No início dos anos 1980 fui trabalhar no Governo do Distrito Federal. Meu primeiro emprego público. Naquela época havia ônibus que buscavam os servidores no percurso residência-trabalho e vice-versa, inclusive para almoçarmos.
No início dos anos 1990 vim trabalhar no Senado Federal e aqui também havia ônibus que levava e buscava os funcionários. Certa vez procurei o responsável pela frota para buscar as crianças de uma escola da periferia para conhecer o Senado. O colega negou o pedido me mostrando o ônibus que na semana anterior havia sido apedrejado naquela comunidade. Naquela época aqueles ônibus começavam a ser vistos como agressão à moralidade pública. A sociedade não nos perdoou e taxou aqueles ônibus de mordomia, desperdício de dinheiro público, tratamento diferenciado em relação aos demais trabalhadores etc.
Os administradores públicos não tiveram argumentos para sustentar a continuidade dos serviços. Então o Governo resolveu nos pagar auxílio alimentação e escolas para nossos filhos. Levar de ônibus é imoral. Dar o dinheiro não é. Não conseguiram mostrar para a sociedade que os ônibus faziam com que os servidores não chegassem atrasados ao serviço nem que a frota contribuía para a proteção ao meio ambiente. Senão, vejamos: um ônibus leva 40 pessoas e apenas ele polui o meio ambiente. Com o fim das linhas aqueles servidores tiraram seus carros da garagem. Agora são 40 carros poluindo o meio ambiente e aumentando os engarrafamentos.
Na época dourada dos ônibus, durante o trajeto, conversávamos com os colegas, sabíamos os nomes de todos eles e onde moravam; comemorávamos aniversários; os colegas se aproximavam entre si. Rolava até paqueras.
Depois de tantos anos aqueles ônibus estão de volta. Esta semana o jornal local de Brasília (DFTV) mostrou o crescimento vertiginoso no ramo de aluguel de ônibus e vans. A reportagem mostrou algumas empresas públicas e privadas alugando coletivos para seus funcionários. Uma das passageiras apoiou a ideia porque ela não chegaria atrasada ao trabalho, não enfrentaria engarrafamento e interagia com os colegas de trabalho.
A razão para a volta desses ônibus, infelizmente, ainda, não é a preocupação com o meio ambiente. É por causa da incompetência dos governantes que não investiram em transportes públicos. Como os administradores das empresas estão de olho nos atrasos constantes dos funcionários que ficam presos no trânsito, a fadiga com que chegam ao trabalho e, claro, as implicâncias negativas na produtividade, o ônibus deixou de ser imoral.