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Artigos-->Pensadores da Guerra no Mar -- 06/09/2003 - 00:10 (Carlos Frederico Pereira da Silva Gama) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Eugênio Diniz e Domício Proença Júnior afirmam ser algo notável inicialmente quanto à discussão da guerra no mar é o fato de que, ao longo dos tempos, não se verificou uma continuidade. Três grandes eras (Remo, Vela e Máquina), com características próprias compõe a história da utilização do mar com propósitos bélicos (na paz ou na guerra). A primeira delas (Era do Remo) apresentava naus com uma série de limitações – tanqueamento de água, autonomia, resistência estrutural das embarcações ao tempo, disponibilidade de pessoal para as tripulações, extrema dependência do porto base, armamentos indistinguíveis dos utilizados em terra – relativas à adoção do Remo como elemento motriz. Na Era do Remo vigorava uma virtual equivalência entre a guerra no mar e a guerra em terra. A Era seguinte, da Vela, trouxe uma série de modificações tecnolígicas que que tiveram por conseguência: maior autonomia e “poder de fogo” dos armamentos, menor dependência do porto base, maiores contingentes nas tripulações etc. A guerra no mar continuava, ainda, muito semelhante à guerra em terra – ainda que seu comando estivesse virtualmente isolado do comando da guerra em terra. Finalmente, na Era da Máquina, a guerra no mar atinge um grau de especialização tal que permite que ela se distinga (contanto permaneça em estreita coordenação com) a guerra em terra. Um sem número de inovações tecnológicas, combinadas das formas mais diversas possíveis, permitiu que tal passo fosse dado – não que muitos não desejassem manter a transitividade entre a guerra no mar e em terra, o que suscita...



De forma similar ao que ocorreu com o pensamento estratégico da guerra em terra, a análise da guerra no mar apresentou dois autores polares, fundadores do pensamento nesse campo. De um lado, Mahan, cujos propósitos e caráter de sua obra muito o aproximam de Jomini; do outro, Colbert, que realizou uma transposição da Teoria da Guerra de Clausewitz para o contexto da guerra no mar.



Mahan (um almirante, portanto imbuído dos valores tradicionais das marinhas nacionais do século XIX – comando autônomo em relação à guerra em terra etc.), assim como Jomini, construiu uma doutrina que visava sustentar determinada visão de mundo (esta última defendida fervorosamente pelo autor – o que lhe valeria a alcunha de “evangelista do poder marítimo”). Seu intuito era demonstrar, através da manipulação ativa de fatos históricos (o trabalho do historiador, para Mahan, equivaleria a reunir fatos “como se reunem tropas”, isto é, subordinando-os a uma “idéia central”), a importância perene na História do chamado “poder marítimo” – conjunto de atividades e recursos voltados para o uso do mar, derivado de elementos como a posição geográfica, a configuração física, a extensão territorial, o “caráter do povo” e o “caráter do governo” – que seria a fonte da riqueza e poder das nações. O “poder marítimo” seria decorrência do “controle do mar” – a completa destruição da esquadra inimiga. Daí a importância que Mahan atribui aos navios de guerra (em detrimentos das naus incumbidas de fazer o reconhecimento de naus inimigas, entre outras funções) e à concentração de forças (que seria sintetizada na máxima mahaniana: “nunca divida a esquadra”), à semelhança do que Jomini fizera com os comandantes de campo e com a “concentração de forças contra o inimigo no ponto decisivo”. Da mesma forma como Jomini fizera quanto à guerra em terra, Mahan mantém artificialmente (e de forma pouco ou nada científica) viva a idéia de que haveria leis imutáveis governando a guerra no mar (esta última apresentaria, assim, uma continuidade notável); de que inovações tecnológicas tinham pouca ou nenhuma importância diante desse fato – a não ser que se adequassem a tais leis imutáveis; e de que a guerra no mar seria um fim em si mesma.



Imbuído de preconceitos como o “fardo do Homem Branco”, doutrina justificadora do Imperialismo europeu, Mahan teve sua obra (especialmente o livro “The Influence of Sea Power upon History”) vinculada à política externa norte-americana de fins do século XIX – uma política expansionista que tinha na guerra no mar uma de suas ferramentas indispensáveis. A obra de Mahan, fortemente dogmática e pouco propensa ao diálogo com outras correntes, dessa forma, passa longe de qualquer pretensão científica. Mahan buscava essencialmente consolidar uma doutrina, e não criar uma Teoria da Guerra no Mar. Sua influência avassaladora permite afirmar que o propósito do autor foi realizado. Mesmo o surgimento de trabalhos infinitamente mais densos e cientificamente rigorosos, como o de Colbert, não impediu que as idéias de Mahan continuassem a habitar o inconsciente coletivo dos estudiosos da guerra no mar.



