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Contos-->1. A VISÃO DESEJADA -- 15/03/2003 - 07:47 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Largos anos de espiritismo deram a Edmundo o conhecimento dos fenômenos e a explicação deles. Mas ele mesmo não transcendia os limites da matéria, invejando os médiuns que afirmavam ver este ou aquele ser iluminado ou resplandecente, cheios todos de felicidade.

No íntimo, Edmundo sabia que exigir dos amigos da espiritualidade poderia ser contraproducente, porque a visão acabaria frustrando-o, dado ser bem capaz de suceder que se deparasse diante de algum fantasma abominável das profundezas das trevas, como tantas vezes lera nas obras psicografadas.

Contudo, sempre lhe ficavam as esperanças da abertura de um desvão existencial para a esfera das entidades superiores, chamamento irrecusável do protetor Augusto, cujas palavras de conforto e de orientação jamais lhe foram negadas, durante as alegres sessões de estudos, nas oportunidades abertas ao contato com os guias pessoais e da casa.

Na manhã daquele dia, Edmundo levantou-se alegre e bem-disposto, cheio de esperança de obter sucesso em todos os empreendimentos materiais e espirituais: algo lhe dava a certeza de que todos os objetivos de vida estavam prestes a serem realizados.

No trabalho, em sua querida oficina de alfaiate, registrou mais três encomendas, todas para a cerimônia religiosa da mesma festa de casamento. Não se sentia constrangido por suas roupas desfilarem em templo bastante diferente do que freqüentava. Julgava-se importante profissional, bem conceituado na cidade, sempre pronto para o corte fácil, a costura ligeira, o acabamento perfeito.

Cantarolava como de hábito, quando percebeu que mui gentil cavalheiro o observava, curioso e atento, enquanto escolhia os aviamentos de que necessitava para a próxima peça. Reparou no fino corte do antigo fraque em que se metia o visitante, surpreendendo-se com que alguém pudesse assomar-lhe à porta em trajo tão digno e formal.

— Perdão, senhor, em que posso ajudá-lo?

— Venho eu em seu auxílio.

— Por Deus, como um pobre alfaiate reúne merecimento para abalar tão ilustre criatura?

— Todos somos filhos de Deus.

— É verdade. Também é verdade que o corte de seu trajo é soberbo. No entanto, levo vida estável e alegre, na companhia da cara esposa, dos filhos e dos amigos. Que me falta com que não atino?

— Falta-lhe ver a realidade espiritual, conforme tem constantemente solicitado a seu protetor Augusto, aliás, este amigo que lhe fala.

Edmundo sentiu faltar-lhe o chão. Sentou-se meio aturdido. Não acreditava que estivesse perante um espírito desencarnado tão cheio de saúde, cor e encanto. Mesmo assim, arriscou uma observação:

— Este servidor espírita demoveu, afinal, uma entidade de grande poder e sabedoria. De que me servirá, contudo, a sua presença em meu “atelier” de trabalho, se não existe mais ninguém que possa comprovar o fenômeno da aparição nem tenho história que se ilustre com feito tão extraordinário?

— Era para o amigo ufanar-se que desejava observar a presença do campo energético espiritual? Ou, coisa pior, era para obter a certeza da vida após a morte tal como descrita nos códices espíritas? Não precisa inventar ardilosamente nenhuma desculpa, como a de que as minhas perguntas são cediças, uma vez que, na qualidade de protetor seu, tenho por obrigação conhecer suas verdadeiras intenções.

Edmundo não esperava ser acuado de forma tão categórica. Realmente se atrapalhou e buscava explicar a colocação tão bem rechaçada pelos tremendos argumentos do Augusto, quando este prosseguiu:

— Suas atividades mediúnicas não nos deixam dúvida quanto à sua poderosa crença na teoria doutrinária, como ainda nos informam que os fenômenos psíquicos a que dá vazão, como os que acompanha nas sessões no centro, lhe parecem sinceros e naturais. Isto nos dá a certeza de que você se sente diminuído perante os colegas videntes, invejoso mesmo, muito embora venha lutando para desfazer essa pequena nódoa moral, através do sacrifício de várias noites e dos finais de semana.

