[No capítulo anterior: Madalena jazia morta sobre a cama. Alguns mostraram-se aliviados, outros mais contrariados que a metade deles. Ayra dormia enquanto a descoberta ocorria. Bruno sorria inexplicavelmente feliz. Klaus bocejava em meio a toda confusão. Contrera olhava atento e disperso para o além, como se lembrasse do ocorrido em detalhes. José Pedro Antunes encolhia-se em silêncio no seu canto. Denison admirava as pernas de louça da moça que passa e ele não pode pegar... Lucio Jr olhava atentamente para o corpo de Madalena. Milene Arder fazia cara de nojo, olhando o cadáver na cama. Dom Kless sorria desesperado e ressentido. Domingos ainda mencionava vontade em discutir com Kilandra. Sr. Waldomiro aparecia gritando com toda sua autoridade: _ Corta! O corpo de Madalena continuava estendido e inerte na cama...As coxas de louça da moça, quase descobertas pelo lençol.]
Ayra On desperto, todos começaram a passear pelo cenário. Pareciam cansados pelo exaustivo ensaio, e ansiavam pelo fim das filmagens. A novela Mesa Redonda de Usineiros parecia caminhar para o clímax.
O produtor Zocca passou pelo salão recolhendo os pedaços de papéis e bitucas de cigarro, espalhados pelo chão. Sr. Waldomiro se irritava com Domingos Oliveira Medeiros.
_ Sr. Waldomiro... Veja estas mudanças que eu andei fazendo no roteiro... Não adequado o modo como essa Madalena morreu... Receio que se ela fosse realmente estrangulada pelo sutiã, haveria sinais de luta, e eu não vejo nada fora de lugar no cenário.
_ Você leu o roteiro? _ retrucou Sr. Waldomiro.
_ Li sim _ disse Domingos. _ Pareceu-me um tanto quanto irreal... Como ninguém no bar escutou a morte da Madalena? Se eu estivesse sendo estrangulado iria lutar com todas minhas forças e fazer ao menos algum barulho que fosse...
_ Cadê o meu roteiro? _ continuou Sr. Waldomiro.
Os assistentes do diretor correram pelo cenário a procura do roteiro perdido. Acharam-no junto com os equipamentos de câmera. Saul Gonçalvez e Manezinho de Iço, vieram aos tropeços carregando as páginas surradas do roteiro do Sr. Waldomiro. Quando chegaram esbaforidos, perceberam que o S. Waldomiro dizia a figurinista Rose de Castro, que era preciso despir mais a personagem assassinada.
_ Ela não pode estar coberta dos pés a cabeça! Ela foi estrangulada por seu próprio sutiã! Precisa estar de roupas íntimas e peitos de fora. Não é?
Rose se inclinou sobre a cama para falar com Madalena, que ainda permanecia imóvel apesar do ensaio terminado. Madalena permanecia estática e esticada na cama, e parecia prender toda a respiração. Contrera que ficara quieto em seu canto, apenas fazendo figuração de luxo ironizou:
_ Ela está em transe. Levou a sério essa estória de Stanislavsky, e está não-vivendo sua cena... Achei ótimo, até me convenceu!
Madalena não sorriu como de costume. Não esboçou nenhuma reação. Permaneceu imóvel e estática. Nem mesmo respirava. As pessoas na sala permaneciam quietas e estáticas como Madalena, suas pálpebras tremiam de ansiedade. Aquele momento parecia durar eternamente e todos permanecia no transe de Madalena. Ninguém se mexia, nem mesmo pareciam estar vivos. Madalena não se mexia. Rose, que permanecia debruçada sobre a cama, cutucou seu rosto que pendeu como chumbo para o outro lado. Madalena ainda não se mexia. Rose levantou seus braços que caíram sobre o colchão sem pulsação. Rose se afastou subitamente como se percebesse o enigma, e lançou um olhar cheio de medo, e pavor na direção de Madalena estática e morta sobre a cama.
_ Ela está morta! _ disse Rose. _ Morta!
Ninguém acreditava, e alguns se precipitavam em segurar o corpo desfalecido de Madalena, que jazia sem vida sobre a cama. Madalena era morta. Estrangulada de verdade durante o ensaio. Felix Maier entrou empurrando todos e abrindo espaço pela multidão de incrédulos que permaneciam na cena do crime.
_ Ninguém toque em nada! Ninguém toque em nada! Isso é uma cena de um crime... Precisamos chamar a polícia... E para uma investigação de verdade, não devemos tocar em nada mais...
_ O que o senhor acha que está fazendo? _ perguntou o Sr. Waldomiro.
Felix explicou que era preciso uma acareação devida dos fatos, já que o verdadeiro assassino poderia ainda estar entre nós.
_ E quem garante que não foi você, o assassino? _ Bruno perguntou a Felix.
