Usina de Letras
Usina de Letras
213 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62152 )

Cartas ( 21334)

Contos (13260)

Cordel (10448)

Cronicas (22529)

Discursos (3238)

Ensaios - (10339)

Erótico (13567)

Frases (50554)

Humor (20023)

Infantil (5418)

Infanto Juvenil (4750)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140788)

Redação (3301)

Roteiro de Filme ou Novela (1062)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1958)

Textos Religiosos/Sermões (6177)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Ensaios-->27. DE GENERAL A SOLDADO RASO -- 23/06/2002 - 07:00 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

De manhã, segui o amigo até o bulício do banco. Queria ver como é que as pessoas costumam reagir diante do dinheiro; afinal de contas, na minha derradeira passagem pela Terra, tive de tudo, sem precisar fazer força alguma. Era só manifestar o desejo e lá vinham com o que determinara. Era mais ou menos como ocorre aqui, quando não tenho outro trabalho senão pensar e já está o amigo escrevendo o que me der na vontade.

É claro que não vou abusar dele como abusei dos serviçais a quem obrigava à satisfação até de caprichos tolos, conforme se poderá avaliar da narrativa a seguir.

Era ladino e não consumia muitas energias, mas estive bom tempo nas mãos de médicos ávidos por abocanhar parte da minha fortuna. Não dei importância nenhuma a essas migalhas e fui informando-me do que estava fazendo mal à saúde. Aos poucos, saí dessa influenciação perniciosa, especialmente quando cheguei à adolescência e tive necessidade de me firmar por meio da própria personalidade, para obter da vontade dos outros que se ajeitasse à minha.

Não preciso descrever as emoções dos encontros libertinos que tive, mas é importante que se fixem essas diretrizes de comportamento para entender-se o que se seguiu. Assim, tive muitas aventuras com as mulheres, até que resolvi, por determinação familiar, que deveria casar-me e procriar. Na verdade, estava um tanto cansado das facilidades que encontrava.

Minha esposa foi mulher divina, que soube compreender-me em todos os desejos. Não poderia ter conseguido alguém melhor, só que não me acompanhava nos arremessos de fantasia e me vi, de repente, nos braços de outras, amantes de improviso, que o hábito me forçava a possuir. Eis que minha esposa engravidou seis vezes e teve quatro filhos lindos e duas meninas primorosas.

Nesse meio tempo, as coisas, no meu país, desandaram e precisei fugir, pois a rebeldia da população atingiu toda a minha família, acostumada ao comando político. Não perdi os haveres que possuía no exterior, mas o transtorno absorveu tudo que nos prendia à terra natal.

Sei que esses eventos podem não significar nada para quem agora se debate nas trevas, mas, se não explicar tudo, talvez não venham a perceber o porquê de não ter alcançado nenhuma evolução, tendo permanecido infeliz desde que desencarnei até o momento em que a turma me foi buscar lá no canto em que me debatia.

É que, do exterior, mandei para a minha pátria muitas armas, apetrechos bélicos com que fomentava a rebelião contra-revolucionária. Eu mesmo não atirei em ninguém, mas as balas que adquiri foram responsáveis por inúmeras mortes, até de seres inocentes, crianças e mulheres que se postaram em meio ao trajeto dos balázios, quando não assassinados a sangue-frio pelos agentes de minha família.

Não pretendo revelar minha identidade, para que não haja explorações, pois minha gente até hoje permanece no poder, após o vitorioso revide.

Eu mesmo consegui regressar, afinal, e pude refazer as indústrias e recuperar as terras que se haviam perdido. Mas nunca fui o mesmo. Tomei a revolução como algo feito contra mim, pessoalmente, e aos meus, e não tive sossego até que pude comprovar que os adversários todos tinham sido passados a fio de espada, por assim dizer.

Quando tudo ocorreu, eu era maduro e a minha volta encontrou-me encanecido. Portanto, minha estadia nas terras recuperadas não perdurou por mais de quinze anos, até que, por meios naturais, deixei a vida, pranteado pelos familiares, que temiam ter perdido o pulso forte que os mantinha seguros. Eu expedia as ordens de execução, mas todos se sentiam bem aliviados pelo que lhes representavam de diminuição da pressão psicológica.

