Em épocas de crise é que se conhece melhor quem está ao
nosso lado ou sabe-se qual é a verdadeira identidade de um povo. Pensando na
crise dos caminhoneiros e suas consequências não tem como não prestar atenção
neste detalhe.
Nos últimos dias cresceu como nunca o clamor por uma
intervenção militar, mais uma vez manifestando a necessidade do povo por heróis
que possam tomar as atitudes que eles mesmos não poderiam. Independente do fato
de eu também acreditar que é necessária uma atitude extrema para mudar
finalmente o quadro em que se encontra o País, seja no conceito que for, acho
interessante voltar a atenção para esse clamor todo por mudança e parar para
refletir que, se não houver mudança interior, não haverá mudança alguma.
Como lutar para que um comerciante, que aumenta
drasticamente seus preços num período de crise e se aproveita do momento para
lucrar, pague menos impostos e possa, com isso, usufruir melhor de seus lucros,
bem como gerar mais empregos e pagar melhor seus funcionários? E como brigar
por estes trabalhadores, uma vez que eles se submeterão a estas condições,
preferindo submeter-se a leis trabalhistas como as nossas, que os subornam com
uma numerosa quantidade de direitos e os afogam em impostos e baixos
salários? Pode quem não se dispõe sequer
a respeitar limites de velocidade, estaciona em vaga para idosos e deficientes
e dirige como um psicopata reclamar das leis de trânsito? Ou da sujeira das
ruas quando não consegue sequer colocar seu lixo para fora no horário certo,
preocupado somente com sua própria casa e nada com o espaço público? E quanto
às inúmeras formas de se levar vantagem, sejam estas em pequena, média ou larga
escala, mostrando que o mesmo povo que tanto condena seus políticos está
disposto a tudo para beneficiar a si?
Sempre me pergunto por que não podemos ter um sistema de
governo onde a imprensa seja livre, sem depender da intervenção de qualquer
parlamento e sim da audiência ou ausência dela para que uma emissora de TV
continue existindo ou seja tirada do ar, bem como suas atrações; onde coisas
como aborto, embora não fossem necessariamente estimuladas, não fossem proibidas
e dependessem mais do planejamento familiar de cada um do que de uma proibição
legal; onde aquisição e porte de armas não fosse decisão do Estado e que este
direito só pudesse ser passível de uma intromissão estatal a partir do momento
em que este direito fosse usado para conspirar contra a liberdade de terceiros;
que o mercado fosse aberto a empresas brasileiras e estrangeiras e onde os
impostos não fossem como o ar que respiramos, de forma que a competição fosse
estimulada e os preços fossem menores. Mas quando vejo atitudes, seja de quem
detém o poder como de quem é submisso a ele, pareço obter uma resposta e
finalmente saber por que as coisas são como são.
Ao que eu vejo, o povo brasileiro não luta pelo fim da
corrupção não apenas porque sabe que, no final das contas, faria igual ou até
pior que os corruptos que elege caso chegasse ao poder, mas também pelo fato de
que é melhor ter a situação como está e poder cobrar políticos paternalistas e
tirânicos pela situação do País do que tomar para si mesmo a responsabilidade e
as rédeas sobre suas próprias vidas.