Ninguém em sã consciência há de negar as facilidades trazidas pelo "boom" tecnológico nos últimos 10 anos, tanto no âmbito pessoal quanto no corporativo. Celulares, laptops, palms, sistemas de rede trouxeram-nos inúmeros avanços: transações comerciais que antes demoravam dias agora são efetuadas com um "click", comunicação mundialinstantânea já é uma realidade, acesso a informações e pesquisas diversas - mesmo internacional - é imediato.
Paradoxalmente, este "boom" de pragmatismo, instantaneidade e eficácia também está criando um está criando um campo talvez igualmente grande para a dispersão, a alienação e o desperdício de tempo pessoal e profissional.
Pesquisas de empresas norte-americanas mostram que parte considerável do "tempo de navegação" em Internet de funcionários é gasto em sites não-correlatos com trabalho.
Outros estudos mostram que a desnecessariamente grande comunicação via e-mail faz com que as pessoas sejam menos cuidadosas ao escrevê-los, causando retrabalho e diversos problemas de comunicação com o(s) destinatário(s) das mensagens.
Desnecessário descrever a preocupação de pais e cônjugues com a excessiva - e já tradicional - "entrega" de filhos e parceiros a seus micros pessoais por horas a fios.
A "solução", repetida em uníssono tanto por familiares quanto por corporações parece ser uma só: controle. Vigilância do número de horas passados na companhia do micro em casa; vigilância sobre o conteúdo de e-mails e sites visitados pelo funcionário por parte da empresa.
A suposta causa do problema geralmente inverte-se nos dois cenários: em casa, o vilão tende a ser o micro; no escritório, o funcionário. Entretanto, independentemente do enfoque tomado, estamos tentando tratar os sintomas, não a causa.
Já foi exaustivamente discutida a utilização do micro como meio de fuga e alienação do convívio familiar e social, mesmo dos momentos difíceis no trabalho.
Contudo, a atenção para a enormidade de tempo gasta no micro durante o expediente não pode ser baseada em simples fuga. Será que a insatisfação com o trabalho seria algo assim tão imensamente disseminado?
Talvez mais sábio seja transportar essa questão ao universo macro do contexto social atual. A atual priorização sócio-econômica do pragmatismo, velocidade e economia de tempo deixou, sem dúvida, as pessoas atônitas.
Claro, não se pode - nem deve - deter a história e os benefícios trazidos pela "corrida da eficiência" foram inúmeros, com avanços incontestáveis em todos os campos.
O que se pode, sim, é procurar se afastar do redemoinho e tentar enxergar os fatos com maior clareza.
Acredito termos idealizado esse "mundo da velocidade" e criado um mito em nossas mentes - o de que, se não funcionarmos no ritmo dos computadores, se não soubermos de tudo o que se passa, se não aprofundarmos conhecimentos todo o tempo, seremos "tragados" pela sociedade e "cuspidos" para fora do convívio social, por obsolescência.
Logo, começamos buscando a eficiência com propósitos - trabalhar melhor, evitar filas de supermercado comprando on-line, ganhar tempo deixando de ir ao banco... Mas temos dificuldade em estabelecer limites, e terminamos correndo atrás da eficiência e da ação por hábito, entrando num círculo vicioso. Tornamo-na não um meio, mas um estilo de vida.
Então surgem os mecanismos de defesa: navegamos sem rumo pela Internet no trabalho, escrevemos e-mails "inúteis", telefonamos e usamos "instant messengers" para divagarmos desnecessariamente dezenas de vezes por dia...são formas de não "implodirmos", de mantermos nossa humanidade, de abstrair, de brincar, de fazer por fazer.
Coisas simples e vitais a que nos negamos, pois dentro do mito que deixamos desenvolver em nossas cabeças, parecem "erradas" na era do pragmatismo absoluto. Não nos sentimos mais no direito de ficarmos largados num sofá, ou numa praia, ou jogando conversa fora num bar. Sentimos vergonha de hábitos perfeitamente humanos e saudáveis, essenciais, na verdade.
Depois, colocamos a culpa na tecnologia e no estilo de vida atual, pois é mais fácil que olharmos para nós mesmos e perceber que boa parte da responsabilidade é nossa. Ninguém nos obrigou a deixar de ir a uma livraria por prazer ou a jogar conversa fora. Foi uma escolha.
Dizemo-nos vítimas da "cyber-era" e sim, ela possui aspectos cruéis. Mas também nos trouxe muitos benefícios dos quais não queremos abrir mão. O melhor é tentarmos buscar um equilíbrio e voltar nossa análise ao interior onde, dizem, estão as verdadeiras respostas de que precisamos.