Não quero ir mais além. Só preciso dizer que tudo se passou há muito tempo. Hoje, após muito sofrer, estou recebendo esta oportunidade e pretendo aproveitar-me dela, para refazer os compromissos com a verdade. Não me sinto tentado a recompor a vida nas bases em que me vi situado anteriormente, já que não tive força para refugar as más tendências.

Tenho para comigo que, se for reingressar na carne, deverei solicitar oportunidade para refacção dos princípios da humildade que nunca senti. Sei que não deverei regressar tão logo, pois estão acenando-me com a necessidade de obter certos progressos na compreensão dos deveres cármicos e evangélicos. O que me atemoriza é que foi por vaidade que me deixei conduzir para encarne de alto risco.

Por incrível que pareça, em vida anterior, lembro-me de ter sofrido várias injustiças e que me mantive abstraído do desejo de vingança, tendo guardado esse terrível sentimento no fundo da consciência. Quando me vi em condição de revide, aproveitei-me para proporcionar aos desafetos as piores derrotas. Como fui tolo e mesquinho!

Que esta lucidez de agora possa manter-me desperto, pois estou compreendendo estar chegando a hora da recuperação das qualidades e dos valores que deixei esvaírem-se, por não ter tido os devidos cuidados com o poder que se punha à minha disposição.

Podem ficar admirados, mas não senti o passamento de nenhum de meus filhos, tanto que não me interessei por qualquer um mesmo sabendo de seus paradeiros. Fui pai extremoso e muito amei aquelas criaturas; no entanto, floresceu em mim tão forte o egoísmo que me desliguei totalmente de qualquer sentimento de afeição. Até em relação à minha cara esposa, Carmelita, fiquei absolutamente frio e distante. Penso que fará parte da restruturação moral, que deverei empreender, a necessidade de reatar esses laços desfeitos.

Eis aí, em rápidas pinceladas, o quadro geral de minha vida física e moral. Não tenho mérito algum a oferecer em troca dos favores que venho recebendo, no entanto, creio que o muito sofrer em busca da pequena compreensão que alcancei pode falar por minha sinceridade.

Peço, encarecidamente, que creiam em minha promessa de que irei esforçar-me por reaver um pouco do que já possuí e atirei ao monturo das insignificâncias, como se o importante fosse fazer prevalecer minha vontade.

Ousarei até dizer que estive em condições de vitorioso sobre o mal, como alguém que consegue subir em alto e escarpado monte, mas, sem sustentação verdadeira, cai fragorosamente. Temo que as imagens possam sugerir que esteja fazendo cena, para representar-me alguém superior ou com condições de vir a ser. Certamente, existe essa pretensão, pois me está sendo dificílimo esquecer minha preponderância sobre os pobres e infelizes analfabetos de minha terra. No entanto, amigos, peço-lhes que relevem essa tremenda falha de caráter e me deixem passar por alguns testes em sua instituição, já que meu passado fala profundamente contra mim.

Não creio que me tenham trazido até aqui para escarnecerem-se de minha queda, pois noto, em todos, traços de cavalheirismo e nobreza. Portanto, irmãos, procurem compreender-me de verdade, pois esgotei todos os argumentos.

Falta pronunciar suave oração, para tornar tudo bem claro. Pois eu o farei, se me ajudarem a relembrar-me das palavras, já que, incrivelmente, não me ocorreu nunca que a religião pudesse ser a tábua de salvação deste náufrago do egoísmo e da prepotência.

Peço, pelo amor de Deus, que me façam parar de escrever, pois isto está tornando-se verdadeiro castigo para mim, desacostumado a pôr-me de joelhos diante das pessoas.

