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Artigos-->Pergunta inteligente (http://pesp.hpg.com.br/Clever.html) -- 13/07/2002 - 12:03 (Penfield Espinosa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
1 Introdução



Não é incomum que atores ou cantores reclamem, em entrevistas coletivas, da qualidade das perguntas que jornalistas fazem a eles.



Antes se reclamava do fato das perguntas serem indiscretas. Hoje, atores e cantores mal humorados reclamam abertamente da inteligência das perguntas. Ao ponto de que, muito recentemente, um sequestrador confesso ter exclamado, em entrevista coletiva, para seus entrevistadores:



- Até que enfim uma pergunta inteligente!



Essa exclamação, feita por um meliante, possivelmente perigoso, é por si só muito importante, e suscita várias questões. Aqui se vai comentar apenas sobre o que tem levado tantos a reclamar da inteligência de jornalistas e repórteres.



2 Jornalistas eram intelectuais



Já houve épocas nas quais os jornalistas eram considerados intelectuais críticos e bem informados. E muito inteligentes. Os mais idosos talvez se lembrem: no Brasil foi durante a ditadura militar.



Naqueles tempos, os jornalistas eram muito considerados, e eram o centro de qualquer reunião informal. Como depois foram os psicólogos e, até há muito pouco tempo, os economistas.



O que houve para que em relativamente pouco tempo (menos de 20 anos), todos eles passassem a ser considerados pouco inteligentes?



Não se pode falar em decadência de gerações: essas não mudaram tanto assim. Além disso, há quem diga que, na média, o QI das novas gerações têm aumentado.



Mesmo que o QI das novas gerações de repórteres tivesse realmente caído, os editores e chefes de redações são de gerações mais antigas e, tendo notado essa queda de qualidade, saberiam compensá-la. Talvez contratando mais jornalistas antigos, talvez acompanhando mais de perto o trabalho dos mais jovens, talvez dando novo treinamento a eles.



Muito pouco disso tem sido feito, mas mesmo assim vemos jornalistas mais experientes tendo comportamentos que a visão estereotipada manda atribuir aos mais jovens e inexperientes.



3 Não há notícias no mundo



Nossa análise do porque do suposto emburrecimento dos jornalistas começa por uma provocação do saudoso poeta Paulo Leminski, que se considerava mestiço de negro e polonês. Ele disse, em crônica para um jornal diário, que não existiam, no mundo, notícias suficientes para editar um jornal diário. Coincidentemente ou não, Leminski deixou de publicar crônicas nesse jornal.



A partir dessa frase, é fácil ver que, de fato, as notícias de um jornal diário são esticadas, espichadas para poder preencher todo o espaço impresso.



Na verdade, faz já algum tempo que o jornalismo tem abandonado seu estilo antigo, cheio de opiniões - algumas vezes suspeitas ou infundadas - e com algum tom investigativo e inquiridor. Os jornais tem-se esforçado por ser máquinas de gerar notícias, com pouca ou nenhuma análise.



Neste sentido, a frase de Paulo Leminski deve ser lida como: apesar de existirem notícias suficientes para fazer um jornal, elas têm sido abordadas de modo totalmente insuficiente, superficial.



4 Equívocos da superficialidade



Esse superficialismo, essa fúria por gerar notícias gera grandes equívocos. Nunca se deve esquecer do episódio Escola da Base, no qual professores e diretores de uma escola infantil foram acusados de forçar crianças a práticas de pornografia. Pornografia infantil sim, da pior espécie, diziam os jornais. E não faltaram idiots savants que ``obtiveram detalhes de tais práticas dados pelas próprias crianças.



Lembrar do também do caso de Alceni Guerra, ex-ministro da Saúde. Este era, provavelmente, um dos ministros menos corruptos de todo corrupto governo Collor. Ora, em algum momento a tal imprensa falada, escrita e televisada passou a criticá-lo como um administrador óbvia, exagerada e excessivamente corrupto.



Depois de feita a sujeira, a imprensa fez certo desmentido, com destaque bem menor do que o da acusação. Felizmente para Alceni Guerra, o padrão exigido para políticos é relativamente baixo e ele pode se reabilitar, sendo hoje considerado um bom quadro do PFL paranaense. Pena para os educadores e administradores da Escola da Base que, não tendo o jogo de cintura dos políticos, não puderam se recuperar nem das perdas financeiras e profissionais, nem dos traumas causados por essas experiências duras de difamação.



Vivemos em tempos de massa e de rebanho e a imprensa é parte e causa disso.



