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Artigos-->O golpe do FMI - Carta Maior -- 19/08/2002 - 21:32 (rodrigo guedes coelho) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A verdade sobre o acordo com o FMI

Nas primeiras manchetes venceu a mentira: o acordo com o FMI recebeu o

tratamento triunfalista: “Mercado comemora o acordo” foi a manchete do

“Estadão”. Os outros jornais seguiram o mesmo tom, algo como “Brasil

conseguiu o melhor acordo de toda a história com o FMI.



Mas os dólares continuaram fugindo e neste final de semana “Veja”

registrou perplexa: “Analistas quebravam a cabeça para entender por que o

anúncio do empréstimo de 30 bilhões de dólares do Fundo Monetário

Internacional (FMI) não teve o esperado e imediato efeito apaziguador sobre os

mercados.”



Muito simples: não teve porque a idéia era bem outra. Este acordo foi

uma das maiores tramóias da história econômica do Brasil: assumimos

dessa vez mais US$ 30 bilhões de dívidas, só para dar tempo aos bancos

estrangeiros tirarem seu dinheiro do Brasil. Só agora o verdadeiro

significado desse acordo está aparecendo nos jornais.



Bancos deram o golpe com a ajuda de O´Neill

Tudo aconteceu na noite da terça-feira, dia 6 de agosto, quando o

secretário do Tesouro norte-americano, Paul O´Neill, e seu adjunto, John

Taylor, reuniram-se em São Paulo com os pesos pesados da banca

internacional. O´Neill havia dito dias antes que não se deveria emprestar dinheiro

do contribuinte americano ao Brasil porque “ia tudo parar na Suíça”.

Sua declaração jogou lenha na fogueira estimulando ainda mais a saída de

dólares do Brasil.



Pois bem, esse O´Neill, na reunião fechada com os banqueiros, concordou

não apenas em emprestar mais dinheiro ao Brasil, mas em emprestar mais

do que Malan vinha pedindo: US$ 30 bilhões, e não apenas US$ 20

bilhões. Por que tanta generosidade?



A notícia fora de foco

O encontro só foi noticiado dois dias depois , mesmo assim por poucos

jornais e de modo fragmentado e incorreto. Na quinta feira, dia 8, a

“Gazeta Mercantil” dizia a partir de “relatos de quem esteve com O´Neill e

Taylor”, que “o encaixe natural das peças do jogo deve resultar numa

volta natural das linhas de crédito internacional ao Brasil.”



Tudo cascata. O objetivo do novo empréstimo foi exatamente o oposto: o

de permitir aos bancos irem tirando seu rico dinheirinho, pois faziam o

prognóstico pessimista de que o Brasil iria quebrar mais cedo ou mais

tarde, e teria de haver uma renegociação da dívida externa. E o que é

pior, essa renegociação poderia ter do outro lado da mesa gente com

Mantega ou Mercadante, e não os amigos Malan e Fraga. Por isso, o anúncio

dos novos recursos do FMI não deteve a fuga de dólares e os bancos não

reabriram suas linhas de crédito.



A informação nas entrelinhas

No domingo, dia 11, surgiram alguns relatos divergentes do triunfalismo

oficial, mas ainda nas entrelinhas. Numa entrevista à “Folha”, Kenneth

Mawwell, economista inglês de renome, dizia que o Brasil caminhava

quase certamente para uma crise de pagamentos do tipo que exigiria uma

reestruturação geral. E que o acordo com o FMI só adiou esse dia. Maxwell

responsabilizou FHC pela crise e comparou-o a Alfonsin. O convite de FHC

aos candidatos confirma essa percepção: o medo de um final a la

Alfonsin é o motivo principal do convite – nisso concorda a mídia deste início

de semana.



Nova revelação sobre o boicote ao Brasil

Na quinta, dia 15, “Valor” trouxe declarações do representante do banco

inglês Standard Chartered, Lauro Vallejo, de que foi o próprio Banco

Central da Inglaterra que recomendou aos bancos ingleses reduzirem suas

linhas de crédito no Brasil. O vice-presidente do Bank of Boston, Alex

Zornig, praticamente confirmou essa informação, recomendando o governo a

contatar os bancos centrais dos países desenvolvidos e o BIS, para

pedir que relaxem as exigências nas operações com o Brasil. Neste domingo,

o “Estadão” trouxe esta frase de O´Neill, já posterior ao anúncio do

acordo: “Não considero que seja uma boa idéia que os governos peçam às

empresas para fazer algo que não esteja dentro de seus interesses

econômicos.”



Moratória, a palavra proibida

Neste final de semana, foi proferida abertamente a palavra proibida,

mas pela imprensa internacional. Com exceção de “Valor”, que mesmo assim

foi relativamente discreto, a nossa mídia escondeu o assunto em espaços

menores. A “Folha” nem deu. O “Estadão” deu num pé de página. O fato é

que o “Financial Times” e “The Economist”, dois veículos que dão o tom

à mídia em questões de economia internacional., anunciaram que o Brasil

muito provavelmente vai quebrar. Isso explicaria a determinação dos

bancos de retirarem seu dinheiro do Brasil e a ordem dos bancos centrais

para que reduzam sua exposição. O “Financial Times” disse que para o

Brasil “O jogo acabou”. “The Economist” falou na probabilidade de uma

moratória e até deu a receita de quanto o Brasil economizaria com uma

renegociação da dívida a juros mais baixos.



O mesmo golpe dos tempos coloniais

“Carta Capital” desta semana restabelece o verdadeiro sentido do

acordo: “Os reais beneficiários do programa de US$ 30 bilhões ficam em Nova

York e Washington”. A revista fez as contas do volume de empréstimos que

teriam que ser renovados, pelo menos US$ 32 bilhões este ano e US$ 24

bilhões no ano que vem, e diz: “O que o FMI oferece é para o Brasil

trocar dívidas com bancos privados por dívidas com o FMI.”



Este acordo com o FMI só é comparável ao do acordo da Coroa portuguesa

com o governo britânico. Dom João VI fugiu de Portugal acossado pelas

tropas de Napoleão. Em pagamento do apoio britânico na fuga, os

portugueses transferiram para sua colônia chamada Brasil a responsabilidade

pela dívida que tinham com os banqueiros ingleses. Salvou-se a Coroa

portuguesa e salvaram-se os bancos ingleses. Os brasileiros ficaram com a

dívida, como agora."















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