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Ensaios-->5. O MENDIGO ATRAPALHADO -- 12/02/2004 - 08:11 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Era uma vez um mendigo. Percorria ele as ruas da cidade em busca de alimentos e agasalhos para aliviar a sua fome e dissipar o frio que perpassava pela epiderme e ia alojar-se no cerne mesmo de seu organismo. E pouco conseguia, pois, sempre que recebia algo de alguém, virava o rosto de lado e amaldiçoava a própria sorte, jogando seu infortúnio à conta da maior ou menor opulência daquele que lhe estendia a mão. E essa atitude inquietava as pessoas, que julgavam estar sendo acusadas de malversação da oportunidade de vida que Deus lhes dera. E assim as portas iam fechando-se, até que, um dia, por mais que estendesse a mão súplice, não conseguiu obter qualquer esmola que lhe aliviasse as necessidades.

Como casa, vivia em modestíssimo barraco, em companhia de cão pulguento, que, mais feliz do que ele, sempre recebia sobras de comida e palavras de carinho, pois nunca se recusava a abanar o rabo agradecido a quem lhe oferecesse alimento. Houve um dia em que alguém intentou prendê-lo para ministrar-lhe banho revigorador e remédio salutar, mas, em sua ignorância, suspeitou de algo insólito e fugiu, indo refugiar-se junto àquele que lhe dera acolhimento há bastante tempo atrás. É bem verdade que, às vezes, o mau humor do patrão favorecia-lhe alguns safanões e xingos, mas, no geral, a convivência era pacífica e a amizade frutificava em recíproca assistência.

Naquele dia, entretanto, as coisas não andaram bem para o pobre cão, que se viu em palpos de aranha diante da dura necessidade por que passava o seu dono. Assim que chegou com vistoso osso por entre os dentes, foi logo recebido a pontapés e torpes expressões de desagrado. Fustigado e acuado no canto mais escuro do barraco, viu-se magoado e atormentado pela necessidade de defender-se dos injustos ataques de que era alvo. Em dado momento, investiu contra o patrão e sapecou-lhe forte dentada, a extrair de sob a pele espesso jato de sangue. Livre da apertura, ganhou mundo, desaparecendo na primeira esquina.

O mendigo lá ficou a arquejar de raiva, acrescida pelo sofrimento pungente de lancinante dor produzida pelo ferimento da mordida. Atou como pôde a perna e saiu em desespero à procura de ajuda. Conhecido nas vizinhanças por suas atitudes de antipatia, não conseguiu de imediato chamar a atenção das pessoas, que cerravam suas portas e seus corações aos pedidos insistentes que fazia.

Nesse momento de profunda angústia, lembrou-se de Deus:

— Senhor, disse ele, atende a este pobre sofredor. Sei que não tenho sido bom e fiel servidor de tua religião, pois só alcanço ficar no máximo à porta de tuas igrejas. Sei que não tenho trabalhado para poder dizer que ganho o pão com o suor de meu rosto. Mas, Senhor, por outro lado, não tenho feito mal a ninguém, pois não roubo, não lanço maldição, não apregôo os males que os outros fazem, não desejo a mulher do próximo. Minha vida, Senhor, sabes melhor que eu qual tem sido. Dá-me agora a possibilidade de encontrar alívio para minhas dores. Abre o coração a algum desses míseros mortais que estão a testemunhar o quanto de maldade existe em suas mentes, pois incapazes são de oferecer a esta pobre criatura ceitil de atenção e socorro...

E ia por aí quando se fez visível a ele grado senhor, de grossos óculos, carregando pesada maleta. Era médico, naturalmente, imaginou logo o nosso amigo, agradecendo antecipadamente ao Senhor o atendimento a seu pedido, vangloriando-se intimamente por ter tornado a sua palavra convincente a ponto de comover a Divindade a imediatamente atendê-lo.

