Especialistas afirmam que a proposta de reforma previdenciária, que deverá ser encaminhada amanhã ao Congresso, viabiliza a privatização do sistema público previdenciário e não resolve o déficit. A economista e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Eli Iola diz que o fim do direito à aposentadoria integral dos servidores traduz o principal objetivo da proposta do governo do PT, que, segundo ela, cedeu às pressões do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do mercado de seguro privado.
"É possível que o governo até retire a proposta de contribuição dos inativos, que é polêmica, para negociar a aprovação da quebra do direito à integralidade, o que instituiria a previdência complementar, abrindo potencial mercado para para o seguro privado", aponta Iola. Segundo a especialista, a diminuição da participação do Estado na seguridade social é uma das condições do memorando técnico do FMI, aceito pelo governo brasileiro.
"O Brasil é o único, entre os maiores sistemas públicos de previdência da América Latina, que ainda não havia cedido a esta pressão; Argentina, Chile e México acabaram com seus sistemas públicos, sob a tutela do Banco Mundial e do FMI", afirma Iola, que defende uma resistência organizada dos servidores públicos contra a proposta.
O presidente do Sindicato dos Fiscais e Agentes Fiscais de Tributos de Minas Gerais (Sindifisco-MG), Antônio de Pádua Silva, é enfático ao afirmar que a proposta do governo faz parte de um processo de sucateamento do sistema público previdenciário. "O governo viabilizou a educação privada sucateando a educação pública; viabilizou a saúde privada sucateando a pública e agora quer fazer o mesmo com a previdência pública", critica Antônio Silva.
Para o dirigente, ao estabelecer teto para o pagamento de benefícios dos servidores o governo coloca como alternativa a aposentadoria complementar e abre caminho para privatização da previdência pública. A proposta apresentada pelo ministro da Previdência, Ricardo Berzioni, prevê teto de R$ 2,4 mil e, para aqueles que ingressarem após a reforma, a criação de um fundo de pensão fechado sem fins lucrativos, além do teto."
Não entendemos como o PT encaminha propostas contra as quais sempre lutou no governo anterior. O que podemos ver é que o PT cedeu à pressão dos mercados, pela vulnerabilidade da economia", diz. Antônio Silva classificou ainda de "confisco de renda" a proposta do governo de taxar, em 11%, os servidores inativos que recebem aposentadorias acima de R$ 1.058,00. "É uma questão que só produz efeito financeiro no médio e longo prazos", frisa o presidente do Sindifisco.
Remendo - Especialista no assunto, o professor de Direito Previdenciário da PUC-MG e ouvidor-geral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Minas, Lásaro Cândido da Cunha, classifica a proposta de reforma previdenciária de remendo. "A contribuição dos inativos pode até equilibrar as contas em um tempo curto, mas não esgota a discussão sobre qual modelo de previdência o país vai adotar", pondera o advogado.
Cunha afirma que sem um diagnóstico profundo do perfil dos contribuintes a solução para o déficit da previdência é inviável. "Há ainda muita evasão, ilhas de privilégio que precisam ser banidas e um grande número de pessoas no mercado informal", aponta, ao defender a discussão de um sistema único de previdência, mais participativo e isonômico.