A minha mão colheu algumas flores
Que dei à doce amada, pela vida,
Porém, não foi um roseiral de amores,
Pois sofri tanto pela rude lida,
Mistério que entendi depois de horrores
De sofrimentos d’alma combalida,
Porque não respeitei os semelhantes,
Tendo voltado aqui pior que antes.
Agora, já me arrisco a vir contar
O que tramei, na Terra, o tempo todo,
As flores que colhi deram lugar
A espinhos que espalhei ali, a rodo,
E todo o mal que fiz foi devagar,
Passando para os outros tal denodo,
Que fizeram herói quem escorchava:
Por cima, a cinza quieta esconde a lava.
Era meu sócio um ser pobre e mesquinho,
Que incentivava o luxo, em grandes festas.
Queria persuadir-me que o caminho
Passava, obrigatório, nas florestas
Dos crimes contra o erário do vizinho,
Mas tais ações aqui são indigestas,
De sorte que o rapaz não tem sossego,
Porque conserva ao ouro forte apego.
Nem tudo está perdido p’ro coitado,
Porque lhe tenho afeto, mesmo assim.
Eu julgo estar, agora, noutro estado,
Porque já percebeu quanto ruim
Foi o procedimento desse lado,
Que lhe acabou causando o triste fim:
Apela p’ro Senhor tenha piedade
E pensa só fazer o que lhe agrade.
Eu mesmo conquistei o meu direito
De vir curtir a dor nesta “Escolinha”,
Depois de compreender que é com respeito
Aos outros quanta paz n’alma se aninha,
Tendo assinado o compromisso: — “Aceito
Permanecer no estudo, em dura linha,
Até que se supere todo o mal,
Seguindo da Doutrina esse ideal.”
Eu rezo aqui por ele, todo dia,
A ver se lhe transmito a minha paz.
Se lá pudesse ir, eu bem iria,
Para reconfortar o meu rapaz,
Mas não posso exercer filantropia,
Pois controlar o mal não sou capaz:
As vibrações que emito donde estou
Não mostram realmente quem eu sou.
Faço a poesia, sim, com sacrifício,
Mas levo para a luz, com muito agrado.
Eu sei que vão dizer: — “Mas que estrupício.;
Ao menos, cá viesse melhorado.”
Mas quero surpreendê-los nesse vício
De tudo desgostar, se o tal recado
Aponta p’ro mistério e diz: — “Querido,
Dizes que estás tão bem, mas eu duvido!”
Preciso agradecer agora ao moço,
Que veio tão em dores(1) para o verso.
Queria a boa fruta sem caroço,
Mas o meu tema esteve mui diverso,
De sorte que o poema é leve esboço,
Puxando fortemente p’ro perverso.
Enquanto a rima extraio a marretada,
Eu sinto que a poesia é quase nada.
A turma que faz versos lhe promete
Unir-se em preces, a partir de agora.
Ainda “pintaremos nosso sete”,
Que a lei do amor no etéreo mais vigora.
Em sendo assim, espero que não vete
A rude rima, à vista da demora.
Aos poucos, todos vamos para o Alto
À custa de um ou outro sobressalto.
Se, acaso, o nosso amigo piorar,
Que o corpo do encarnado está p’ra isso,
Não queira vir ao posto trabalhar,
Porque aceitou um dia o compromisso.
Alguém há de ocupar o seu lugar,
Pois não dá conta um só deste serviço.
Eleve os pensamentos a Jesus,
P’ra receber em bênçãos doce luz.
(1) Sofria este médium um ataque de embolia pulmonar. O texto seguinte, “Reacendendo as esperanças”, me foi ditado na UTI do Hospital de Santa Bárbara d’Oeste.
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