Usina de Letras
Usina de Letras
28 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 


Artigos ( 63100 )
Cartas ( 21348)
Contos (13299)
Cordel (10354)
Crônicas (22576)
Discursos (3248)
Ensaios - (10634)
Erótico (13588)
Frases (51550)
Humor (20165)
Infantil (5580)
Infanto Juvenil (4926)
Letras de Música (5465)
Peça de Teatro (1387)
Poesias (141243)
Redação (3356)
Roteiro de Filme ou Novela (1065)
Teses / Monologos (2441)
Textos Jurídicos (1966)
Textos Religiosos/Sermões (6341)

 

LEGENDAS
( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )
( ! )- Texto com Comentários

 

Nossa Proposta
Nota Legal
Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Artigos-->MEU VIZINHO -- 13/12/2002 - 18:38 (BRUNO CALIL FONSECA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Meu vizinho

José Otavio Carlomagno



Eu tinha uns 20 anos quando conheci Plínio Marcos. Durante dois anos, tomamos o mesmo ônibus na Aclimação: ele descia na Praça da República e eu seguia até a faculdade no Pacaembu. Um dia, com uma vergonha do cão danado, saquei da pasta escolar o livro "Querô: Uma Reportagem Maldita", que ele acabara de lançar, e pedi-lhe um autógrafo. Dias depois, arrisquei um "oi, Plínio". Com sorriso largo e toda a mansidão do mundo, perguntou-me se já tinha lido o livro. Meneei a cabeça afirmativamente. A partir daí, sempre que o via, puxava conversa.



Anos mais tarde, num show dos Novos Baianos no Tuca (teatro da USP), reencontrei o autor. Sentado em um banquinho de madeira, no saguão do teatro, Plínio Marcos vendia e autografava seus livros, de edição própria - nenhuma editora quisera divulgar, pois era considerado um "escritor maldito", em face de sua linguagem coloquial e dos temas que utilizava, como a prostituição e a marginalidade. De repente, chegaram os seguranças do teatro dizendo que tinham ordens da reitoria para não permitir que vendesse seus livros "imorais", e acabou sendo expulso do teatro. Quem conhece a sua obra sabe que ela nada contém de imoral, pelo contrário: à medida em que expõe de forma pungente todos os vícios e perversões da sociedade, compreende-se que Plínio era, na verdade, um homem moralista. E, pelo pouco que o conheci, pude ainda perceber que era também muito religioso.



Em 1982, encontrei-o novamente autografando seus livros: "Inútil Canto e Inútil Pranto Pelos Anjos Caídos", "Barra do Catimbó" e "Prisioneiro de Uma Canção", na saída de um teatro, na Brigadeiro Luiz Antônio, cujo nome não me recordo: ele me reconheceu e sorriu. Contou-me que uma semana antes havia sido expulso da ECA (Escola de Comunicação e Arte da USP). Nessa época, ele morava no Edifício Copan, onde se exilara por vontade própria. Saía apenas para vender seus livros. Depois disso, fui morar em Ribeirão Preto e não mais o encontrei.



Em 1996, lançou seu penúltimo livro: "O Assassinato do Anão", editado pela Geração Editorial, de São Paulo (no volume vem a novela e o roteiro da peça homônima). Quando pensou que a censura o tivesse deixado em paz, viu mais essa peça proibida de ser encenada no Teatro Municipal de Santos, em 1997, por ordem do prefeito de sua cidade natal.



Já doente, semanas antes de morrer, foi entrevistado por um repórter da Globo. Sua voz trêmula, enrouquecida mais que de costume e hesitante denunciava a debilidade de sua saúde. Ao ser perguntado se conseguia viver da venda de seus livros, respondeu com a seguinte pergunta: "Como você quer que eu sobreviva vendendo livros num país em que 60% da população são de analfabetos?"



O cigano velho truqueiro morreu esquecido e pobre. Breve citação nos noticiários noturnos da TV. E só. Mas tantos outros foram esquecidos. Só para citar alguns casos mais recentes: os escritores João Antônio, Marcos Rey e o poeta Mário Quintana, que passou seus últimos 20 anos de vida morando em hotéis e vivendo de favores, e faleceu na mesma semana da morte de Ayrton Senna - quase ninguém ficou sabendo.



José Otavio Carlomagno
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui