obra é inteiramente um reflexo dela mesma sob a iluminação de outros textos. Os textos do mundo, os textos e falas dos diversos personagens, a relação com a tipologia dos personagens que nela atuam, são as formas mais concretas que no-la revelam.

Intertextualidade explícita e intertextualidade implícita

Os textos podem se entrelaçar de duas maneiras. De uma maneira direta e explícita, como é o caso em que um autor cita o texto de outro autor incluindo-o num texto de sua autoria e de uma maneira indireta, que pode levar um grau de maior ou menor presença e relação. Intertextualizar é relacionar textos, repetindo ou citando, incluindo, colorindo com base em, parafraseando, comentando, sobrepondo,etc,etc, seja de que maneira for.
A intertextualidade porém nem sempre é fácil de descobrir onde não há formas presenciais abertamente claras. Muitas linguagens literárias são pouco explícitas em sua intertextualidade. Mas há outras masi claras e manifestas.Intertextualidade clara está manifesta no caso do estilo de época renascentista, humanista e clássico, que tinha como código estético básico 'a imitação dos antigos'. Em si mesmo, o convite à imitação era já uma forma de levar o autor a se relacionar intertextualmente em sua composição. Por sua vez, o leitor, ao conferir esse código da imitação, tinha também a seu dispor a origem e a relação do texto primeiro, base da imitação, e a produção do segundo em cima do preceito da imitação.

Asfixia e libertação

Há autores que defenderam existirem épocas históricas que se libertaram do peso da proximidade e da imitação. A questão básica estaria essencialmente em saber se existe na realidade uma progressão dialética das formas ou se alguém ou alguns podem eximir-se desse peso ancestral que recai sobre a genética de nossa cultura. Laurent Jenny põe essa questão no seu texto 'A esttratégia da forma'. Ele aduz a opinião de alguns críticos que debateram a questão. Através da apresentação de dois autores, Harold Bloom e Mac Luhan, Jenny mostra as duas respostas possíveis. Bloom destaca o peso intertextual a partir da genética da obra vista pela ótica da psicologia do autor. A evolução literária se explica através de modelos que vão sendo seguidos, modificados, desenvolvidos. A história se entretece entre precursores e seguidores, entre pontos de origem e criações, entre heranças imaginativas partilhadas. MacLuan, por sua vez, coloca a existência da intertextualidade não na história do sujeito criador mas na evolução da intermídia . Novas tecnologias modificam o quadro intertextual, diz. Há condiçóes para a intertextualidade e naturalmente vestígios formais nascidos da intertetxualidade também.
Dentro de um critério de estudo imanente da obra literária como pretendeu o formalismo russo com Tinianov e o estruturalismo com Júlia Kristeva, não há como cortar o laço que liga a obra ao sistema literário. Mesmo quando o autor pretende transpor esse sistema e filiar-se noutro ou criar o próprio.

As fronteiras da identificação da intertextualidade

A partir de que momento temos os sinais evidentes de que num determinado texto temos a presença de outro texto no sentido de intertextualidade? Há caminhos explícitos e implícitos e isto torna a resposta mais demorada e difícl. Quando se verifica um plágio, uma citação ou um rastreio em cima de um livro, em cima de uma passagem de um texto ou de um personagem, temos vestígios bastante explícitos para falar de intertextualidade. Como agir porém quando nos parece poder adivinhar que um autor com base em reminiscências ou lembranças tênues decalca o texto de um outro autor? Poderemos falar de intertextualidade? Temos na verdade a interterxtualidade expícita, total ou forte, como já aludimos, e a intertextualidade fraca, diluída, pouco explícita. Há semelhanças, correlações, situações ... A organização de um texto literário, mesmo que ele tenha uma linguagem especificamente artística, sempre ele parte de uma informção..É a condição da assimilação e da difusão de outros textos que constitui o âmago da intertextualidade. A intertualidade é normalmente uma fusão, uma assimilação. 'A intertextualidade fala uma língua cujo vocabulário é a soma dos textos existentes'. O intertexto seria portanto 'um texto absorvendo uma multiplicidade de outros textos'. Para melhor entendermos as fronteiras é necessário observar que 'o problema da intertextualidade é fazer caber vários textos num só, sem que se destruam mutuamente e sem que o intertexto se estilhace como totalidade estruturada'.

Exemplos intertextuais

Um autor pode não apenas colher de outros autores mas pode fazer circular, em sua obra, passos e textos da próprias obras. Um dos exemplos clássicos a que se alude quando disto se fala é o de Dante, Poeta maior do Renascimento italiano, que tanto pode ser consderado como leitor e utilizador da própria obra, enquanto se cita a si próprio. como pode ser visto como utilizador e consumidor e leitor das obras da Antiguidade Clássica..
Apresentando alguns exemplos casuais da literatura de língua portruguesa, vemos como nos 'Lusíadas' de Luís de Camões são integrados elementos variados da cultura clássíca e da mitologia greco-latina. São os deuses do Olimpo que circulam na trama da epopeia, é a idéia de catábase presente no capítulo IX no desembarque dos navegadores na Ilha dos Amores.É a história dos reis de Portugal, é o episódio de D. Inês. Tudo são retalhos históricos representativos de um texto inserido em outro texto. Babel e Sião, poema lírico camoneano, é atravessado por uma linha de reminiscència platônica. No soneto 'O amor é um fogo que arde sem se ver' há uma pervasão intertextual de idéias platônicas e aristotélicas que formam a dialética retórica do poema.Nos 'Sonetos' de Antero de Quental, poeta realista português do século XIX, perpasssam as teorias antigas da metempsicose, do nirvana, a teoria do inconsciente, assim como o gênero ' salmo' que é de orighem bíblica, o 'Lacrimae rerum' que é um resquício vindo do 'De rerum Naturae' de Lucrécio, o estoicismo, a tese e a antítese, herança da escola hegeliana, reinante em seu tempo,etc. A epígrafe 'surge et ambula' que precede o texto do soneto 'A um Poeta' é de origem bíblica e faz sentido de intertexto. O poeta brasileiro Gonçalves Dias, praticando a intertextualidade, faz preceder seu famoso poema 'Canto do Exílio' de uma epígrafe com texto de Goethe. Por sua vez, a obra 'O romance da Pedra do Reino' de Ariano Suassuna, é um exemplo de profunda e acabada intertextualidade. Seu autor, entretece o admirável e raro livro com a lenda das Pedras do Reino, lenda tradicional do Nordeste Brasileiro, servindo-se intertextualmente da matéria dos folhetos de cordel para compor sua narrativa, chegando ao ponto de optar pela divisão estrural do libvro em folhetos numerados em vez dos tradicionais capítulos normais de um livro. O poema 'Eros e Psiquê' de Fernando Pessoa é uma recomposição intertextual de uma lenda da mitologia grega. A lenda do lobishomem presente em 'Fogo Morto' de José Lins do Rego é uma forma de tecido intertextual, onde se aproveita, de um lado, a lenda tradiconal importada da Europa para o Brasil, do lobishomem e, de outro, a dinâmica situacional e existencial do personagem José Amaro, que vai dando lugar, através de seus comportamentos aparentes, à imaginação popular, que vai construinmdo um fértil tecido intextextual.
A célebre frase citada por Fernando Pessoa: 'Navegar é preciso.Viver não é preciso', tirada dos antigos, é, mais concretamente uma citação extraída da 'Vida de Pompeu' escrita por Plutarco.É um forte exemplo de intertextualidade.

Originalidade e intertextualidade


A teoria da intertextualidade, além de nos ensinar que entre os humanos a linguagem é circulante e que os conceitos se desdobram em ondas de comunicação temporal e intemporal entre humanos, leva-nos ainda à humilde conclusão de que o verbo que consideramos nosso é de certa forma o verbo de todos, graças à socialização da palavra. E aqui vem, a termo, a distinção feita por Saussure entre língua e fala. Todos os falantes humanos têm naturalmente uma base de partida para elaborar sua comunicação escrita ou falada dentro de um código próprio da comunidade a que pertencem mas é em seu ato singulativo que a palavra toma o sentido da pessoa e da individualidade. Todavia, nunca ninguém deve esquecer, nem sequer os intelectuais, de que no lar, na escola, nos livros, na roda dos amigos, na leitura, na escuta das informações da imprensa ou na Internet, nós estamos apenas no circuito de linguagem que é nossa e dos outros e que o caráter intertextual da expressão e da linguagem nos mostra o patrimônio comum de que participamos nesta grande teia universal do pensamento e da comunicação escrita e falada no seio dos códigos da linguagem.

João Ferreira
Brasília 8 de juklho de 2000
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