Retratos
maria da graça almeida
Eu ainda era menina,
menina, ela era também.
Eu, pequena e franzina,
ela, robusta e bem!
Lentamente, eu me alongava,
ela alongava-se além.
Nem de perto eu a alcançava,
feito ela, assim, ninguém.
Foi, então, num certo dia,
quando o sol já renascia,
pela fresta da janela,
novidades soube dela.
Meiga, gentil e segura,
já senhora, mãe madura,
acenou-me com os frutos,
graciosamente, sem custo.
A copa cedeu às pombas,
a mim deu sabor e sombra.
Demonstrou que me amava
com as provas que me dava.
E o tempo vil, insano,
com um gesto desumano,
impingindo-lhe a má sorte,
seduziu-a com a morte.
Esvaída, definhou,
inanimada, secou.
Viu-se em breve condenada,
sem ao menos ser culpada.
Arremessada, à terra,
faleceu, sem opção,
retalhada pela serra
de estridente intenção.
Deixou enorme um vazio
em meu peito arredio,
que se banhara de dor,
num ataúde sem flor.
Dela, pequenos pedaços
inda trago dolorida,
são os antigos retratos
de uma mangueira sem vida.
maria da graça almeida
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