Diário de um pseudônimo (072)(2005/04/30)
Penfield Espinosa
30/04/2005
You saw the whole of the moon.
The Waterboys
Li recentemente um romance policial americano bem legal, de Charles Elmwood.
Para reforçar a conexão entre psicanálise e livros policiais, chutada aqui antes, o livro usa uma importante metáfora para psicanálise, para artes: o espelh.
Simplificando bastante, um policial inteligente e violento e com problemas sexuais, tenta decodificar e combater os atos de um bandido... inteligente, violento e com problemas sexuais.
O policial talvez tivesse mais problemas do que o bandido, mas eles não são tão bem explicitados neste livro, talvez em um livro anterior, já que este faz parte de uma série.
Isso nos leva a aumentar a similaridade entre policial e bandido.
Grosso modo ela é assim: tanto policial quanto bandido são obcecados por mulheres. O policial por sua esposa e o bandido por sua namorada. Além disso, ambos são capazes de gestos ousados e inteligentes.
A diferença fundamental é a questão da cegueira. O bandido não via que sua namorada, uma bela junkie, viciada em coca, fazia tudo por pó; principalmente sexo, o que ele ciumento, não queria ver. E ela menos o ama do que se sente intimidada e protegida por ele.
O policial ainda é amado por sua esposa, que no entanto prefere evitar a vida difícil com um policial tão complicado e próximo da loucura. Então se amazia com outro homem. Que também é policial...
O bandido, que tinha vida honesta e abstêmia de mecânico de carros esporte caros, é levado ao crime por colegas que colocam droga muito forte em seu café. Durante o delíro, ele atropela e mata duas pessoas.
O policial já começou complicado, envolvido com drogas, bebedeira e orgias. Faz tudo que pode para se aproximar da família. O que inclui tocaiar, no colégio, as filhas, de quem (por decisão judicial) deveria se manter distante. Também invade o apartamento de sua ex-esposa.
O bandido faz algo de tão ousado quanto para garantir uma vida melhor para si e sua namorada: assalta bancos, robua carros e recepta armas roubadas.
Ambos são racistas.
Em síntese, o que separa os dois é a falta de visão e o senso de medida: apesar de visarem com garra, tenacidade e inteligência uma mulher difícil, o bandido nem sabe que sua amada não o ama, ao passo que o policial sabe muito bem que é amado.
Outro ponto é que o bandido é egoísta, o que também é uma forma de cegueira. E o policial é generoso e trama para salvar o bandido menos importante.
Outro ponto especular é a trajetória perversa dos dois: o bandido sai de situação de honestidade para bandidagem cada vez maior e mais autodestrutiva, e o policial sai de passado condenável para uma aceitação e poder cada vez maiores. por exemplo, derruba seu poderoso inimigo na polícia.
Algo de filho pródigo aqui ?
São Paulo, 30 de abril de 2005
(Copyright © 2005-2009 Penfield da Costa Espinosa)
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