5 Vantagens da notícia superficial



É muito útil para os donos de jornal essa correria pela notícia, pois:



1.transforma o jornal em algo objetivo, com aparência de impessoalidade. As notícias podem então ser filtradas como de hábito o foram, mas agora mantendo uma aparência de objetividade;



2.minimiza o ruído da polêmica, da discussão e também da repetição.



Por mais que o finado Paulo Francis (PF) se equivocasse por tratar temas complexos de filosofia e política de modo simplficado, seus erros fizeram que toda uma geração pensasse mais sobre o mundo, sem tomá-lo como um dado.



Certamente há e houve filósofos gabaritados a falar com muito mais correção sobre os assuntos que o velho e bom PF. Alguns deles chegaram a dizer isso textualmente. Contudo, seu discurso é impenetrável. Mesmo quando conseguem reduzir a complexidade das questões e apresentá-las para a patuléia ignorante de forma clara, seu impacto é muito pequeno, não atinge a vida das pessoas e não as faz pensar;



3.o ``compromisso com a notícia , apenas a notícia, faz com que o mundo seja mostrado como uma realidade opaca e inalterável.



Pode ser que haja, em algum canto do jornal, algum especialista que faça uma análise, mas seu jargão talvez evite a compreensão do leigo.



E é o leigo, a massa, a patuléia que cria a importância das informações - não um pequeno grupo de especialistas. Lembrar de pensadores como Carlo Ginzburg, que mostraram que existe um fluxo entre ``alta cultura e ``baixa cultura. Nos dois sentidos.



Um dos lados talvez forneça inovações e variações, mas o outro lado dá a vida aos pontos discutidos;



4.o compromisso com ``a informação, não a formação , assumido publicamente por um proprietário de jornal, termina de matar o projeto de uma imprensa que pensa para uma imprensa que entrega notícias como pãezinhos, sabonetes ou cervejas, para lembrar de conhecida governadora...



Neste ponto, como é possivel que uma imprensa escrita, que se dizendo muito crítica, é capaz de criticar outros fabricantes de notícias como pãezinhos, sabonetes ou cervejas, como a notória televisão;



5.outro ponto interessante das notícias parecerem espontâneas e irrefletidas é que é muito facil ``plantar notícias ; isto é: fazer publicar notícias vão agredir a algum inimigo ou criar uma expectativa.



Ou seja: uma imprensa assim ingênua e irrefletida pode ser manipulada à vontade pelos que têm acesso a ela. Isto inclui os donos dos jornais e outros poderosos. Assim, a imprensa pode agradar ao partido A dizendo uma notícia contra o partido B. Depois, como é irrefletida e espontânea, não tem o menor problema em agradar ao partido B dando uma notícia contra o partido A.



Assim, todos ficam contentes;



6.a massificação da notícia e dos leitores permite que a imprensa lance muralhas de informação, para gerar o pensamento único.



Como a muralha do neoliberalismo, criada -- não por coincidência --, depois da queda do Muro de Berlim e que tentava impedir a todos de pensar fora do esquadro do neoliberalismo. O Estado é ruim, o mercado é bom, diziam os jornalistas. E um dos que notaram isso foi o mesmo Caetano Veloso, que a imprensa já carimbou como pouco crítico e alienado.



6 Conclusão



Enfim, o enburrecimento dos jornalistas ocorre porque pensar é hoje um atributo que não é permitido em sua profissão. Vivemos em um mundo de ondas, martelos e muralhas. Ondas crescentes de informação, que não há tempo de analisar ou criticar. Conceitos como o neoliberalismo, repetidos à exaustão, martelando nossas cabeças. Muralhas que bloqueiam, impedem, proíbem nossa reflexão.



Por exemplo, o socialismo já chegou a ser discutido seriamente em muitos debates. Hoje, como no Admirável Mundo Novo -- que graças a Deus não chegou ;-) -- é impossível, proibido pensar a sério no socialismo. Quem defender ou discutir essa idéia -- absurda, estapafúrdia, dirão eles -- recebe o nome de dinossauro e é expulso da grande imprensa escrita, falada e televisada. Passa a ser exilado do grande público, para os pequenos meios de comunicação, que atingem apenas minorias.



Assim, os jornalistas não emburreceram. O que houve é que os jornalista atuais não têm espaço para pensar. Tanto porque a quantidade de informações que eles lidam é muito maior do que a de antes, como porque o bloqueio ideológico ao pensamento atingiu níveis muito maiores do que antes.

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