Deveras, o senhor circunspecto, assim que percebeu que o mendigo carecia de assistência, prontamente ajoelhou-se ao seu pé para pensar-lhe a ferida. Contudo, a sua arguta observação, fruto de longa experiência, desde logo revelou-lhe que o nosso amigo precisava de outros cuidados além de simples ataduras. Imediatamente, convenceu-o a aguardar um instante, enquanto ia providenciar ajuda especializada. Por sorte, encontrou ambulância disponível no hospital em que atendia, para onde ligara de telefone público, de modo que, em breve, estava o mendigo devidamente instalado em enfermaria hospitalar destinada ao tratamento de indigentes. Nem precisaríamos dizer que a sorte de nosso irmão foi ter sido encontrado por médico de convicção espírita e que o nosocômio era instituição amparada por centro espírita kardecista.

Após minuciosos exames, embora fossem ministrados todos os medicamentos que a mais moderna farmacologia pudesse oferecer, foi necessário amputar a perna ao infeliz, contaminada que estava por antiga erisipela que degenerara em maligno tumor. Ainda que a operação tivesse sido realizada com absoluto sucesso, não se garantia sobrevida muito prolongada ao paciente.

De tudo isto, precisava o facultativo dar a conhecer ao enfermo, pois que nenhum parente ou amigo foi possível localizar, para que se pudesse dar assistência ao infeliz. Resignou-se, então, o doutor a informar ao interessado as suas condições de saúde.

Naquele momento, cresceu estranho rubor no rosto do indigitado. Afogueado, revoltou-se contra o médico, acusando-o de negligência, responsabilizando-o por tudo quanto pudesse vir a suceder-lhe, pois era incapaz de ver que fora culpado da aquisição e do desenvolvimento da doença. Execrou o cão malvado que o havia feito encontrar-se com o médico. Voltou-se finalmente contra Deus, por tê-lo atendido tão prontamente mediante a sorrateira prece que lhe encaminhara. Não contente com todo o espalhafato que fazia, amaldiçoou até as irmãs que lhe haviam oferecido as muletas com que conseguia locomover-se pelos corredores do hospital. E de lá partiu, vociferando contra o mundo.

Na porta, esperava-o, fiel e constante, o seu cão. Ao passar por ele, alcançou-o com tremendo golpe de muleta, arremessando-o de encontro à parede, ferindo-o seriamente. No entanto, capaz de reação, o pobre cachorro reuniu forças para escapar a nova investida e, ganindo de dor, desapareceu na cidade, não voltando jamais a encontrar seu incompreensível patrão.

O nosso amigo ainda viveu durante certo tempo, assistido agora pela caridosa irmandade do centro espírita, onde ia buscar alimentos e conforto material de todo tipo, não aceitando jamais qualquer palavra que pudesse despertá-lo para a divina misericórdia.

Morreu numa tarde de maio, execrando a vida e argüindo fortemente a onipotência de Deus.



Ei-lo do nosso lado, lépido, indo e vindo com desenvoltura, pleno de felicidade. Que teria ocorrido a tão injusta criatura? Que poder de regeneração teria feito crescer-lhe espiritualmente a perna que lhe faltava ao chegar? Quanto tempo decorrera desde seu passamento? Que provações teriam sido designadas pela Divindade para fazê-lo contornar os feios defeitos de caráter que trouxera do encarne?