Sei que houve muitas falhas em meu relato e que cheguei ciente de que iria tornar as coisas muito fáceis com as lorotas que inventei. Mas agora é chegada a hora da encruzilhada, pois estou vendo que o caminha se bifurca e que só poderei obter a ajuda dos companheiros, se eu mesmo me propuser a ajudar-me.

Pois bem, desconsiderem a história e se atenham a saber que manuseei as armas com que abati os inimigos. Saibam que dos seis filhos que tive, todos eram meus antigos adversários que procurei continuar prejudicando em todas as esferas. Minha esposa, desprezei com arrogância, fazendo dela verdadeira escrava. Que mais querem que confesse? Que jamais fui rico e que passei boa parte da vida no cativeiro da prisão, onde me deixei embalar pela imaginação para não ficar louco. Que não faz tanto tempo que rolo pela escuridão, magoado por estar tão infeliz, por saber que os parentes rogam por mim e que não consigo perdoá-los. Pois aí está toda a verdade. Peço desculpas por ter oferecido tanta falsidade. É que vi que poderia estar a escrever e isso me deu a idéia de que a história pudesse comover os socorristas e os leitores. Não me queiram mal por isso e se, de algo do que disse, se puder tirar proveito, que todo este depoimento seja impresso, para que as pessoas não tenham intentos de enganar os que estão aqui só para nos ajudar.

Quando pedi para me afastar da escrita, estava tentando um último arremesso no caminho do erro e da falsidade. Como é fácil de inventar histórias! Como é difícil de iludir os que estão a oferecer esta oportunidade! Graças a Deus, fizeram-me entender a tempo que estava pondo tudo a perder.

Acho que agora sim poderei dizer a prece solicitada, rezando para que meus filhos e minha esposa me perdoem, pois sei que muito os fiz sofrer. Aos demais, a quem devo muito, prometo que irei ressarcir, moeda a moeda, lágrima a lágrima, sangue a sangue, todo o mal que lhes propiciei.

Ponho-me à disposição dos irmãos para o relato de todos os casos que preencheram a minha vida, pois já não me desespero com o fato de estar aqui a expor as minhas misérias.

Devo agradecer e me retirar.

Pois muito agradeço a todos, especialmente ao irmão que teve tanta tolerância para as asneiras que tentei impingir como verdades. A ele, sobretudo, peço perdão; que aceite, pois, a palavra deste infortunado ser de que um dia desejarei regressar para dizer-lhe que minha condição melhorou, conforme a leitura que acompanhei da Revista Espírita, por determinação dos que comigo estiveram desde hoje cedo, em minha caminhada até o banco.

Aceito a reprimenda de que estou sendo repetitivo e cansativo, mas peço vênia para, de novo, dizer que era mentira que fui tão rico. Sinto que me estou confundindo e rogo que me permitam retirar-me.


Comentário

O irmãozinho leitor deve estar atento para os dizeres deste amigo, pois, pareceu-nos, foi bem convincente em suas armadilhas psicológicas. É essa atenção que se deve ter ao estar diante de espíritos que não primam pelas virtudes da humildade, da consideração pelos semelhantes e da boa vontade. Prece bem feita, com a natural tendência ao auxílio, brotada do coração compungido e com o interesse despertado pelo socorrismo, ajudará a manter o tônus elevado da moralidade evangélica, de forma que não há temer os embusteiros e os obsessores. Vamos, isto sim, dar curso ao atendimento, vibrando suavemente em favor desse amigo sofredor, bem como de outros mais que estão ansiando por obter nossa comiseração, pois somos o primeiro sinal de que poderão livrar-se do peso de suas cargas.

Mesmo que a pessoa esteja tomando conhecimento deste trabalho muito tempo depois do instante da transmissão mediúnica, nunca será desperdiçada qualquer vibração que venha a realizar em prol dos infelizes em vias de receber ajuda, para o resgate primeiro de suas carcomidas figuras. Basta que se concentre e ore com devoção, para que se realize algo em favor de alguém, pois haverá quem esteja em condições de canalizar as boas ondas magnéticas em benefício dos irmãos necessitados.

Fiquem, amigos, nas mãos do Senhor!

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui