CULTIVAR NOSSA FÉ
Orai e vigiai! Isso o que Cristo disse a Pedro quando no monte das oliveiras. Todos os dias temos desafios a enfrentar, problemas a solucionar e inimigos a combater. Quando nos propomos a lutar ao lado do bem, todo o inferno sai em nosso encalço, tentando fazer com que desistamos do propósito maior, cultivar nossa fé.
A tradução da palavra fé tem sido feita de uma forma equivocada. Fé, no mundo ocidental, tem correspondido à crença, a crer. Mas, é possível crer em algo sem se entregar a este algo. Crer é ter consciência da existência de alguma coisa. Ela existe e a pessoa que crê tem consciência da existência deste algo. Mas, a verdadeira tradução de fé, consoante os ensinamentos do filósofo e teólogo Huberto Rohden é “fidelidade”. Nas palavras de Rohden: “A nossa palavra “fé” vem do termo “fides”, radical de fidelidade. Fé é, pois, uma atitude de fidelidade, harmonia, sintonia.”
Continuando, assim conclui Rohden: “Infelizmente, o substantivo latino “fides” não tem verbo, e como fé é derivado de “fides”, também em português, como em qualquer outra língua neolatina, não existe verbo derivado da palavra fé. E temos de empregar um verbo de outro radical. Do latim credere fizemos crer, crença.”
Desta forma, a palavra fé tem uma acepção bem maior do que apenas crer, no sentido de se ter consciência de algo. Ter fé é ter fidelidade a algo, acreditar no poder e na presença de algo. Isso é ter fé em Deus. Crer em Deus é fácil, mas, ter fidelidade a Ele, eis o desafio que se coloca a todos. Ser fiel a Deus é acreditar plenamente em seus desígnios, em seus propósitos. É não se atormentar diante das adversidades do mundo, na certeza de que Deus está no leme desta grande embarcação que é nossa existência. Ele e somente Ele sabe o que precisamos para desenvolver nossa espiritualidade.
Não devemos dramatizar sofrimento ou provação, problemas e dificuldades, posto que, se o sofrimento fosse algo tão ruim ou inútil, os evangelhos não estariam repletos deles. Somente quando sofremos nos distanciamos do mundo e nos achegamos à presença de Deus. Pedi a Deus que retirasse de mim todo o sofrimento, e Deus disse: “não”, pois o sofrimento lhe retira do mundo e o traz para perto de mim. Cultivar nossa fé, orando, fazendo algo pelo mundo e por nós mesmos. Cultivar nossa fé, para no fim da jornada compreender que outra vai começar. E assim tem sido a vida de todos: uma jornada atrás da outra, rumo à evolução suprema. Quando percebermos que somente quando nos afastamos do mundo nos aproximamos de Deus, e que, somente quando agradamos e Ele e não ao mundo, estamos nos aproximando cada vez mais da espiritualidade, aí então teremos compreendido uma das maiores lições da existencialidade humana.
Sempre evitei a fama, pois, ela é traidora. A fama nos faz ser aceitos pelo mundo, dentro dos padrões hipócritas estabelecidos pela sociedade. A fama faz com que sigamos os mesmos preconceitos e pré-julgamentos que todos os dias tanto mal nos faz. Ser aceito pelo mundo é algo perigoso, pois, corremos o risco de estarmos quedando no abismo da devassidão, da solidão, da falsidade, do vazio, da hipocrisia. Se fiz alguma coisa de bom até hoje em minha vida, creditem este crédito a Deus, que me proporcionou os instrumentos para que esta pequena parcela de bem fosse feita. Somente a Ele estes créditos devem ser endereçados, pois, por mim, nada posso fazer. Somente o sopro de vida vindo Dele faz com que minha alma se insufle de coragem e desprendimento, compreendendo a verdadeira finalidade para a qual fui criado.
RODRIGO MENDES DELGADO
ADVOGADO E ESCRITOR
27.02.2005
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