_ Exatamente _ respondeu Felix. _ Todos nós somos suspeitos, e por isso mesmo é que devemos chamar a polícia...
_ Negativo! _ interrompeu Sr. Waldomiro. _ Se todos somos suspeitos, não vejo razão nenhuma para chamarmos a polícia.
_ O que o Sr. Waldomiro sugere? _ interrompeu José Pedro Antunes._ Que façamos nossa própria investigação?
_ E porque não? _ retrucou o Sr. Waldomiro.
_ Isso mesmo... _ Felix Maier falou. _ Não podemos nos arriscar.
_ Quem mais se arriscou foi Madalena, não foi? _ ironizou Bruno.
_ Quem é que tem o poder de julgar aqui? _ José Pedro Antunes respondeu. _ Não podemos agir desse modo. Não temos autoridade!
_ Claro que temos! _ interrompeu Felix. _ E minha patente não serve não? O que acham que eu fazia antes de entrar pra reserva?
_ Você está dizendo que você vai realizar a investigação? _ falou ao fundo Ayra On. _ Então estamos fudidos...
_ Acorda Ayra, e fica quieto... _ disse baixinho Klaus, cutucando o cotovelo na barriga de Ayra On.
Felix começou a caminhar por todo o cenário, observando cada um dos que permaneciam ali:
_ Primeiro, precisamos reunir todos presentes aqui no cenário... Saul, e Manezinho, vocês vão procurar todo pessoal da equipe que está aqui hoje, e tragam eles pra cá... Zocca, alguém precisa buscar um copo de água pra Rose que perdeu a fala...
Rose de Castro, permanecia estática com os olhos esbugalhados aterrorizados com a cena. Ela nem chorava, tamanho o choque que levará. Rose permanecia em choque repetindo a única palavra que conseguia pronunciar, dizendo baixinho: _ Morreu, morreu!
_ Parece Dorival Caymmi em O mar. _ interrompeu de repente Bruno Freitas. _ Que diz: “Pobre Rosinha de Xica, que era bonita e agora parece que endoideceu, vive na beira da praia olhando pras ondas, andando, rondando, dizendo baixinho: Morreu, morreu... O mar, quando quebra na praia é bonito, ééé bonito...”.
Alguns riram, outros olharam com desaprovação para Bruno, que se encolheu num canto pela piada em péssima hora. Menos mal, pensou ele: perde-se os amigos, mas a piada nunca...
_ Engraçadinho, né? _ perguntou-lhe Felix. _ Então diga-me onde o senhor estava durante os ensaios?
_ Poxa! Ninguém gosta de humor negro e sofisticado? Mas a pergunta deveria ser... _ retrucou Bruno. _ Quando Madalena foi vista viva pela última vez? Não me lembro de vê-la caminhando depois que saiu da maquiagem e deitou-se na cama.
Ninguém parecia se lembrar do que realmente havia acontecido. Ninguém se recordada qual foi o último momento em que Madalena fora vista com vida. Todos se olharam surpresos, e imaginando-se assassinos em potencial. Zocca veio trazendo um copo de água pra Rose, enquanto Saul e Manezinho traziam uma legião de pessoas que ainda permaneciam no estúdio. Primeiro chegaram Lumonê e Sardemberg Guabyroba, que faziam os efeitos especiais para a seqüência seguinte. Depois chegaram Diógenes e Alcir, que cuidavam dos objetos do cenário, seguidos por Gezus, que ficara com os carros do lado de fora. Em seguida, veio Torre da Guia trazendo o café novo, o qual se encarregara de repor. Athos foi o último a se apresentar, pois estava terminando algumas ligações urgentes.
_ Pra POLÍCIA!? _ perguntaram em uníssono, todos os presentes.
Dos recém chegados, nenhum parecia muito surpreso com a morte de Madalena. Todos se olharam estupefatos, sem saber o que dizer. Pareciam achar que tudo não se passava de brincadeira, uma peça perpetrada por toda a equipe. Quando perceberam que a brincadeira jamais ocorria, entraram em choque, dizendo-se perplexos com o acontecido.
_ Como assim? Morreu... _ perguntou Torre da Guia derramando a garrafa de café.
_ Morreu, morreu... _ disse baixinho Rose.
Kilandra sentou-se ao lado de Rose e sacudiu-lhe o ombro. Rose derramou-se me prantos sobre o ombro de Kilandra. Todos continuavam perplexos, quando Felix começou sua acareação.
_ Todos aqui reunidos! Vamos precisar refazer todo o percurso de cada um de nós, durante toda essa noite. Cada um de nós deve ter seu álibi confirmado e todas as versões devem se encaixar, para descobrirmos quem matou Madalena. Qualquer um de nós pode ter cometido o assassinato. Portanto, peço a todos que procurem lembrar-se de todos detalhes que tiverem relação com essa noite. Nenhum de nós pode sair deste local até que todos os fatos estiverem esclarecidos!