- O que queres ouvir, o que queres saber, minha princesa?
- Mãe, de que côr são as estrelas?
- Ora, princesa... as estrelas não têm côr. As estrelas são simplesmente cintilantes.
- Mãe, a "tia" hoje lá na escola zangou-se comigo. Eu pintei um céu com estrelas apenas cintilantes como tu dizes. Então ela olhou-me brava e disse-me:
- "Menina burra, não sabes que as estrelas são vermelhas?" Eu chorei e disse-lhe que as minhas são simplemente cintilantes.
- Ela olhou-me brava novamente e mandou-me pintar as minhas estrelas de vermelho.
- Mãe, eu não gosto de pintar as minhas estrelas de vermelho.
Causa-me mal estar, uma sensação quase que de medo, pavor até.
- Princesa, tu pintas as tuas estrelas da côr que quiseres, sempre! Não precisa ser de vermelho.
- Mãe, a "tia" disse-me que se eu não pintasse as minhas estrelas de vermelho, eu ia ficar sozinha, sem ninguém, num canto da sala.
- Não princesa, não vais... tu nunca estarás sozinha... se queres as tuas estrelas cintilantes apenas, elas serão pra ti, apenas cintilantes, percebes?
- Presta bem atenção, minha princesa, tu sempre terás as tuas estrelas da côr que quiseres, é um direito teu, inabalável, indelével!
- Mãe, de que côr é a esperança?
- Princesa, a esperança é da côr que quisermos que ela seja...
- Mãe, a "tia" disse que a esperança agora é vermelha!
- Princesa, ouça-me com atenção: a esperança dela pode ser vermelha, mas a tua será sempre da côr que quiseres! Compreendes?
- Mãe, posso pintar a minha esperança de dourado, como um campo de girassol?
- Podes e deves!
- Mãe... quando eu crescer, quero ser poeta...
(Sorrisos ternos...)
- Porque queres ser poeta, princesa?
- Quero ser poeta, para "cometer sobre a Terra o empenho da Paz, dos Encontros, do Silêncio tácito ante a Felicidade. Quero ser poeta para ser simples e buscar essências nas mãos infantes, na fome dos loucos, na ânsia dos mendigos. Quero ser poeta, para não ser político!"
- Princesa??!! Que idéia... de onde tiraste isto?!
- Do teu livro, mãe... Do teu livro que tem um moço bonito de olhos azuis que se chama Luis de Aquino.
- Pois então que andas a ler os livros da tua mãe?...
- Não posso, mãe?!
- Podes princesa, sempre que quiseres...
- Mas eu não quero ser "um mau poeta"...
- Princesa?! Tu andas com idéias estranhas, assusta-me!
- Mãe, pode o céu ser vermelho?
- Não, Princesa... o céu costuma sempre ser azul...
- Mãe, aquele outro moço bonito de barba é um "mau poeta"?
- A que moço te referes, princesa?
- Ao Affonso Romano de Sant Anna... Ele disse:
"Se eu dissesse que o crepúsculo está coalhado de sangue diriam que isto é uma banalidade que só um mau poeta ousa escrever. E, no entanto, o crepúsculo está coalhado de sangue.
Não só o crepúsculo, também a alvorada. E quanto a isto não há muito que se possa fazer"
- E o céu está mesmo coalhado de sangue... ele é um mau poeta?
- Não Princesa, ele é um excelente poeta... o céu está mesmo coalhado de sangue e quanto a isto não podemos fazer nada...
- Mãe, o que é crepúsculo?
- Crepúsculo princesa, é aquela luz, fraquinha, tenra, de quando o sol já se foi...
- Quer dizer mãe, que o crespúsculo anuncia a noite escura?
- Sim princesa, mas também é aquela luz fraca que aos poucos vai tomando força antes da manhã brilhante de sol...
- Mãe, quanto tempo pode durar a noite?
- A noite princesa, pode durar 4 anos, ou apenas o momento exato de um abrir e fechar de olhos...
- Agora dorme, Princesa...
- Mãe, posso ouvir aquela música do... Barão... (Vermelho)?
- Podes Princesa, podes ouvir a música que quiseres...