Estranhos pensamentos que perpassam
Pela mente nutriz do caro amigo
Ganham formas, aos poucos, se comigo
Vier saber como é que os sons se espaçam.
Eu vou formando os versos que consigo,
Esperando que alguns por si se façam.
Muitos, pelo improviso, se rechaçam,
Que a falta de sentido é um perigo.
No fim, resta o consolo de se ter
Uma poesia feita a duas mãos,
Pois ambos vêm cumprir o seu dever.
Aí, nós nos chamamos por irmãos
E aumentamos o nosso bem-querer,
P’ra confirmar que os sonhos não são vãos.
Não vamos perturbar quem sofre tanto,
Ouvindo repetir o mesmo canto,
Dia após dia, junto a esta mesa.
Mas precisamos dar um jeito nisso,
Para cumprir o forte compromisso
De adquirir do bem pura certeza.
Como fazer sem lhe ditar os versos,
Rezando p’ra não serem tão perversos,
De molde a dar prazer em harmonia?!
Assim, agüente um pouco mais na lida,
Sabendo, de antemão, qual a saída,
Enquanto a rima certa não se cria.
A tal saída é ter mais paciência,
Conhecimento prático, ciência
E abertura correta para a mente.
Vai tilintar o verso como um sino
Cujo repique tem um só destino:
Despertar para o amor que está dormente.
Aí, em borbotões, todas as rimas
Comovem corações, geram estimas
E os versos vigorosos dão prazer.
Kardec irá trazer sua doutrina.;
Jesus a lei do amor, de novo, ensina
E a trova, enfim, alcança o seu poder.
Como é possível ser tão devotado,
Quando se fica posto ali de lado,
Somente a repetir o que se ouviu?
Perseverança alia o alto dom
De conservar alegre a alma com
A fé de que o dever já se cumpriu.
Desconfiado, o médium mais se encolhe,
Porque a nossa rima não escolhe
E tem de registrar inconsistências.
Ao dar de ombros, pensa lá consigo
Que quem se arrisca a enfrentar perigo
Há de saber quais são as conseqüências.
E bate as teclas, sem perversidade,
Ao ver que a sua praia a turma invade,
Gerando estrofes sem qualquer pudor,
Deixando sempre um rastro de perfume,
Que é como o sentimento se resume,
Quando fica no ar o nosso amor.
Ao perceber que a rima se enobrece,
Oferece ao Senhor a sua prece,
Agradecido pela distinção.
E pede mais ao povo que o distingue,
Para que o verso não feneça ou míngüe,
Dando ao que lê do Reino a direção.
Nós traduzimos, sim, o sentimento
Que os nossos médiuns têm, neste momento
Em que lhes transmitimos a poesia.
Mas o prazer que têm surge depois,
Já que o trabalho, quando feito a dois,
Coloca esse encarnado numa “fria”.
E mais ainda quando nós falamos
Que eles são, tão simplesmente, os ramos
Dos quais colhemos frutos sazonados.
Os coitadinhos não conseguem dar
Um único suspiro devagar,
Pois, em seguida, são solicitados.
E são capazes de ficar contentes,
Apenas por lhes darmos uns presentes
Em forma de trabalhos e de dores,
Pois versejar debaixo de chibata,
De forma séria ou pobre e caricata,
Vai parecer-lhes nobres resplendores.
Resta saber de quem nos leu somente
Se o mesmo sentimento está presente,
Pela oferta de paz deste poema,
Ou se despreza tudo por pequeno,
Querendo o amor universal e pleno
Do gênio que verseja sem problema.
Não vou incentivar o compromisso
De me prestar o amigo bom serviço,
Pondo-se aberto para a rima etérea.
A nós nos basta a prece comovida
Que há de rezar, contrito, na saída,
Depois de perceber que a trova é séria.
O médium há de dar-me o seu perdão,
Porquanto já me deu a sua mão,
Para marcar os versos da poesia.
O dia reservou-se p’ra oficina,
Mas não ficou de lado a sã doutrina,
Que de outra forma o “mestre” não faria.
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