Pelo menos uma vez por dia ouvimos alguém dizer (e nós já dissemos também): "- Hoje é o dia mais feliz de minha vida!". E os motivos desta frase são diversos (milhares), tais como:
1) Conseguir o primeiro emprego.
2) Dia do casamento.
3) Dia da homologação do divórcio.
4) Dia em que saímos do hospital após cirurgia complicada.
5) Dia da formatura da única filha.
6) Quitação da casa própria.
7) Ao conquistar um título esportivo.
8) Salvar a vida do gato de estimação.
Podemos observar que a variedade é imensa e que na maioria dos casos, o que é motivo de alegria para uns pode até ser fútil para outros (sem chegar a ser triste). Também podemos perceber que de tempos em tempos até substituímos um "dia mais feliz" por outro mais recente, que sobrepuja o que já não está tão nítido em nossa traiçoeira memória.
Eventualmente nos iludimos e determinamos sem melhor avaliação que alguém adquiriu seu "dia mais feliz" no momento em que um tio rico distante faleceu e tem enorme patrimônio a ser dividido. Apenas não ficamos cientes de que existem outros 5 ou 8 parentes deste "alguém" que também estão de olho na fortuna e que acreditam que merecem uma fatia maior do bolo. A partir deste instante, a vida (outrora pacata) deste "alguém" torna-se uma sucessão incômoda de incidentes que tendem a leva-lo ao stress que consumirá a sua parte da fortuna em tratamento e remédios.
O assunto merece um longo tratado a ser discutido em diversos seminários. Mas este resumo já nos dá uma idéia da subjetividade e da simplicidade da matéria. Os conjuntos de necessidades atreladas a cada indivíduo fazem nascer o embrião do tal "dia mais feliz" de cada pessoa. Quem viveu 20 anos numa comunidade sem água corrente, sem esgoto canalizado, apertado num cômodo cheio de goteiras e de baratas, sente-se premiado ao mudar-se para um kitnete perto da praia de Copacabana. Até que três anos depois começa a sentir-se sufocado pelo caos local (barulho, trânsito, filas) e passa a sonhar com outra acomodação (quando não chega ao absurdo de lamentar de ter saído da antiga moradia). Que cada um escolha seu "dia mais feliz" sem se preocupar com as regras hipócritas e obscuras da sociedade carente. Até o mendigo terá o seu quando um morador do bairro lhe oferecer um saco com roupas velhas, cobertores e alimentos para uma semana.
Um jovem que passou a vida sendo orientado pelos familiares no sentido de evitar as práticas que podem prejudicar sua saúde e sua imagem, numa primeira avaliação causada pela sua inocência e dinamismo próprios da idade, imagina que seus movimentos estão sendo tolhidos em excesso pelos mais idosos quando estes sugerem locais e horários adequados para alguns eventos. Quando atinge a maioridade e adquire meios de sobreviver por sua conta, numa incontida explosão de entusiasmo, imagina que chegou seu "dia mais feliz" e que a partir de agora poderá fazer tudo o que lhe der na mente sem ter que ficar ouvindo conselhos arcaicos dos "quadrados".
Somente um tolo terá esta atitude , não percebendo que teve diversos "dias felizes" enquanto desfrutou da proteção e da orientação de seus melhores amigos que muitas vezes tiveram de aprender a reconhecer seu "dia mais feliz" através de centenas de topadas que deram nas dolorosas armadilhas montadas pelo destino nas esquinas da vida.
Haroldo P. Barboza – Matemático, Analista de computador e Poeta – Julho / 2002
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