993300>Nos inauditos tempos da minha mais que forçada educação intelectual, para naturalmente preservar o estatuto snobista que distinguia os cidadãos ricos da plebe corrente, os meus educadores insistiam na eliminação do vocábulo "você". Logo que alguém caía na asneira de pronunciar o palavrãozinho, regra era dizer-se: "Você... É estrebaria".
O meu saudoso amigo e companheiro de turma Jorge, o "Pilas", que nunca mais vi desde que me tornei adulto assumido, costumava replicar entre dentes: "Este gajo - que era o professor Matos - pensa que eu sou algum burro... Filho da puta".
E assim, com o "Você... É estrebaria" em travão de espírito, perpassei dezenas de anos com o estigma nos miolos.
Cerca dos meus vinte anos, quando ouvia o meu dilecto Roberto Carlos a deslizar nos sucessivos "vocês" que tão bem me caíam no ouvido, presumia que o genial cantor estava errado e, como o meu amigo Jorge, pensava de imediato num asno.
Hoje, que me apraz e consola imenso ouvir pronunciar "você" em genuíno sotaque brasileiro, ainda me interrogo sobre a descriminação que certos "Matos, quejandos e quejandas" impõem à linguagem. É assim que ganham a vida e sobrevivem a descriminar tudo e todos...
E afinal... Você... É tão bonito!
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