Eram tão penetrantes as observações do mentor que passou pela mente de Edmundo que o melhor para ele era manter-se calado, alertando-se a tempo de que tais pensamentos ou intuições bem poderiam estar sendo inspirados pelo espírito ali presente. Com certeza, caso assim não fosse, o preceptor estaria lendo em sua alma todas as sutis emanações das mais íntimas ações mentais.

Desejou, então, obter uma resposta direta, pensando objetivamente na questão que intuíra:

“Prezado mentor, faça-me entender que a nossa conversa pode ser de mente a mente, deixando de externar os seus raciocínios por via oral.”

De imediato, sentiu as vibrações do interlocutor, como se fosse o próprio cérebro a desenvolver idéias, sem se haver detido nelas:

“Para mim é o mesmo. Aliás, poderia dizer que para você também, já que estamos falando através dos fluidos da espiritualidade, como se você estivesse tão desencarnado quanto eu.”

Edmundo fez questão de apalpar-se para sentir as impressões de seu corpo material: temeu que houvesse morrido. Tendo sido capaz de perceber pelo tato que estava dentro de seu aparato físico, buscou o clássico indício da luminosidade sobrenatural que indicaria que seu espírito, estando preso ao corpo, mantinha-se apartado dele.

Augusto imprimiu à feição certo trejeito de descontentamento e pronunciou audivelmente as palavras:

— Não encare a minha presença como o anúncio de sua morte. Naquela hora, muito provavelmente, haverá uma transição bem mais contundente do que estas ondas intelectuais que estou emitindo. Você sentirá medo, ao menos quanto ao destino imediato de sua alma, caso supere as emoções inerentes a todo homem que abandona as vestes carnais. Quanto a eu responder-lhe às perguntas da hora, vai acabar ficando deveras aborrecido, já que você está deixando-se tomar pela curiosidade, quando todos os conhecimentos desta espécie já lhe foram ministrados durante a vida junto aos companheiros espíritas. Exponha a sua preocupação mais profunda, fazendo-o com as expressões que lhe traduzirão lingüisticamente as idéias. Transforme a sua intuição em reflexão.

— Prezado protetor, diga-me se você tem recebido reprimendas de seu anjo guardião. Em caso positivo, dê um exemplo, ao menos. Pergunto isso porque, dentro das teses doutrinárias, se encontra a orientação geral de que não são espíritos perfeitos, que muitos chamam de espíritos de luz, que comparecem junto aos encarnados para as tarefas socorristas.

— Preclaro pupilo, agora você está tomando rumo bem mais inteligente e proveitoso. Está claro para você que não sou o modelo a ser seguido?

— Não, não está claro, uma vez que não tenho suficiente discernimento para reconhecer qualquer deslize de sua parte. Falei o que disse por me ver coagido a transformar o sentimento em ação intelectual.

— Antes de atendê-lo, esclareça-me mais um ponto: esta forma de exprimir seus pensamentos é aquela de que você lança mão habitualmente?

Edmundo não respondeu de pronto. Refez as frases conforme sua memória desenrolava todas as lembranças desde que começaram a conversar, admirando-se de que tudo estava bem nítido. Pensou, num átimo de segundo, que a causa dessa forma mais elaborada poderia repousar em experiências de vidas passadas, imaginou que seu magnetismo se expandia com força suficiente para que o amigo lhe decifrasse os pensamentos e retorquiu laconicamente:

— Não.

— Então, vou pô-lo a par das falhas de meu caráter e de minha formação espiritual. Acrescentarei três exemplos sugestivos. Entretanto, devo avisá-lo de que você, primeiro, não irá compreender nada do que lhe disser e, segundo, irá esquecer tudo tão logo eu termine de falar.

Edmundo segurou o impulso de dizer que, dessa forma, seria melhor que nada contasse e se pôs muito atento.

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