Curiosamente, aumenta nos últimos dias de campanha eleitoral a qualidade dos questionamentos a respeito do que
verdadeiramente importa saber sobre o futuro presidente do país. Lula irá conseguir controlar as demandas “sociais” do aparelho revolucionário do próprio partido, do MST, das entidades e das centrais sindicais que orbitam ao redor do PT? O
ex-metalúrgico, agora prestes a vestir o manto presidencial, conseguirá equilibrar-se na corda que divide a “normalidade” institucional e financeira da pressão estocada ao longo de 22 anos desde a fundação do partido por mudanças no regime econômico “burguês”?
Exceto pelos pouquíssimos articulistas que há muito tempo vêm alertando para a preocupante plausibilidade do caos a partir da vitória do PT, não se ouve outras vozes fazendo côro ao sombrio presságio deles, baseado por sinal em fatos
incontestáveis. De uns dias para cá, porém, parece que alguns acordaram para o verdadeiro debate. Longe de equilibrar o noticiário, ainda fartamente pró-Lula, dois exemplos merecem ser pensados.
O primeiro vem da colunista do jornal Valor Econômico, Eliana Cardoso. Em seu artigo de quarta-feira passada, ela diz claramente:
Enquanto a preocupação é ganhar as eleições, as tendências mais radicais ficam arquivadas. Mas voltarão à carga uma vez passada a eleição. O MST já discute como será a ação num governo do PT e quanto tempo Lula terá para resolver suas reivindicações "sem enfrentamento". Servidores também farão cobranças. Lula terá dificuldade para
controlar a avalanche de demandas sociais, as greves por melhores salários, as invasões de terras e as paralisações organizadas por funcionários públicos. Ocorreria então uma hemorragia de capitais que Lula tentaria estancar com o controle do câmbio provocando a ruptura de acordos anteriores. Neste caso, o risco de seguirmos os passos da Argentina é real.
O outro exemplo de análise pertinente sobre o futuro presidente do Brasil é do diretor de redação de O Globo, Merval Pereira, jornalista que vem surpreendendo pela lucidez de seus comentários embora seja o chefe de um jornal que muitas vezes parece ser feito por uma facção petista.
Vejam o que ele observa neste domingo, 29: “...o novo governo petista terá condições de controlar a máquina partidária e as demandas dos chamados movimentos sociais, a maior parte delas conflitante com as reformas estruturais da economia que se precisa fazer?..”
Enquanto Lula continua a obter o apoio do empresariado, chega a ser engraçada (para não dizer trágica) a declaração do presidente da CUT, João Felício, durante encontro entre sindicalistas, empresários e o PT num hotel em São Paulo ontem.
Segundo relata O Globo, o líder sindical disse que os sindicatos prometem não fazer greves numa clara “trégua aos capitalistas”. Talvez resida nesta pequena declaração a resposta para a pergunta levantada por Merval Pereira em seu artigo de hoje no mesmo jornal.