É vendo os movimentos
que memória tempo mede.
Se você, por uns momentos,
pra sozinho ficar pede,
na vazia sala branca,
sem portas e sem janelas,
sem mobília, e sem tranca,
sem relógio, e sem velas,
pouco fica pra você
notar o tempo passar:
no corpo, um balancê,
tudo querendo marcar;
volta da sede, da fome,
o sangue a circular,
o batimento que some,
a mente quer detectar.
Isso porque a memória
depende dos movimentos
de tudo que faz história,
até mesmo sentimentos.
Não fossem os objetos,
pessoas, os animais,
os verdes eventos completos
e os cíclicos astrais,
restaria à memória
atrofiar-se, cessar,
de maneira compulsória,
sua função de lembrar:
do tempo anterior,
das fases que ocorreram,
dos que tinham mais rigor,
que viveram e morreram.
De retrabalho não gosta,
ela é bem japonesa:
aprendeu, então, encosta!
Aí vem outra proeza.
A mente automatiza
eventos repetitivos;
novos ela prioriza,
e nos torna bem mais vivos.
São muitos os repetidos,
e loucos nós ficaríamos,
se não fossem "esquecidos";
como os processaríamos?
Pra entender o que rola,
recursos são colocados
pra se fazer uma cola;
dados são armazenados.
A mesma experiência
que se bisa, vai pro saco
da tarimbada vivência,
inda que seja dum fraco.
É assim que se explica
o tempo acelerado
para quem mais velho fica,
prum Natal mal esperado.
Passa tudo tão depressa,
que o velho nem percebe;
quando a semana cessa,
outra ele preconcebe.
Troca marchas sem notar,
os semáforos e placas
que devem lh"orientar,
parecem-lhe mais malacas.
Quando não contabiliza
como tempo tais minúcias,
o velho se horroriza
por não usar as argúcias.
E o que não se observa,
por já ser fava contada,
na memória se conserva,
mas de forma "apagada".
Mais aumenta a velhice,
mais enfadonhos os lances,
constata-se bisonhice,
mudam somente nuances.
Diminuem as vivências
que nos fazem refletir,
que dispensam conivências,
que prolongam o sentir.
A pergunta mais sacana
é "Qual é a novidade?";
não passou nem a semana,
já a querem na cidade...
Não faz tempo, foi passagem
dum milênio cansativo,
e você faz boicotagem
dum outro pra ficar vivo?
Em suma, é a rotina
que o tempo "acelera";
quem com ela se afina,
outra vida não tolera.
Você vive tão vidrado
em fazer o repeteco,
que fica condicionado,
sua vida é filmeco.
Há remédio para isso,
basta saber apontar
cada seta prum permisso,
e seguir seu alvejar...
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