Eis as perguntas a que deveríamos responder agora para matar a curiosidade ao nosso interessado e amável leitor. Mas tais respostas são muito simples e fáceis de imaginar. Interessa-nos muito mais sugerir que perlustre a história do mendigo e compare-a à sua própria. Veja se você não tem desprezado os que lhe oferecem a ajuda que o livra de suas vicissitudes. Examine o seu coração, para verificar se não mora lá no fundinho a inveja, a concupiscência, a malandragem embutida e disfarçada em humildade. Note se você não tem vilipendiado a amizade daqueles que, embora maltratados por sua falta de caridade e consideração, ainda assim insistem em prosseguir em sua companhia, por verem em sua figura a amizade que frutificou um dia e que poderá oferecer o resguardo de útil convivência amanhã. Pense seriamente se não está chegando a hora de as portas se fecharem à sua passagem pelo seu inconformismo e má vontade. Analise as reações dos que, mais próximos, convivem sob o mesmo teto e observe se não estão a ponto de saltarem sobre você para, sob desmedida pressão, abocanharem o seu calcanhar. Faça as suas preces passarem pelo escrutínio de seus sentimentos e cuide de perceber se não estão exprimindo a vanglória do insano poder sobre Deus. Coloque a sua saúde espiritual sob os cuidados de seus protetores e aceite pacientemente o diagnóstico de seu estado, capacitando-se a atribuir seus defeitos e males a si mesmo, a suas atitudes contrárias às sacratíssimas leis de Deus. Interne-se em hospital de restabelecimento moral, para reorganizar os seus objetivos de vida, e preencha o vazio de suas realizações através do muito de amor e de dedicação que terá de demonstrar relativamente a todos os seus semelhantes. Trate-se através dos rígidos medicamentos evangélicos, mas faça-o o quanto antes, para não ter de passar pela desagradável experiência de ver amputada sua perna e de receber a desastrada notícia de que sua vida está perdida.

Acate as nossas palavras de advertência e saiba reconhecer nelas o aviso que lhe daria o seu próprio anjo da guarda, se lhe fosse possível vir pessoalmente à sua presença. Saiba defender-se contra os males do mundo para não ter de arrepender-se magoadamente por causa de sua imprevidência e desatenção. Ore com carinhoso afeto, agradecendo as luzes que tem recebido, não importando se a origem delas tiver sido pacífica, como a brandura de sábia palavra amiga, ou ríspida, como a atroz notícia de próximo desencarne em dor e sofrimento. Saiba aceitar a vida como ela se apresente e jamais renegue as oportunidades de crescimento moral e espiritual.

Fique, caro irmãozinho, na paz do Senhor, hoje e sempre!



Comentário

Nosso texto foi inspirado na passagem dos Evangelhos em que Jesus determina ao paralítico que volte para casa, após tê-lo atendido (Mateus, 9:6; Marcos, 2:11; Lucas, 5:24; João, 5:8.).

A figura do mendicante é sempre comovedora, enternecedora, quando pacificamente aceita a sua condição, embora almeje sair dela por algum milagre de regeneração moral e física.

Quando a pessoa se encontra enovelada na vida por forte pressão econômica e não encontra meios de superação de suas dificuldades, vendo-se na contingência de estender a mão aos passantes e se sente envergonhada por ter de fazê-lo, sabendo que o fato deverá ser temporário, aí é fácil de distinguir-se aquele indivíduo que merece ser guindado a melhores condições, assim que possível. Todavia, quando o pedinte faz de sua circunstância de vida algo definitivo, espojando-se na maldade, para fazer ressaltar aos outros a sua inépcia e desconsideração pelo sofrimento do irmão, então, não terá voltados para si os benignos olhos do Senhor, que, pacientemente, aguardará que a luz se lhe faça na consciência pejada de vícios.

Em ambos os casos, no entanto, como nos ensina claramente a lição contida na mensagem, devemos auxiliar o necessitado, mesmo quando se recusa a receber a nossa ajuda, mesmo quando selecione o que julgue o melhor para si mesmo. Em todo caso, devem-se-lhe dar todas as oportunidades de progresso. Quem tiver olhos para enxergar, verá em nossa atitude a mão de Deus, que, por nosso intermédio, mantém acesa a luz da fé e da esperança. É por isso que se diz que, também para os necessitados, “fora da caridade não existe salvação”.


Palavras do irmão João, como reforço doutrinário moral à pregação da equipe em forma alegórica. Fiquemos todos nas mãos de Deus, para sermos dignos de receber-lhe as infinitas graças!

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