Colbert (um civil, estudioso da história da guerra no mar), ao contrário de Mahan, buscou compreender a essência mesma da guerra no mar, mediante a transposição da Teoria da Guerra de Clausewitz para esse contexto. Escrevendo num período no qual a obra de Clausewitz era alvo de interpretações errôneas, que a mesclavam com os conceitos ainda prestigiados de Jomini e lutando, ainda, contra o prestígio e influência irrestritos que a obra de Mahan havia logrado obter, Colbert viu-se obrigado a refutar pacientemente diversos pontos da análise mahaniana sobre a guerra no mar sem atacar explicitamente o trabalho desse último autor, ao mesmo tempo que transpunha com rigor e cuidado os postulados de Clausewitz para o ambiente da guerra no mar. A estrutura pela qual Colbert tratou as questões da guerra no mar de maneira rigorosa, propriamente científica, apropriada de Clausewitz, adequava-se perfeitamente à tarefa de refutar os aforismas de Mahan e, simultaneamente, explicitar o caráter complexo e a ligação intrínseca entre a guerra no mar e a guerra em terra, e a dependência de ambas em relação à esfera Política. Além das idéias de Mahan, Colbert também refutou as curiosas (senão bizarras) idéias da escola de pensamento naval francesa conhecida como “Jeune École” – demonstrando mais uma vez, dessa forma, o equívoco constituido pelo apego ou crença na em “soluções mágicas” para as questões da guerra (no mar ou em terra).



Da mesma forma como Clausewitz havia conferido rigor teórico aos conceitos de Jomini, Colbert reformula os conceitos de Mahan de forma a adequá-los às diretrizes do arcabouço teórico clausewitziano. Em livros como “Some Principles of Maritime Strategy”, conceitos mahanianos como “controle do mar” adquiriam novo significado (nesse caso, possibilidade de utilização do mar para os propósitos de cada um dos lados numa guerra – o que e sempre circunstancial e não necessariamente está vinculado à destruição da esquadra inimiga). A guerra no mar possui objetivos (limitados ou não) cuja obtenção será vinculada ao montante (limitado) de recursos destinado a esta pela esfera Política de uma sociedade. Quanto à concentração da força (compreendida não como uma simples reunião de todos os navios de guerra, mas como determinado arranjo que aloca esquadrões às diferentes tarefas que a esquadra tem de desempenhar) ela será importante em determinadas situações, mas não configura nenhuma garantia de vitória, nem é necessidade imperiosa (Colbert, através do exemplo da guerra marítima entre França e Grã-Bretanha pelo controle do Canadá, demonstra a fragilidade do dogma da “indivisibilidade da esquadra” cunhado por Mahan). Colbert, da mesma forma, recupera a importância dos navios incumbidos de funções como as de reconhecimento – são eles que, permitindo a um dos lados de uma guerra executar atividades de supervisão, controle, comunicação, patrulhamento, regulação e presença de navios de linha ou cruzadores (ou seja, o planejamento da ação tendo em vista diferentes usos do mar), possibilitam o “controle do mar”. Quanto à “batalha decisiva”, Colbert considerava que esta era útil na medida que contribuísse mais do que outras atividades para a consecução dos objetivos da guerra no mar – não sendo necessariamente o objetivo precípuo desta última, portanto. Ainda a destacar o fato de que o edifício colbertiano, conquanto esteja diretamente relacionado com a reformulação da Marinha inglesa efetuada a partir do início do século XX, não sendo portanto totalmente isento em seus propósitos, oferece-se capacidade explicativa muitas vezes superior à das análises de Mahan, cujo trabalho também estava vinculado às expectativas de seu país em relação à utilização do mar para os propósitos da Política.



Da mesma forma como as análises de Jomini e Clausewitz diferem em propósito, densidade, influência e relevância para a compreensão do fenômeno bélico em terra, as análises de Mahan e Colbert se colocam como pólos opostos – no caso da guerra no mar, com uma especificidade a mais, já que o debate ainda está em aberto. Conquanto a análise de Colbert seja inegavelmente melhor fundamentada e possua capacidade explicativa inúmeras vezes mais relevante do que a de Mahan, a influência avassaladora desse último mantem-se ainda solidamente estabelecida – talvez pelo fato de que a obra de Mahan remeta diretamente à uma certa “mitologia da guerra no mar”, passando uma idéia de continuidade que possui extrema significação para muitas pessoas envolvidas nesse campo da atividade humana, além de ser uma análise deveras mais acessível.

BIBLIOGRAFIA



PROENÇA JR, Domício; DINIZ, Eugenio; RAZA, Salvador G. Guia de Estudos de Estratégia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.

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